Os resultados da empresa familiar de Montenegro vistos à lupa
A empresa fundada pelo primeiro-ministro em 2021 registou lucros acumulados de 342 mil euros em três anos, apresentou margens operacionais superiores a 45% e sem qualquer endividamento.
A empresa fundada pelo primeiro-ministro Luís Montenegro em janeiro de 2021 apresenta um perfil financeiro marcado por crescimento rápido, margens operacionais elevadas e acumulação de lucros significativos.
Com um capital social de 6 mil euros, a Spinumviva – hoje gerida pela mulher e pelos dois filhos do líder do Governo – faturou 718.166 euros nos últimos três anos até 2023 (os resultados de 2024 ainda não são conhecidos), acumulando ao longo deste período 342 mil euros de lucros.
Este desempenho foi impulsionado por margens operacionais (margem EBIT) elevadas de 35,3% em 2021, 75,3% em 2022 e 46,2% em 2023. Em 2022, ano em que Montenegro ainda era sócio-gerente (até junho), a empresa atingiu o pico de rentabilidade, com o passivo a corresponder a apenas 24,7% das vendas e serviços prestados, segundo as demonstrações financeiras da empresa consultados pelo ECO.
Mudança de estrutura acionista
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A 30 de junho de 2022 Luís Montenegro renunciou ao cargo de gerente da Spinumviva e transferiu 92% da sua participação (3.450 euros) para a mulher e os restantes 8% da sua posição (400 euros) foram distribuídos de forma igual pelos dois filhos. Com essa operação, a mulher de Luís Montenegro passou a deter 92% do capital da empresa e os dois filhos 4% cada.
No balanço, os ativos fixos tangíveis limitavam-se a 20.550 euros no final de 2023, sem evidências de imóveis ou terrenos significativos, contradizendo parcialmente o objeto social inicial de “gestão de bens imobiliários”. E o capital próprio da Spinumviva ascendia em 2023 a 342 mil euros, fruto da retenção integral dos lucros desde a sua fundação, não tendo havido qualquer distribuição de dividendos nem a realização de qualquer operação de aumento de capital.
Os dados financeiros da Spinumviva revelam ainda uma estrutura de passivo “enxuta” e simplificada, não apresentando registo de empréstimos ou dívidas a entidades públicas, ao mesmo tempo que os custos operacionais mantêm-se contidos:
- Custos com pessoal: Dois colaboradores em 2022 (um em tempo integral) e quatro em 2023 (um em part-time).
- Despesas gerais: Incluem “fornecimentos e serviços externos”, mas sem detalhes públicos.
Conflito de interesses e questões de transparência
A ausência de endividamento e a baixa alavancagem reforçam a dependência do negócio de receitas resultantes da prestação de serviços, como foi também referido por Luís Montenegro em resposta ao Correio da Manhã.
“Do vasto objeto social dessa empresa [Spinumviva], apenas a prestação de consultoria no âmbito da proteção de dados pessoais teve execução”, disse o primeiro-ministro, sublinhando ainda que “por ironia do destino, o grupo de comunicação social que integra o Correio da Manhã foi um dos clientes.”
A discrepância entre o objeto social original (gestão imobiliária) e a atividade real (consultoria) foi justificada por Montenegro como um “plano não concretizado” de incorporar património herdado. De acordo com o relatório entregue no ano passado por Luís Montenegro à Entidade para a Transparência, consultado pelo Correio da Manhã, o primeiro-ministro detinha 54 propriedades imobiliárias, num valor total de 639 mil euros.
A Spinumviva tornou-se alvo de escrutínio após denúncias de potenciais conflitos de interesses, especialmente após a aprovação de alterações à Lei dos Solos, dado que a empresa ainda é gerida pela família de Luís Montenegro e que assim poderia beneficiar de valorizações imobiliárias indiretas.
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Face a estas considerações, que levaram inclusive o Chega a avançar com uma moção de censura, o primeiro-ministro negou veementemente tais acusações, afirmando que a empresa nunca teve relações com entidades públicas, não realizou transações imobiliárias e que não tem influência na gestão.
Reafirmando que não considera que haja qualquer conflito de interesses por a sua família deter uma empresa ligada ao imobiliário, Luís Montenegro, que se encontra atualmente em Brasília, recorreu à sua conta na rede social “X” para remeter qualquer resposta a este caso e à atual situação política interna quando regressar a Portugal.
Os dados operacionais da Spinumviva revelam uma empresa rentável, que é visível, por exemplo, pelos lucros gerados ao longo dos últimos três anos num montante equivalente a 57 vezes acima do seu capital social e com uma rendibilidade do capital próprio de 90,8 vezes. A eficiência operacional é inegável, mas num contexto em que o primeiro-ministro prometeu exemplaridade absoluta, a pressão por esclarecimentos adicionais parece inevitável.
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