Com Alemanha e França em crise, Montenegro vende Portugal como “destino seguro de investimento”
Primeiro-ministro destaca estabilidade política, orçamental e social em Portugal, em contraponto com a agitação no resto da Europa. Insiste no tema da segurança e coresponsabiliza oposição por OE2025.
Luís Montenegro admitiu esta terça-feira que “as incertezas que estão no horizonte” na Alemanha e em França podem “condicionar o futuro próximo”, lembrando a instabilidade política e financeira que atravessam as duas maiores economias europeias. No entanto, o primeiro-ministro recusa “lamuriar-se” e assume mesmo que Portugal pode nesta fase “impor-se” no contexto internacional, aproveitando as debilidades nos outros países do Velho Continente.
“Nunca tirámos da equação sermos também parte das políticas europeias, não devemos encará-las como uma coisa externa e devemos participar nas políticas europeias. Mas do ponto de vista do nosso interesse nacional, podemos assumir-nos na Europa – e a partir da Europa também no mundo – como um destino seguro de investimento e de aproveitamento do capital humano e empresarial, para podermos ser mais produtivos, eficientes na criação de riqueza e, com isso, colocar em marcha o nosso objetivo de crescimento e dar durabilidade à nossa trajetória [económica]”, refere Montenegro.
Numa intervenção durante a 7.ª edição da Fábrica 2030, uma conferência organizada pelo ECO na Alfândega do Porto, o chefe do Executivo insistiu que Portugal beneficia atualmente de uma imagem forte no exterior, posicionando-se como um dos países na Europa com melhores condições para atrair investimentos na região. Para Luís Montenegro, esta credibilidade externa, conquistada nos últimos anos à custa de medidas de controlo orçamental e de contas públicas certas, poderia ser deitada por terra num cenário de instabilidade política em Portugal.
Com o Orçamento do Estado para 2025 aprovado com a ajuda do PS, o primeiro-ministro salientou o cenário de estabilidade política no país, salvaguardando a “imagem forte” que Portugal transmite no exterior. “Podíamos não ter investido tanto nessa aprovação e dar ao país outra saída para resolver esse impasse” no Parlamento, mas “do ponto de vista da nossa credibilidade internacional, esta aprovação do Orçamento tinha essa importância”, argumentou.
É que, completou o primeiro-ministro, se houvesse “instabilidade política interna em Portugal íamos desbaratar a credibilidade externa que temos” e que é preciso “saber aproveitar”. Por outro lado, em contraponto com a alternativa de convocar eleições antecipados, era necessário garantir que “não [se perderia] a capacidade do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)”. “Não podemos mesmo ficar para trás”, reforçou o governante durante a mesma intervenção.
"Não sou apologista de contas públicas equilibradas à custa de tudo, mas se houvesse instabilidade política interna em Portugal íamos desbaratar a credibilidade externa que temos e que precisamos de saber aproveitar.”
Em relação ao tema das contas certas, o primeiro-ministro notou não ser apologista de “contas públicas equilibradas à custa de tudo”, mas reconheceu a importância que tiveram para construir esta imagem do país junto dos investidores estrangeiros. “Se olharmos hoje para Portugal, Espanha, Itália, mesmo Alemanha, Grécia, talvez nós e os gregos sejamos os que têm melhores condições para atrair maiores investimentos”, acrescentou.
Ainda a propósito do Orçamento do Estado para 2025, referiu que o documento “é do Governo porque tem na base a implementação de políticas decididas” pelo Executivo. No entanto, responsabiliza igualmente os partidos da oposição pelo documento, uma vez que “por opção deles, legítima, voluntária e intencional, várias normas foram aprovadas por eles, incluindo contra a vontade do Governo”.
Já sobre a credibilidade das ambiciosas projeções de crescimento para a economia portuguesa até ao final da legislatura, Montenegro respondeu que “a variável fundamental é o investimento” e, por isso, o país tem de ser “especialmente atrativo do ponto de vista fiscal, da carga burocrática, na atração do talento e em potenciar clusters de atividade para incrementar boas cadeias de valor e planos de negócio”. E particularizou a importância da redução do IRC por “dar aos que estão a observar e decidir a localização de investimentos o impulso que estão à espera de receber”.
Montenegro insiste na segurança. “Vejam Suécia, Holanda ou Bélgica”
Além da estabilidade política e económica, Luís Montenegro apontou a segurança como outro “aspeto crucial para a vida económica e para a captação de investimento” para o país. “Somos mesmo um dos países mais seguros do mundo. Tenho mesmo muita convicção no que digo: somos objetivamente um dos países mais seguros do mundo”, repete.
