Os milhões em cima da mesa das negociações do OE2025

O Governo tem 2,25 mil milhões para acomodar propostas da oposição. Mas PS e Chega já aprovaram medidas que vão consumir 33% desse bolo. Restam 1,5 mil milhões e é preciso fazer escolhas.

O Governo comprometeu-se com um um excedente orçamental nas contas públicas, que garante não querer abdicar. Na tentativa de equilíbrio entre a despesa e a receita, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, acenou na terça-feira com uma margem orçamental de cerca de 2.200 milhões de euros, a que ainda é preciso descontar as medidas aprovadas no Parlamento à revelia do Executivo. Em concreto a folga é de 2.252 milhões de euros, de acordo com o quadro de políticas invariantes, enviado ao Parlamento no final de agosto.

Mas afinal, que valores estão em causa entre as propostas do Executivo e do PS para o Orçamento do Estado para 2025 (OE2025)?

O próximo ano já conta com um aumento da despesa de cerca de 5,8 mil milhões, entre as medidas do Governo já anunciadas, as aprovadas na Assembleia da República (740 milhões de euros) e as chamadas medidas carry-over (4.599 milhões de euros).

Montenegro defendeu que “as oposições já decidiram, em 2024, o suficiente para consumir 800 milhões, cerca de 40%” da margem orçamental estimada pelo Governo. “Da nossa margem disponível, 40% está condicionada por eles”, vincou.

Em causa estão as alterações ao IRS, propostas por PS, PSD e BE, com um impacto de 450 milhões de euros, o alargamento da taxa reduzida do IVA da eletricidade (110 milhões de euros), da autoria socialista, e a isenção das portagens nas antigas SCUT (180 milhões de euros), também apresentado pelo maior partido da oposição. Tudo somado dá uma fatura de 740 milhões de euros, ou seja, o impacto na folga do Governo é de 33% e não de 40% ou 800 milhões de euros, como indicou o primeiro-ministro.

Dos 2.252 milhões de euros de folga, restam então cerca de 1,5 mil milhões de euros para novas medidas, uma margem que não permite acomodar propostas do Governo e do PS. É preciso fazer escolhas.

O chefe do Executivo argumenta que o PS exige, com as propostas apresentadas na sexta-feira, mais “970 milhões de euros de despesa para viabilizar o Orçamento, em cima dos outros 800 milhões de euros, o que significa que o PS quer utilizar cerca de 80% da margem que o Governo tem à sua disposição”.

Contas feitas ao detalhe com base no quadro de políticas invariantes do Executivo apontam para uma despesa global, entre medidas aprovadas pelo Parlamento (740 milhões), e as novas propostas do PS (970 milhões), de 1.710 milhões de euros, ou seja, 76% da margem disponível (2.252 milhões de euros).

Se o Governo fechar a porta ao PS na inclusão de novas medidas, 67% da margem orçamental ou 1,5 mil milhões de euros terão o cunho do Executivo da Aliança Democrática.

As contas das medidas do Governo…

Entre as propostas-estrela está o IRS Jovem, que representa a maior fatia de despesa. O Executivo estima que a redução para um terço das taxas de IRS atualmente em vigor, até um máximo de 15%, para os rendimentos de trabalho de pessoas até aos 35 anos, para quem tem rendimentos até ao 8.º escalão, represente um encargo anual líquido de mil milhões de euros.

No que toca à redução transversal do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC), a perda de receita anual estimada é de 500 milhões de euros, mas apenas terá impacto nas contas públicas em 2026. Ainda assim, no próximo ano poderá sentir-se ligeiramente por via dos pagamentos por conta.

Paralelamente, o Ministério das Finanças estima um impacto de 60 milhões de euros com a isenção de IMI e imposto de selo na compra da primeira casa para jovens até aos 35 anos e de 40 milhões de euros relativos ao aumento da consignação do IRS.

No quadro de políticas invariantes remetido ao Parlamento, a 31 de agosto, o Governo contabiliza ainda entre as medidas da sua autoria com impacto no próximo ano: 177 milhões de euros do acordo com os professores, 165 milhões de euros com as forças de segurança e 70 milhões de euros do aumento do Complemento Solidário para Idosos.

O Primeiro-Ministro Luís Montenegro recebe o secretário-geral do PS Pedro Nuno Santos num encontro tendo em vista o Orçamento do Estado para 2025 - 27SET24
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, recebe o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, num encontro tendo em vista o Orçamento do Estado para 2025.Hugo Amaral/ECO

 

… e as contas das medidas do PS

O PS já colocou várias condições para a viabilização do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025). Desde logo recusa liminarmente qualquer “modelação” das propostas do Governo para a descida do IRC e IRS Jovem.

“Não podemos viabilizar um Orçamento que inclua aquelas medidas, são caras e injustas. Em coerência, não podemos viabilizar – e não se trata de salvar a face. A nossa preocupação é não dar o nosso voto a medidas que teriam um caráter estrutural, que seriam e altamente lesivas da capacidade orçamental do Estado. O PS não pode dar o seu voto a nenhuma dessas medidas”, afirmou o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, na sexta-feira passada depois de ter reunido com o primeiro-ministro.

E deixou claro que “o Orçamento será 99% da responsabilidade do Governo”, tese contrariada pelo primeiro-ministro. “É uma meia verdade que deve ser corrigida. Esses 99% só podem referir-se aos condicionamentos orçamentais de qualquer Governo, desde logo despesa com salários, pensões, despesas com o funcionamento de toda a Administração Pública e de todos os departamentos, das despesas de investimentos que já vêm de governos anteriores”, esclareceu Luís Montenegro.

Para o PS viabilizar o OE não basta que o Governo deixe cair o IRS Jovem. Em vez de gastar mil milhões de euros com a descida do imposto, os socialistas propõem dedicar essa verba a outras três medidas. Pedro Nuno Santos quer “um orçamento para todos e não apenas para alguns”, argumentou.

O Primeiro-Ministro Luís Montenegro recebe o secretário-geral do PS Pedro Nuno Santos num encontro tendo em vista o Orçamento do Estado para 2025 - 27SET24
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, recebeu o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, num encontro tendo em vista o Orçamento do Estado para 2025.Hugo Amaral/ECO

Assim, o líder dos socialistas quer que o Executivo abdique do IRS Jovem que custa mil milhões de euros e, em alternativa, inscreva 970 milhões de euros para habitação, pensões e SNS. Desses 970 milhões, 500 milhões de euros serão para investimento público na construção e reabilitação de novas habitações para a classe média, nomeadamente jovens, e de residências estudantis.

“Da mesma forma que o IRS Jovem seria uma medida permanente, esta dotação deve ser repetida por, pelo menos, 10 anos, até perfazer um investimento total de cinco mil milhões de euros em novas casas e residências universitárias”, segundo a proposta que Pedro Nuno levou para a reunião com Luís Montenegro.

Um envelope financeiro de 270 milhões de euros seria gasto com um aumento extraordinário de 1,25 pontos percentuais para pensões até 1.565 euros, “a acrescentar ao aumento que decorrerá da aplicação da lei de atualização das pensões”, de acordo com a proposta socialista.

“Com este aumento extraordinário de 1,25 pontos percentuais, as pensões de reforma até aos 1.043 euros aumentarão 3,75%, e aquelas entre os 1.043 euros e os 1.565 euros aumentarão 3,25%”, calcula o PS. “Este aumento será financiado pelo OE e consolida no valor das pensões, isto é, será refletido no valor das pensões para efeitos de futuras atualizações anuais”, de acordo com a mesma missiva entregue ao Governo.

Outra fatia de 200 milhões de euros deverá ser destinada ao reforço do regime de exclusividade dos médicos no SNS, de adesão voluntária, para “que seja suficientemente generoso, de forma a reter e atrair profissionais para o SNS”, segundo o projeto que Pedro Nuno Santos levou para as negociações.

Já em alternativa à descida transversal IRC de dois pontos percentuais, até ao final da legislatura, de 21% para 15%, e que custaria 500 milhões de euros aos cofres do Estado, com o maior impacto a sentir-se em 2026, o PS propõe aprofundar os regimes de incentivo salarial e de capitalização das empresas existentes.

Para Pedro Nuno Santos, “o IRC não é um problema hoje para as empresas que temos em Portugal”, mas “faria ao Estado perder, com a primeira redução, 500 milhões de euros” e, “se atingisse o objetivo do Governo, 1.500 euros”. Estes montantes seriam “entregues a conjunto de setores a empresas com pouco impacto na transformação da economia portuguesa”.

Por isso, os socialistas apostam noutro caminho e propõem “melhorar o incentivo fiscal à valorização salarial através de um aumento de 150% para 200% da majoração dos custos com aumentos salariais superiores ao previsto em Instrumentos de Regulamentação Coletiva de Trabalho”. Esta medida teria um custo de 40 milhões de euros.

Também é proposto um reforço “do incentivo à capitalização das empresas, aumentando os limiares de dedutibilidade dos aumentos de capitais próprios, e tornando estrutural a majoração de 50% que foi instituída como medida transitória no Orçamento do Estado para 2024″, segundo o documento do PS. Para esta medida, o partido calcula uma despesa de 60 milhões de euros.

Em sede de IRC, o custo das medidas do PS totaliza os 100 milhões de euros, enquanto a descida do imposto proposta pelo Governo iria ter um impacto de 500 milhões de euros.

Esta quinta-feira ao final do dia, Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos voltam a reunir-se em S. Bento, no âmbito das negociações para o OE2025, depois do debate quinzenal, no Parlamento, que tem início às 15h.

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