Fed reabre a porta dos cortes nos juros, mas não com a força que Trump exige

A Reserva Federal vai cortar os juros pela primeira vez este ano, agora mais preocupada com os empregos do que com a inflação. Descida de 25 pontos base não será tão 'big' como Donald Trump gostaria.

“Está perfeito para cortar”. A frase proferida este domingo por Donald Trump sobre as taxas de juro vai desta vez ao encontro das opiniões de analistas, investidores e, muito provavelmente, do comité de política monetária da Reserva Federal (Fed). Após uma pausa cautelosa de nove meses que provocou a constante ira do republicano, o banco central dos Estados Unidos está pronto para esta quarta-feira cortar as Federal Funds Rates, com os receios sobre o arrefecimento do mercado de trabalho a sobreporem-se aos do acelerar da inflação devido à guerra comercial.

Mas com Trump nada é consensual e há, claro, uma divergência fundamental – a escala do corte no custo do dólar, que está desde dezembro no intervalo 4,25%-4,50%. O presidente americano e alguns dos seus aliados (por si nomeados) no comité de política monetária (FOMC, na sigla em inglês) pressionam a Fed para fazer um corte “big“, ou seja, um corte imediato de pelo menos 50 pontos base nas taxas de juro, mas dificilmente verão esse desejo concedido.

Segundo o site CME FedWatch Tool, que monitoriza a negociação dos futuros das taxas de juro, esta terça-feira a probabilidade de a Fed cortar as Federal Funds Rates em 25 pontos base para o intervalo de 4,00% a 4,25% eram de 96,1%.

 

“Os mercados têm namorado a ideia de a Fed fazer um corte maior, de 50 pontos base, na reunião de setembro, após o crescimento dececionante do emprego durante o verão, mas ainda achamos que uma abordagem mais gradual é mais adequada para o ambiente atual”, referiu Antii Ilvonen, analista sénior para a macroeconomia dos EUA no Danske Bank.

Essa visão é partilhada pela grande maioria dos analistas. Numa sondagem da Reuters, 105 dos 107 economistas consultados apontaram para uma descida de 25 pontos base, com apenas dois a acreditarem num corte ‘jumbo’ de 50 pontos.

Após ter reduzido as taxas várias vezes no final de 2024, a Fed adotou uma postura mais cautelosa este ano, citando preocupações de que a política de tarifas alfandegárias imposta pela administração Trump pudesse alimentar a inflação. Essas preocupações com a inflação ainda eram proeminentes na reunião da Fed em julho, recordaram os analistas do britânico Lloyds Bank.

“No entanto, o discurso do presidente da Fed [Jerome] Powell no simpósio de em Jackson Hole, em agosto, sinalizou uma mudança de foco após um relatório de emprego significativamente mais fraco do que o esperado em julho, com a ênfase agora voltada para sinais de um arrefecimento do mercado de trabalho”.

O relatório do mercado de trabalho de agosto, que novamente mostrou ganhos mais modestos no emprego, “parece ter inclinado a balança para um corte nas taxas em setembro como uma forma de proteção contra riscos de queda”, sublinharam.

Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico.

Rumo e projeções em foco

Com um corte de 25 pontos base nas Federal Funds Rates praticamente garantido, o foco estará nos sinais sobre o rumo nos próximos meses. “Os mercados estão atualmente a descontar totalmente mais um corte nas taxas após setembro, antes do final do ano, com pelo menos mais dois esperados antes de meados de 2026“, vincaram os analistas do Lloyds.

Na sondagem da Reuters, publicada a 11 de setembro, 60% dos economistas afirmaram esperar uma descida total de 50 pontos base até ao final do ano, mas com 37% a preverem um total de 75 pontos.

“Os investidores estarão à procura de confirmação dessa trajetória nas comunicações da Fed após a reunião”, explicaram os analistas do banco britânico, reconhecendo, no entanto, que “a conferência de imprensa do presidente Powell poderá oferecer apenas orientações limitadas — embora ele possa sugerir uma flexibilização adicional, também é provável que saliente a incerteza contínua nas perspetivas económicas, tornando difícil para o Fed comprometer-se com um calendário firme”.

Antii Ilvonen, do Danske Bank, recordou que as novas projeções económicas da Fed, e particularmente a matriz dot plot – gráfico de pontos das expectativas individuais dos membros do FOMC sobre as taxas futuras – fornecerão informações importantes sobre o rumo. “Aqueles que defendem apenas um corte adicional este ano provavelmente preferem um ritmo mais gradual também em 2026, enquanto aqueles que defendem mais dois cortes provavelmente preferem continuar com cortes sequenciais até o início de 2026”, explicou.

A par da incerteza que rodeia a economia norte-americana – com enfoque no impacto da inflação e do mercado do trabalho na eventual estagnação do crescimento –, os investidores têm estado atentos também à questão da independência da Fed, primeiro com as incessantes críticas de Trump a Powell e depois com tentativas do presidente de influenciar a política monetária através da composição do board do FOMC.

“O Presidente Trump está a tornar-se mais incisivo na sua iniciativa para alterar a composição do conselho de governadores da Fed e, entretanto, está a ser promovida uma lista de candidatos mais ‘favoráveis ​​ao crescimento’ para substituir Powell quando o seu mandato expirar em maio de 2026″, afirmou Michael Krautzberger, diretor de investimento global de mercados públicos da Allianz Global Investors.

“Como consequência, nos próximos meses, poderemos ver os mercados das taxas de juro a curto prazo a precificar uma taxa de fundos federais terminal muito abaixo da projeção atual da taxa a médio e longo prazo, em torno dos 3%”, salientou.

Para já e antes da reunião de dois dias do FOMC que começou na terça-feira, Trump registou uma vitória e uma derrota. Esta segunda-feira, um tribunal de recurso recusou permitir que Trump demitisse a governadora da Fed, Lisa Cook — a primeira vez que um presidente toma tal medida desde a fundação do banco central, em 1913 – que o presidente acusa de ter falsificado documentos para obter um empréstimo imobiliário.

Por outro lado, o Senado dos EUA confirmou por uma pequena margem Stephen Miran para o Conselho de Governadores, concedendo ao principal conselheiro económico de Trump um dos 12 votos para definir as taxas de juro. A votação de 48 a 47, em grande parte alinhada com as linhas partidárias, no Senado controlado pelos republicanos marcou a etapa final de um processo rápido que começou em agosto, quando Adriana Kugler renunciou inesperadamente ao cargo de governadora, criando uma vaga para Trump preencher com alguém mais favorável à redução das taxas de juros.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Fed reabre a porta dos cortes nos juros, mas não com a força que Trump exige

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião