Um Orçamento sem aumento de impostos e um excedente irrevogável
Aritmética parlamentar obrigou a cedências no Orçamento do Estado para 2025, mas ainda não garantiu a viabilização. Excedente de 0,3% é para manter.
Eram cerca das 16h10 quando o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, subiu ao púlpito improvisado no Salão Nobre do Ministério das Finanças para apresentar o Orçamento do Estado para 2025 (OE2025) que tinha entregado cerca de uma hora antes no Parlamento. Perante a plateia de jornalistas, durante cerca de 50 minutos, o governante procurou passar duas mensagens principais: este é o Orçamento que não sobe impostos e é preciso responsabilidade na especialidade para não pôr em causa um excedente de 863 milhões de euros.
Centrado em três eixos, o Orçamento assume três objetivos políticos: recuperar o Estado, reformar o contexto e relançar o contexto económico. Para o fazer, contudo, não traz alterações estruturais e fica longe do choque fiscal prometido pela Aliança Democrática (AD) no programa eleitoral. Até porque a negociação com o PS, partido que o Governo elegeu como parceiro privilegiado, obrigou a cedências.
Entre avanços e recuos, o Executivo liderado por Luís Montenegro, como já anunciado publicamente, cedeu no IRS Jovem – o que o primeiro-ministro reconheceu esta semana ter sido benéfico – e, em larga medida, na redução do IRC. As adaptações para incorporar contributos dos socialistas levaram mesmo a uma revisão em baixa do custo da alteração ao regime do imposto sobre rendimentos dos jovens, que passou para 525 milhões de euros no próximo ano. Já o impacto de um ponto da redução do imposto sobre os lucros das empresas para 20% far-se-á sentir sobretudo em 2026.
“Não me recordo de um Orçamento que, reduzindo alguns impostos, não agrava nenhum imposto”, afirmou Miranda Sarmento, com a restante equipa das Finanças na primeira fila. Para isso suporta-se nos números estimados da carga fiscal: que se situe em 37,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2025, menos 0,3 pontos percentuais do que o estimado para 2024
Não me recordo de um Orçamento que, reduzindo alguns impostos, não agrava nenhum imposto.
E defende: “É um Orçamento bom para o país, para as pessoas e que procura resolver os problemas”. Para o concretizar a receita assenta num saldo orçamental que permita margem para suportar medidas de política que, na sua expetativa, impulsionam o crescimento, mas sem sacrificar os serviços públicos, garante. “O país não está neste momento em condições, quer do ponto de vista dos serviços públicos ou da carga fiscal ou da execução do Plano de Recuperação e Resiliência, não está em condições de ter superavits muito elevados”, disse.
Neste sentido, construiu um cenário macroeconómico, que assumiu, “cauteloso”: um crescimento da economia de 1,8% este ano e de 2,1% em 2025, com um excedente de 0,4% em 2024 e de 0,3% em 2025 e uma redução da dívida pública para 95,9% este ano, caindo para 93,3% em 2025.
A impulsionar o crescimento no próximo ano estará sobretudo o aumento das exportações (3,5%) e do investimento (3,5%) e do consumo privado (2%), resultado quer de uma recuperação dos principais parceiros comerciais do país, da execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e do aumento do rendimento das famílias.
Como reflexo da atividade económica, espera arrecadar 63.337,9 milhões de euros com impostos em 2025, um aumento de 3,7% face a 2024. Como tradicionalmente, o IVA continua a ser o principal imposto a contribuir para encher os cofres do Estado, embora em termos percentuais a maior subida se registe na receita do ISP (21,7%). A receita fiscal com os impostos indiretos recua ligeiramente (-1,1%) no próximo ano face a 2024, para 27.967,2 milhões de euros, compensada pelo aumento (7,9%) da receita com impostos indiretos, para 35.370,7 milhões de euros, apoiada no consumo.
Aumento da despesa é superior ao da receita
O Ministério das Finanças estima que a despesa pública suba de 44,4% em 2024 para 45,2% em 2025, mais 0,8 pontos percentuais, e a receita total cresça de 44,8% para 45,5%, um aumento de 0,7 pontos. Na prática, o aumento da despesa é superior ao da receita em 0,1 ponto, o que se traduz na redução do excedente orçamental previsto de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2024 para 0,3% em 2025.
A influenciar a evolução da receita estarão os contributos da receita fiscal das Administrações Públicas (variação de 3,3%) e das contribuições sociais efetivas (variação de 6,8%), em linha com a evolução esperada para o emprego e para a massa salarial, bem como o aumento da receita de capital (44%) e da outra receita corrente (20,1%), que resultam da aceleração da execução das verbas no âmbito dos fundos do PRR. A contribuir para o saldo positivo estão também os dividendos da Caixa Geral de Depósitos (CGD) ao Estado de cerca de 680 milhões de euros.
Excedente orçamental previsto para 2025 corresponde a 863 milhões de euros, ou seja, 0,3% do PIB.
Do lado da despesa, destacam-se os aumentos de 16,7% com o investimento – fortemente influenciado pela execução do PRR -, de 5,8% das despesas com pessoal, de 10,4% com juros, de 11% da outra despesa corrente e de 37,1% da despesa de capital. Realçam-se ainda o aumento de 4% das prestações sociais e de 5,8% dos consumos intermédios. O Governo estima que as principais medidas de política orçamental têm um impacto negativo de 2.684 no saldo orçamental, devido a um aumento da despesa de 1.711 milhões de euros e uma perda de receita de 973 milhões de euros.
No final do dia, o excedente orçamental previsto para 2025 corresponde a 863 milhões de euros. “Estamos bastante confortáveis se a economia continuar a crescer em torno de 2%” para que o saldo se mantenha, vincou Miranda Sarmento, para acrescentar que, com o ligeiro saldo positivo, é preciso contenção da oposição na apresentação de medidas na especialidade caso a proposta orçamental passe o primeiro teste de fogo de debate e votação na generalidade nos dias 30 e 31 de outubro. Até porque, com a atual aritemética parlamentar poderão passar medidas à revelia do Governo.
“O que se pede à oposição é responsabilidade na viabilização do Orçamento do Estado e depois responsabilidade na discussão e votação na especialidade”, afirmou, apelando a que não introduzam medidas que “alterem o objetivo do país de ter superavit de 0,3 no próximo ano”, porque “é fundamental para cumprir as regras europeias e continuar a reduzir a dívida pública”.
Com o desfecho do Orçamento em aberto, com o PS a remeter o sentido de voto para depois de conhecer a proposta, Miranda Sarmento realçou que o país se comprometeu com a Comissão Europeia com o cenário orçamental e que estará inscrito no plano orçamental estrutural de médio prazo, que será enviado a Bruxelas na sexta-feira. E atirou ao secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, que este “depois da última reunião com o primeiro-ministro” disse “que estava comprometido com o saldo orçamental que o Governo pretendia no próximo ano”.
O que se pede à oposição é responsabilidade na viabilização do Orçamento do Estado e depois responsabilidade na discussão e votação na especialidade
Para as Finanças, “as projeções do cenário macroeconómico para 2025, em linha com o ano de 2024, que conjugado com o pacote de medidas apresentado e os efeitos dos estabilizadores económicos terão um impacto relativamente neutral no saldo orçamental, o que permitirá manter um saldo equilibrado e necessário para a sustentabilidade a longo prazo das contas públicas“.
Ainda assim ficou a promessa: “Se no próximo ano houver margem orçamental, vamos repetir a medida que tomámos este ano e atribuir um suplemento extraordinário aos pensionistas“, apontou, indicando que essa avaliação irá ser feita durante o verão do próximo ano.
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