Rendas de 2.300 euros são “moderadas”? A explicação do Governo
Os apoios a quem coloca casas a arrendar têm como âmbito as que vão para mercado com renda "moderada", que para o Governo vão até 2.300 euros mensais. Mas o que está na base da definição deste valor?
O Governo trocou o conceito de renda acessível por outro, a que chamou de rendas moderadas, e fixou num máximo de 2.300 euros o teto que define esse universo, e que como tal beneficiará das medidas anunciadas esta quinta-feira por Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz. Porém, surgiu de imediato a questão – sobretudo mas não apenas semântica – de como considerar “moderada” uma renda de casa de 2.300 euros.
O próprio primeiro-ministro antecipou que este podia ser um tema polémico, e atacou-o de imediato, ainda antes de explicar os pormenores das medidas. ” A taxa de IVA de 6%, aplicar-se-á também aos arrendamentos até ao valor de 2.300 euros, à construção, reabilitação de edificado para arrendar até este valor. O valor, eu sei, vai soar um pouco elevado. Vai dizer-se que estamos num patamar muito elevado“.
A taxa de IVA de 6% vai aplicar-se à construção e reabilitação de casas que tenham depois como destino uma de duas realidades: venda por um valor de até 648 mil euros ou arrendamento de até 2.300 euros por mês. Neste último caso, definiu-se assim o universo que pode beneficiar dessa redução do IVA, através da identificação de que, até esse valor, estamos perante “rendas moderadas”.
Se dificilmente uma renda dessas se pode considerar moderada para a realidade portuguesa, Montenegro explica que o objetivo foi que esta mexida fiscal para a construção beneficie o máximo de arrendatários finais, e não apenas aqueles com menores rendimentos. Por outro lado, afirmou que, em Lisboa e Porto, este tipo de valores já são praticados.
“O limite máximo de 2.300 euros é um limite que, basicamente, se aplica a estas áreas de maior pressão. A área metropolitana de Lisboa, do Porto e alguns outros concelhos que estão identificados com preços médios que andam perto, às vezes mesmo com a prática de montantes de arrendamento superiores a este”, defendeu.
“Eu quero explicar o que é que está por base desta decisão. Está por base desta decisão, portanto, ter a aplicação deste regime fiscal a todo o edificado para arrendamento, globalmente, na grande maioria do país, tudo o que está no mercado de arrendamento, ou que pode vir a estar no mercado de arrendamento. E em Lisboa e no Porto, mais uma vez, e nos concelhos de maior pressão, à volta nomeadamente destas duas metrópoles, estamos a falar de um teto que dá à classe média, às famílias com alguma capacidade económica, uma nova possibilidade de oferta para poderem precisamente fixar-se e poderem constituir os recursos humanos que a nossa administração pública e as nossas empresas precisam para serem competitivas”, acrescentou.
![]()
"Eu sei que, para um cidadão de Bragança ou de Freixo de Espada à Cinta, uma renda de 2.300 euros é uma fortuna. E é. Mas uma família com dois ou três filhos em Lisboa e no Porto, muitas vezes não consegue ter uma habitação a um preço inferior a este”
Perante a disparidade de valores praticados em Portugal, o primeiro-ministro admitiu que os valores possam chocar pessoas de outras zonas. “Eu sei que, para um cidadão de Bragança ou de Freixo de Espada à Cinta, uma renda de 2.300 euros é uma fortuna. E é. Mas uma família com dois ou três filhos em Lisboa e no Porto, muitas vezes não consegue ter uma habitação a um preço inferior a este. Este é um projeto ambicioso, mas é um projeto para todos. É um projeto, por isso, inclusivo. Não deixa ninguém de fora, a não ser aqueles que têm, de facto, um nível de rendimento muito superior e que, portanto, podem pagar rendas também mais elevadas do que este patamar”.
Pinto Luz explica a fórmula para chegar aos 2.300 euros
Depois de Luís Montenegro, o ministro das Infraestruturas e Habitação veio dar alguns pormenores, por exemplo falando do alívio fiscal para os senhorios que pratiquem rendas “até 2.300 euros, o tal valor de renda moderada que o Sr. primeiro-ministro referiu há pouco”.
E seguiu-se a explicação de como o Governo chegou a esse valor. “A OCDE, a União Europeia e todas as entidades internacionais e nacionais que se debruçam sobre o tema da habitação apontam para uma taxa de esforço máxima admissível de 40% [percentagem do rendimento mensal que vai para habitação]. Nós temos que apontar para aí. A nossa classe média tem que apontar para aí, nós temos que apontar para esse esforço”, sublinhou.
“E por isso os 2.300 euros, nomeadamente nas zonas de maior pressão, apontam para um rendimento do agregado familiar na casa dos 5.000 euros para um agregado familiar de um pai, de uma mãe, dois filhos. E portanto é para esse target que nós também temos que direcionar as políticas públicas e daí esta aposta nesta renda moderada até aos 2.300 euros”.
A OCDE, a União Europeia e todas as entidades internacionais e nacionais que se debruçam sobre o tema da habitação apontam para uma taxa de esforço máxima admissível de 40%. A nossa classe média tem que apontar para aí. Nós temos que apontar para esse esforço. E por isso os 2.300 euros, nomeadamente nas zonas de maior pressão, apontam para um rendimento do agregado familiar na casa dos 5.000 euros para um agregado familiar de um pai, de uma mãe, dois filhos
Ou seja, o conceito de renda moderada não é objetivo pelo valor em si, mas dinâmico consoante a realidade das famílias, as suas posses e as zonas onde habitam. Na visão do Governo, uma família que ganha mais mas que vive em Lisboa e tem muitos filhos, também deve ser beneficiada mesmo que pague uma renda muito superior à média (mas sempre abaixo dos tais 2.300 euros).
Mais tarde, num briefing com jornalistas, Pinto Luz voltou ao tema dos valores moderados. “Dir-me-ão que os 2.300 euros é uma exorbitância. O país está todo dentro desse valor, incluindo os concelhos de maior pressão. Não há rendas em Oleiros, em Vila de Rei, em Bragança ou Viseu que esteja fora. Em Lisboa, no Porto ou em Loulé não, mas este é um esforço de achatamento”.
O ministro acrescentou que “não existe uma fórmula para chegar a este valor, mas as equipas trabalharam e foram ver o que o mercado tem de stock disponível de norte a sul, avaliaram os rendimentos e as taxas de esforço”. “O rendimento médio no país são 1.500 euros, mas nós não quisemos o rendimento médio. Queremos ir mais além e até ao que entendemos ser classe média e até onde as finanças aguentam. Não podíamos abarcar todos até aos 4.000 euros”.
E exemplificou: “É para trazer a classe média: dois professores universários, dois quadros de uma empresa de tecnologia, mas também estão lá os funcionários públicos em início de carreira com 1.248 euros, os professores, os enfermeiros”.
Notícia atualizada com mais declarações do ministro das Infraestruturas
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Rendas de 2.300 euros são “moderadas”? A explicação do Governo
{{ noCommentsLabel }}