Contratos de teletrabalho aumentam 30% num ano. Grande Lisboa lidera

Contratos sem termo que preveem exercício de funções em teletrabalho aumentaram 30% num ano, tendo sido esta a quarta subida anual consecutiva. Lei do teletrabalho pode mudar este ano.

Há muito que a pandemia terminou e que a adoção do teletrabalho deixou de ser obrigatória. Mas o número de contratos de trabalho que preveem especificamente o exercício de funções à distância não tem parado de subir. Apenas num ano, aumentou 30%, superando a fasquia dos três mil contratos. E segundo a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, as regras do teletrabalho serão um dos pontos da lei do trabalho que estarão em cima da mesa da Concertação Social este ano.

De acordo com os dados recentes do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, dos quase 3,3 milhões de trabalhadores por conta de outrem registados em Portugal em 2023, cerca de 2,3 milhões tinham contratos sem termo. E, destes, 3.006 previam a prestação subordinada de teletrabalho.

Em comparação, no ano anterior, contavam-se 2.305 contratos deste tipo, o que significa que houve um salto de 30%, de acordo com os cálculos do ECO.

Quatro subidas consecutivas dos contratos de teletrabalho sem termo

Fonte: GEP

Também nos contratos a termo registou-se uma tendência semelhante. Os contratos a prazo certo para prestação em teletrabalho dispararam quase 48% entre 2022 e 2023. E os contratos a termo incerto para prestação de teletrabalho cresceram mais de 12%.

Importa notar que em qualquer um destes vínculos (sem termo, a termo certo e a termo incerto) verifica-se um salto em comparação com os números verificados cinco anos antes (ou seja, face a 2018), o que reflete o boom do teletrabalho causado pela pandemia, mas também a popularidade continuada deste modelo de trabalho, mesmo depois da crise sanitária ter sido resolvida.

Contratos de teletrabalho com termo também aumentam

Fonte: GEP

No caso dos contratos de teletrabalho sem termo, entre 2018 e 2023, houve um disparo de 405,2%, passando de 595 contratos para os tais 3.006. Já nos contratos de teletrabalho a termo certo, a subida foi de 85,9% (de 156 para 290). E nos contratos de trabalho a termo incerto, o salto foi de 160,7% (de 28 para 73), de acordo com as contas feitas com base nos Quadros de Pessoal.

Mas nem todos os setores estão a abraçar o teletrabalho da mesma forma (até face à características do trabalho implicado em cada uma das atividades). Em 2023, as atividades de informação e comunicação registaram o maior número de contratos de teletrabalho sem termo. Em causa estão 776 contratos, o equivalente a um salto de 113,2% face a 2022. Ou seja, mais do que duplicaram os contratos de teletrabalho neste setor.

Setores com mais contratos de teletrabalho

Atividades de informação e comunicação: 776 contratos sem termo
Indústria transformadora: 691 contratos sem termo
Atividades de consultoria: 479 contratos sem termo

No pódio, estão também a indústria transformadora (com 691 contratos de teletrabalho sem termo, mais 43,7% do que em 2022) e as atividades de consultoria (com 479 contratos de teletrabalho sem termo, mais 14,3% do que em 2022).

Já no setor da captação, tratamento de água, gestão de resíduos e despoluição, só havia três contratos deste tipo em todo o país. E na indústria extrativa somente quatro, mostram os dados do GEP.

É de destacar que há também uma diferença expressiva entre as várias regiões do país: a Grande Lisboa concentra mais de metade dos contratos de teletrabalho sem termo (2.149 dos tais 3.006). O Norte é a segunda região onde esse modelo é mais popular, mas está distante da região da capital portuguesa, com 474 contratos de teletrabalho sem prazo.

Regras do teletrabalho em discussão

A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, intervém durante a sua audição na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão, sobre o Orçamento do Estado para 2025, na Assembleia da República.ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Até à pandemia, a aplicação do teletrabalho era residual em Portugal, mas a Covid-19 provocou um boom deste modelo de trabalho. Tanto que, no final de 2021, perante a ausência de regras no Código do Trabalho sobre o teletrabalho, os deputados aprovaram mesmo uma nova lei, que entrou em vigor em janeiro do ano seguinte.

Essa lei sofreu mudanças em 2023, de modo a esclarecer algumas dúvidas que persistiam quanto ao pagamento das despesas associadas ao teletrabalho. E pode voltar a ser alvo de alterações este ano.

É que a ministra do Trabalho já identificou as regras do teletrabalho como uma das normas da lei do trabalho que estarão em cima da mesa da Concertação Social, no âmbito da revisitação da chamada Agenda do Trabalho Digno. Ao ECO, a Confederação Empresarial de Portugal (CIP) defende mesmo que importa usar esse debate para reequilibrar o regime do trabalho, não avançando detalhes, para já.

Como fenómeno de uso massivo recente, parece-me bastante natural que se sinta necessidade em ir ajustando o regime legal à evolução do contexto do mercado.

Rui Valente

Sócio da Garrigues

“Como fenómeno de uso massivo recente, parece-me bastante natural que se sinta necessidade em ir ajustando o regime legal à evolução do contexto do mercado e aos ensinamentos recolhidos dos primeiros tempos de aplicação da nova lei“, argumenta, a propósito, o advogado Rui Valente.

O sócio da Garrigues sublinha que “talvez se possa, por exemplo, caminhar para um quadro legal com menor desconfiança em relação ao teletrabalho” e acrescenta que os termos em que o direito à desconexão foi tratado têm “clara margem para clarificação e melhoria”.

Também a advogada Madalena Caldeira, coordenadora da área do Direito do Trabalho do escritório de Lisboa da Gómez-Acebo & Pombo, realça que o regime carece de mudanças, nomeadamente no que diz respeito aos meios de controlo do trabalho à distância.

“Não significa que seja desejável, muito menos correto, instituir uma espécie de Big Brother laboral, nem que os direitos do trabalhador à sua privacidade e a desligar devam ser sacrificados. Significa, apenas, que o regime, tal como está, não permite ao empregador exercer aquele que, afinal, é um dos seus poderes: o poder de direção“, atira.

Já a advogada Inês Arruda, sócia da Pérez-Llorca Lisboa, chama a atenção para a necessidade de esclarecer “alguns aspetos em matéria de acidentes de trabalho“. “Existem zonas cinzentas, que seria prudente esclarecer antes que o acidente aconteça”, salienta.

Ainda não há data para a discussão destas regras na Concertação Social, mas as confederações empresariais já pediram que a lei do trabalho seja uma das prioridades das negociações de 2025.

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