BRANDS' ECO “Há que trabalhar a nível do ensino secundário e superior”: PROFORUM alerta para a urgência de atrair jovens para a engenharia
O presidente da PROFORUM, António Martins Costa, avisa que 40% das competências nucleares vão mudar nos próximos cinco anos e defende uma estratégia conjunta para formar e reter engenheiros no país.
No ano em que celebra 30 anos, a PROFORUM coloca o talento no centro do debate sobre o futuro da engenharia em Portugal. O presidente da associação, António Martins Costa, sublinha que “há que trabalhar a nível do ensino secundário e superior no sentido da atração dos jovens para a engenharia”, alertando para o impacto da transformação tecnológica e a urgência de requalificar os profissionais do setor.
O responsável defende uma maior articulação entre escolas, universidades, empresas e Estado, para garantir que o país forma os engenheiros de que precisa e lhes oferece condições para permanecer e inovar.

A PROFORUM completa 30 anos a promover o diálogo entre engenheiros, empresas e decisores. Como vê hoje o papel da engenharia no desenvolvimento do país e que tipo de influência quer que a PROFORUM tenha na definição das políticas públicas e industriais dos próximos anos?
A Proforum é uma associação dedicada ao desenvolvimento da engenharia, agrupando empresas relevantes dos diferentes domínios desta área. Posiciona-se como um fórum de debate, discussão e formulação de propostas sobre como a engenharia pode e deve contribuir para o desenvolvimento do país. No passado, a engenharia foi fundamental para o progresso da sociedade, do qual hoje usufruímos: as grandes obras públicas, desde pontes, barragens, estradas, portos e aeroportos, até às diversas formas de construção; as fábricas, as máquinas e equipamentos, ou os veículos de transporte aéreo, marítimo e terrestre; os sistemas energéticos, a eletricidade e a eletrónica; a exploração mineira ou os produtos químicos; apenas para citar alguns exemplos. Hoje, a engenharia continua não só a avançar nesses domínios, mas igualmente a abraçar novas áreas baseadas na revolução que está a ser introduzida com as novas tecnologias digitais, em particular com a Inteligência Artificial.
A Proforum pretende continuar a ser um organismo ativo a ajudar os decisores a encontrarem as melhores soluções para o país, em articulação com outras instituições que têm a engenharia na sua base, como a Ordem dos Engenheiros ou as Associações sectoriais. Continuaremos, assim, a refletir e a apresentar, de uma forma estruturada e construtiva, as propostas que entendemos ser as mais adequadas para Portugal.
40% das competências nucleares vão mudar nos próximos cinco anos, o que irá obrigar à requalificação de metade dos colaboradores nos diversos setores. Perante esta realidade, há que trabalhar a nível do ensino secundário e superior no sentido da atração dos jovens para a engenharia, bem como para lhes fornecer as ferramentas mais adequadas para poderem acompanhar os desafios do futuro
Um dos temas do congresso do 30º aniversário da PROFORUM foi a gestão de talento na engenharia, com um estudo conjunto com a Accenture. Que sinais preocupantes, ou promissores, este estudo revela sobre a atratividade das carreiras de engenharia em Portugal? E que medidas defende para reter e valorizar os engenheiros no país?
Trata-se de um tema da maior pertinência e relevância, tanto que, segundo o estudo Talent – Point of View, desenvolvido pela PROFORUM e pela Accenture, 40% das competências nucleares vão mudar nos próximos cinco anos, o que irá obrigar, naturalmente, à requalificação (upskilling e reskilling) de metade dos colaboradores nos diversos setores. Perante esta realidade, há que trabalhar a nível do ensino secundário e superior no sentido da atração dos jovens para a engenharia, bem como para lhes fornecer as ferramentas mais adequadas para poderem acompanhar os desafios do futuro. Ao mesmo tempo, as empresas têm de aperfeiçoar os seus sistemas de atratividade e de retenção dos engenheiros. Se a compensação monetária é sem dúvida importante, também o são a fiscalidade que sobre ela incide, os chamados fringe benefits que as empresas oferecem (como, por exemplo, sistemas de saúde ou planos de pensões complementares) e as perspetivas de carreira. E, cada vez mais relevante, é o propósito do negócio da empresa, o ambiente de trabalho, a cultura organizacional e o incentivo à inovação. É uma matéria que exige um trabalho conjunto entre as empresas, as universidades e o Estado.
