CSO. Uma “função em construção” e a ganhar mais espaço na administração
Esta terça-feira, o CSO Circle, que reúne líderes de sustentabilidade de quase 40 empresas, tem o pontapé de partida.
O Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (BCSD, na sigla em inglês) dá esta terça-feira o pontapé de partida numa nova iniciativa que pretende reunir as empresas em torno do tema da liderança de sustentabilidade, à qual chamou “CSO Circle”, o equivalente a “Círculo de Executivos responsáveis pela Sustentabilidade”.
Ao ECO/Capital Verde, o BCSD e especialistas em governança sublinham o papel decisivo que um executivo com este pelouro pode ter numa organização, e preveem que este deverá ganhar continuar a ganhar relevância. Os responsáveis de sustentabilidade entrevistados destacam a necessidade de alinhamento do topo da empresa com a operação em termos de práticas ESG, assim como a importância de partilhar experiências e métodos de atuação.
“Estamos a criar esta comunidade quer com CSO, que já têm esse papel, como com responsáveis no caminho para ser CSO“, introduz Filipa Pantaleão, secretária-geral do BCSD Portugal. Desta forma, o círculo inclui diretores de sustentabilidade, mas também diretores de risco ou das áreas de compliance, “áreas que estão ligadas à da sustentabilidade”. Entre os atuais 37 membros, contam-se de momento apenas quatro CSO.
O objetivo é criar ligações entre os membros do círculo e que haja transferência de conhecimento entre os mesmos. Pantaleão considera que o papel de CSO é de momento uma “função em construção”. No CSO Circle, “não queremos uma receita única” para o desempenho destas funções, “depende das especificidades de cada empresa”, defende a secretária-geral do BCSD.
Filipa Pantaleão vê esta função como “estratégica”, pelo que entende que lhe deve ser atribuído um poder específico, em vez de ficar reduzida ao reporte de dados. “Tem que haver uma responsabilidade efetiva e forte na administração. Este é o caminho para sustentabilidade ser transversal na empresa“, remata.
“Faz sentido ter um executivo que seja responsável por alinhar os compromissos [de sustentabilidade] com a estratégia da empresa“, entende Maria João Guedes, professora de governança no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Um alinhamento “importante” numa altura em que os investidores e demais partes interessadas procuram empresas com um propósito mais sustentável e duradouro, ao mesmo tempo que estas matérias estão “cada vez mais regulamentadas”.
João Moreira Rato, presidente do Instituto Português de Corporate Governance (IPCG) vê como principal benefício de nomear um CSO o “gerar valor a prazo e tornar a empresa mais resiliente”. Considera esta função “muito importante” na medida em que é o motor de uma estratégia de sustentabilidade “que faça sentido” para a empresa: deve ouvir os stakeholders (partes interessadas) e “ajudar o conselho de administração a ouvi-los”, estando alinhado com os primeiros mas fornecendo informação relevante para alimentar a estratégia.
O CSO pode ainda ter um papel fundamental em detetar novas oportunidades de negócios relacionadas com a sustentabilidade, o que permite expandir a oferta da empresa, ao mesmo tempo que identifica potenciais riscos e exposições que a empresa tenha nestas matérias e minimiza impactos adversos, acrescenta e conclui a professora do ISEG. Por fim, deve promover uma cultura de responsabilidade social e sustentabilidade na empresa.
Contudo, Maria João Guedes reconhece: “a maior parte das empresas não terá um/a CSO apenas com este pelouro“, já que “a maior parte do tecido empresarial é composto por pequenas e médias empresas”, pelo que existe “falta de massa crítica para endereçar estas questões com uma pessoa dedicada a tal“. Geralmente a função recai em quem já exerce outro cargo, por exemplo o CEO ou o CFO.
“O escrutínio destas matérias está sobretudo nas empresas cotadas e grandes empresas“, mas “o compromisso com a sustentabilidade deve existir em todas as empresas, independentemente do setor ou dimensão, adaptado ao modelo de negócio, exigência regulatória e recursos disponíveis”, finaliza Maria João Guedes. João Moreira Rato defende que as empresas mais pequenas terão necessariamente estruturas de sustentabilidade mais pequenas, mas pelo menos no caso das médias empresas a criação da posição de CSO é adequada.
Sobre o futuro da posição de CSO, João Moreira Rato antevê que esta se torne cada vez mais solicitada. “Antes, os CSO tentavam trazer os temas para o conselho de administração. A evolução vai ser o conselho de administração a dirigir mais pedidos aos CSO“, vaticina.
Tendo em conta o atual contexto, de um presidente norte-americano que se opõe à sigla ESG (fatores ambientais, sociais e de governança) e de uma União Europeia que está a simplificar a legislação de sustentabilidade (enfrentando algumas queixas), Filipa Pantaleão afirma que não nota um “esmorecer” do interesse das empresas nestas áreas, embora conceda que os esforços possam processar-se mais vagarosamente.
Líderes de sustentabilidade focados na prática
Fátima Portulez é o membro do conselho executivo da Trivalor com o pelouro da sustentabilidade. “O papel do CSO na organização consiste em compreender o ambiente e trazer ideias valiosas para a empresa, reconfigurar a estratégia da organização, liderar com pensamento estratégico e alinhar as equipas, envolvendo, educando e criando ligações”, entende.
