Governo perdoa dívida de 157 milhões ao privado que gerir a Silopor
Dias antes de entrar em gestão, o Executivo de Montenegro decidiu que "a dívida relativa a juros", de 157 milhões, "ficará no Estado" para não colocar "em causa o futuro da nova sociedade".
O Governo vai perdoar a dívida da Silopor ao Estado relativa a juros, de 157 milhões de euros, para libertar desse encargo o futuro privado que ficar com a concessão da gestão dos silos da Trafaria (Almada), Beato (Lisboa) e Vale de Figueira (Santarém), responsáveis pelo armazenamento de mais de metade dos cereais consumidos em Portugal, segundo uma resposta enviada pelo gabinete do Ministério das Finanças ao grupo parlamentar do Livre e a que o ECO teve acesso e disponível no site do Parlamento.
Todos os anos, a Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) tem reclamado o pagamento de mais de 157 milhões de euros em juros que remontam a uma dívida da década de 80 e que a Silopor se tem negado a liquidar por considerar que já prescreveram.
A poucos dias de entrar em gestão, o Executivo de Montenegro aprovou o diploma que arranca com o processo de privatização da concessão da Silopor. E, nos esclarecimentos prestados agora aos socialistas, o Ministério das Finanças, de Joaquim Miranda Sarmento, revela que vai deixar cair a dívida em causa para não prejudicar o futuro privado que ficar com a gestão dos silos.
“Com a transmissão da exploração da atividade da Silopor e liquidação desta sociedade, a dívida relativa a juros ficará no Estado, não colocando em causa o futuro da atividade da nova sociedade nos terminais portuários”, segundo a mesma missiva.
O decreto-lei, aprovado no Conselho de Ministros de 7 de março, que inicia os procedimentos para a privatização da concessão dos silos, prevê a transmissão da Silopor para uma sociedade a constituir pela Administração do Porto de Lisboa (APL), uma entidade do setor empresarial do Estado “de capitais exclusivamente públicos”, salienta o gabinete de Miranda Sarmento.
“A constituição desta nova sociedade permitirá liquidar, definitivamente, a Silopor”, lê-se na resposta enviada ao Livre. A APL terá depois um ano e meio para “promover o lançamento do concurso público internacional para a alienação do capital social da nova sociedade”, ou seja, para avançar com a privatização da concessão, segundo o mesmo documento.
“Isto é, a atividade da Silopor nos portos de Lisboa e no silo de Vale de Figueira passará a ser desenvolvida por uma sociedade privada, mas tal sucederá através de um contrato de concessão celebrado com uma empresa de capitais exclusivamente públicos”, sublinha.
Acordo de empresa caduca ao fim de cinco anos
Tal como já tinha sido referido pelo Governo, todos os postos de trabalho serão salvaguardados, os quais “serão transferidos para a nova sociedade”. Para além disso, são garantidos “todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissionais e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos, bem como os demais direitos constantes de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho”, indica a tutela.
No entanto, o acordo de empresa vigente na Silopor só será mantido pelo futuro privado durante cinco anos a contar da data da celebração do novo contrato de concessão. Ou seja, daí em diante, tal instrumento de regulamentação coletiva caduca e os direitos e benefícios dos trabalhadores podem ser revistos e alterados.
A concessão à Silopor da gestão dos silos portuários, com capacidade para armazenar e distribuir uma média anual de 3,4 milhões de toneladas de granéis sólidos alimentares, cereais e farinhas, termina a 30 de junho de 2025. Data em que a empresa pública, que está em liquidação há 24 anos, tem de encerrar por imposição da Comissão Europeia, numa decisão tomada ao abrigo de ajudas de Estado consideradas ilegais. A privatização da concessão está prevista desde 2001, mas o processo tem-se arrastando ao longo das últimas duas décadas.
A Silopor foi constituída em 1986 como spinoff da Empresa Pública de Abastecimento de Cereais. Mas, por imperativo das regras comunitárias que consideraram ilegais as ajudas públicas, o então Governo de António Guterres decretou a dissolução da entidade (Decreto-lei 188/2001), com efeitos retroativos a 19 de junho de 2000. A liquidação foi justificada pela impossibilidade de o Estado se “substituir, direta ou indiretamente, à Silopor no pagamento da dívida” que, nesse ano, chegava já aos 163 milhões de euros”.
Reconhecendo a importância da atividade no ramo agroalimentar, ficou na altura estabelecido que a concessão da exploração da atividade da Silopor deveria fazer-se em regime de serviço público, mas mediante a adjudicação a privados, salvaguardando-se a continuidade da gestão corrente da empresa até a privatização da atividade. Tal aconteceu, com sucesso, na concessão do terminal portuário de Leixões, em janeiro de 2007, que foi ganha pela Sogestão do grupo Manuel Champalimaud.
No entanto, o mesmo não sucedeu com a Silopor, cujo concurso, lançado em 2011, acabou por ser anulado em 2014, porque o grupo ETE, candidato que ficou em primeiro lugar, não cumpriu com a caução que tinha de apresentar.
Entretanto, decorreram 10 anos, e nenhum dos Governos anteriores abriram novos procedimentos concursais para adjudicar a atividade a uma entidade privada. O Executivo, de António Costa, que antecedeu ao de Luís Montenegro, chegou a ponderar manter a concessão na esfera pública, entregando-a à Administração do Porto de Lisboa.
A empresa tem como único acionista o Estado português, estando na dependência da Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF).
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