No entanto, salienta o primeiro-ministro, “os portugueses exigem que isto não seja apenas uma proclamação, e que depois nos podemos sentar à espera da sua manutenção eterna”. “É preciso, obviamente, travar qualquer fenómeno de aumento de criminalidade que possa pôr em causa este valor em si. Porque há países que há alguns anos eram tão seguros como nós e hoje não são. Vejam a Suécia, a Holanda ou a Bélgica. Este elemento não está garantido por si mesmo. E dizer isto não aumenta o sentimento de insegurança, aumenta o sentimento de segurança e de estabilização”, resume.
Apesar de insistir no tema da ameaça sobre um aumento da criminalidade no país, o primeiro-ministro defende que Portugal “é um país que sabe acolher e integrar imigrantes – e precisa deles em todos os segmentos, dos mais indiferenciados aos mais qualificados”. Por outro lado, reclama que o país tem atualmente “políticas de retenção do talento” que não tinha há oito meses. Não só ao nível do acesso ao mercado de trabalho, como na componente fiscal, sublinhando o caso do IRS Jovem. “Os jovens que vêm trabalhar para Portugal têm o retorno do seu esforço de trabalho e isto é fundamental para atrair e reter talento”, frisa Montenegro, garantindo que “[tem] sido abordado por colegas europeus para abordar este mecanismo, com interesse em inspirar-se” nele para que seja aplicado, com adaptações, nos seus próprios países.
A retenção do talento na administração pública foi outro dos pontos destacados pelo chefe do Governo, dramatizando a importância de ter “capacidade para responder rápido e bem às solicitações” dos agentes económicos. Para isso, diz que é preciso ter “bons mecanismos de gestão”, frisando que o Executivo está a “tentar aliviar os processos de licenciamento”. “A administração pública precisa de bons recursos humanos e precisa de ser atrativa – coisa que deixou de ser na última década – para os que são potencialmente mais bem preparados para atingir bons resultados. Para isso é preciso ter boas carreiras e bons instrumentos de trabalho”, remata Montenegro.
Campeões europeus “desde que não estejam todos na França e Alemanha”
No plano internacional, questionado pelo diretor do ECO sobre se a França pode ser a nova Grécia, do ponto de vista da instabilidade financeira e do arrastamento da Zona Euro, o primeiro-ministro recusou assumir esse cenário, mas admitiu que “é uma situação que preocupa, por juntar instabilidade política e financeira”. “É preciso estancar as duas: que haja estabilidade política para depois haver um caminho de recuperação financeira, que não seja suscetível de contaminar a Zona Euro”, sublinhou.
E no que toca à perspetiva de o Banco Central Europeu continuar a descer as taxas de juro diretoras, Luís Montenegro disse apenas que será “vantajoso que continuemos a ter uma política de taxas de juro que possa assegurar a estabilização da inflação e para que o financiamento da economia seja atrativo para os investidores terem na Europa instrumentos para desenvolverem as suas capacidades”.
"É inadmissível que a interligação [energética] não esteja feita. É uma pedrada na igualdade de oportunidades, na autonomia, na dependência da Europa face ao fornecimento de energia e, no caso da Península Ibérica, estamos a desaproveitar investimentos feitos.”
Ainda no plano europeu, o relatório Draghi propôs a criação de uma espécie de campeões europeus para competir com os EUA e a China. Montenegro diz que é “defensor dessa lógica, desde que não estejam todos localizados na França e na Alemanha”, precisando a Europa de ter “instrumentos para deslocalizar investimentos e aproveitar o potencial de cada região e Estado-membro”.
“Como defendo que em Portugal tenhamos cada vez mais grandes empresas, acho que a Europa deve ter gigantes comerciais e industriais, desde que a estratégia que visa a sua constituição e desenvolvimento não esteja refém apenas do interesse da França e da Alemanha – e agora há mais países a entrar nessa órbita”, contextualiza. “Se houver campeões descentralizados, a Europa pode ganhar. Se forem centralizados, vai-se pagar isso no momento seguinte”, rematou.
Finalmente, durante a mesma conferência, o chefe do Executivo considerou “inadmissível” que, dez anos depois de ter sido assinado o processo de integração da Península Ibérica no mercado interno da energia, esta interligação ainda não esteja feita, prejudicando o país. Mas também a Europa, que não tira partido da energia produzida na região.
“É inadmissível que esta interligação não esteja feita. É uma pedrada na igualdade de oportunidades, na autonomia, na dependência da Europa face ao fornecimento de energia e, no caso da Península Ibérica, estamos a desaproveitar investimentos feitos”, atirou Montenegro, notando que Portugal vai defender uma política de coesão de igualdade na União Europeia. “Vamos defender a possibilidade de ser produtores de energia e a podermos exportar”, acrescentou Montenegro, destacando que a questão energética “é um ponto essencial das políticas de coesão europeia”.
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