Nesta empresa, desde 2018 que foi criada a Direção de Sustentabilidade e Responsabilidade Social Corporativa, a qual reporta ao membro do Conselho de Administração com o pelouro da sustentabilidade. As mais de 10 participadas da Trivalor têm na sua estrutura elementos responsáveis que trabalham os temas da Sustentabilidade e RSC nas respetivas empresas, na sua maioria integradas na Direção de Qualidade, Ambiente e Segurança. Para Portulez, o objetivo no âmbito do CSO Circle é “impulsionar o ESG e colocar a sustentabilidade no centro da estratégia empresarial“.
Na KPMG, “não existe formalmente um CSO, mas obviamente as funções de CSO estão alocadas na comissão executiva da KPMG“, explica Pedro Cruz, o ESG Coordinator Partner, que estará igualmente presente nos encontros dinamizados pelo BCSD. Como coordenador, Pedro Cruz é responsável por definir toda a estratégia de negócio relacionada com a sustentabilidade, quer no que diz respeito à parte de auditoria, como consultoria. Lidera, desta forma, toda a equipa que presta serviços de sustentabilidade aos clientes.
Na ótica do ESG Coordinator Partner da KPMG, a sustentabilidade da consultora passa sobretudo pelo pilar social, uma vez que “as pessoas são o principal ativo” e também o da Governança, assegurando uma atuação responsável. Encara o CSO Circle como um fórum onde poderá perceber o que as empresas presentes estão a fazer em termos de sustentabilidade, mas também partilhar boas práticas e procurar oportunidades de colaboração.
Catarina Portela Morais, responsável de Ambiente (Environmental Lead) na DLA Piper, também vai estar presente no Círculo de CSO em representação desta sociedade de advogados. A empresa não tem CSO, mas dispõe de uma equipa dedicada a integrar a sustentabilidade na respetiva governação, tomada de decisões e operações. E a líder de Ambiente na sociedade responde diretamente ao managing partner, Nuno Azevedo Neves, o qual remete depois aos membros da liderança global.
“Acredito que este espaço será fundamental para partilhar boas práticas, explorar tendências emergentes e, acima de tudo, colaborar na construção de soluções concretas para acelerar o impacto positivo coletivo”, indica Catarina Portela Morais. Ao mesmo tempo, espera reforçar a sua capacidade de liderança em sustentabilidade e aprender com as abordagens em diferentes setores.
Carla Grou é a managing director das áreas de Empresas e Sustentabilidade na agência de comunicação e marketing All Comunicação. Será também uma das presentes nas reuniões do CSO Circle. A All Comunicação conta com uma equipa de 20 pessoas, e os temas da sustentabilidade são trabalhados por Grou em conjunto com a equipa no seu todo, não existindo uma equipa específica. Embora a agência já implemente medidas como a redução do papel impresso ou do consumo da luz, Carla Grou entende que “há um caminho para fazer” e é isso que pretende entrando no círculo: “perceber o que podemos fazer melhor”, já que “a prática é mais exigente” que a teoria.
A Floene (antiga Galp Gás Distribuição) tem um departamento de sustentabilidade desde o final de 2021, quando a Allianz se tornou acionista. A responsável deste gabinete é Joana Appleton, que acumula esta função com as de Relação com Investidores e a área de Risco e Relação com Stakeholders. “Temas que também se relacionam com sustentabilidade”, e que reporta diretamente ao CEO, trimestralmente, explica.
O departamento entrega aos administradores um relatório com dados ESG e as iniciativas tomadas, assim como os resultados obtidos. A definição de objetivos é feita “pontualmente” pelo Conselho de Administração. Entre as reuniões temáticas que juntaram a administração da Floene desde o início do ano, conta-se uma subordinada ao tema “Sustentabilidade e Risco”, pelo que Joana Appleton considera que estes assuntos fazem parte das prioridades dos acionistas.
Appleton espera encontrar no CSO Circle uma oportunidade de trocar experiências sobre assuntos como a aplicação de novas diretivas ou sobre os métodos usados para fazer uma análise de dupla materialidade.
Os próximos encontros do CSO Circle, marcados para 14 de outubro e 3 de dezembro, têm como temas, respetivamente, “Enquanto CSO, como posso empoderar a sustentabilidade dentro da minha empresa? Como trabalhar a governança?” e “Cultura interna, influência para a decisão, construção de rede e parcerias”.
Contudo, o mote destas discussões futuras pode ser alterado, fruto dos resultados de cada evento, dos momentos de interação entre os membros do CSO Circle, do respetivo feedback e também de condicionantes externas, como o contexto nacional e mundial. Para já, o CSO Circle está desenhado para se manter ao longo deste ano, “mas queremos dar continuidade”, garante a secretária-geral do BCSD.
Além disto, serão realizadas sessões de aconselhamento estratégico em setembro, em parceria com Instituto Português de Corporate Governance (IPCG), com base em tópicos e questões identificadas pelos participantes.
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