A PROFORUM colocou a inteligência artificial nas empresas como um dos temas de debate. Como é que a engenharia portuguesa pode tirar partido desta transformação tecnológica sem perder o controlo sobre a dimensão ética e humana da decisão?
A IA é hoje incontornável. Não só na área específica da digitalização, mas transversalmente a todas as outras vertentes da engenharia: na sensorização, na automação, na manutenção produtiva, na robótica, nos workflows de processos, na simulação de cenários e de tomada de decisão, nas ferramentas de análise e tratamento de dados em geral. De acordo com o estudo Talent – Point of View, através de ferramentas como o GPT-4, a IA poderá transformar até 40% das horas de trabalho, exigindo novas competências. É, pois, essencial que haja uma aprendizagem do seu potencial e riscos nos diferentes graus do ciclo de aprendizagem, assim como no exercício da atividade profissional.
Ao mesmo tempo, é fundamental o enquadramento ético na utilização da IA: educação, formação e discussão alargada sobre os desafios que vão aparecendo com estas tecnologias, em particular nas chamadas zonas cinzentas, quanto a regulação e limites.
Não podemos continuar sem uma rede ferroviária de nível moderno europeu (passageiros e mercadorias), ou sem um aeroporto de nível internacional, como o de Lisboa, atualmente num estado que prejudica a imagem do país
O painel sobre Inovação, Sustentabilidade e Competitividade juntou figuras da indústria e da academia. Acredita que Portugal está preparado para liderar uma reindustrialização verde? Que papel cabe aos engenheiros nesse processo?
Portugal tem sido apontado como um exemplo na transição energética, cujos objetivos se mantêm, embora o ritmo e a forma de os atingir estejam sujeitos a revisões em função das circunstâncias próprias de cada momento e região. É sabido que liderar pode ter um custo relevante, em particular para países cuja economia têm uma dimensão média, como Portugal. No entanto, andar próximo do topo, beneficiando do know-how já detido e podendo evitar os erros de quem vai a liderar, é sem dúvida uma posição adequada para o nosso país. E muitos engenheiros portugueses desta área já têm experiência internacional e são líderes nalgumas dessas operações.
O congresso discute também planeamento, financiamento e contratação pública. Como vê o atual modelo de investimento público em infraestruturas. Está a favorecer a inovação e a engenharia nacional, ou continua excessivamente burocrático e dependente dos grandes grupos?
O investimento público em infraestruturas é fundamental, a par do investimento privado. O sistema de Parcerias Público-Privadas é uma boa solução, desde que adequadamente equilibrado entre as duas partes. Sendo os fundos da União Europeia muito importantes para este fim, a sua agilização é crítica. O eficaz funcionamento da banca, com particular incidência no Banco Português de Fomento, a par da flexibilização dos rígidos sistemas de contratação pública, ganhando rapidez e eficácia, sem perder o controlo dos dinheiros públicos, são fatores críticos de sucesso.
Para citar dois exemplos, não podemos continuar sem uma rede ferroviária de nível moderno europeu (passageiros e mercadorias), ou sem um aeroporto de nível internacional, como o de Lisboa, atualmente num estado que prejudica a imagem do país.
O fomento de centros de especialização em torno de empresas e instituições com vocação de internacionalização do negócio, são, sem dúvida, a melhor forma de exportar projetos de engenharia e não apenas de engenheiros
Os engenheiros portugueses são cada vez mais procurados lá fora. O que falta para Portugal ser também um exportador de projetos e inovação, e não apenas de talento?
Isso confirma que temos excelentes escolas de engenharia em Portugal. Não há qualquer problema em que os engenheiros portugueses vão ter experiências no estrangeiro e enriquecer as suas visões, o seu conhecimento e dar contributos nesses destinos. É mesmo positivo que assim aconteça. O que não é apropriado é que o façam por razões económicas, que os levam a não regressar e a não dar o contributo ao nosso país, como a generalidade gostaria de fazer. De qualquer modo, para além da retenção de talento já referida, o fomento de centros de especialização em torno de empresas e instituições com vocação de internacionalização do negócio, são, sem dúvida, a melhor forma de exportar projetos de engenharia e não apenas de engenheiros. Para isso são fundamentais as vontades das empresas e a participação ativa das entidades essenciais para catalisar essas intenções, como as financiadoras, as promotoras da imagem do país, dos centros de inovação, ou das universidades.
As gerações mais experientes deverão ter o estímulo e os meios adequados para atualizar e absorver os novos métodos de raciocinar e trabalhar que as novas tecnologias trazem
Fala-se muito em transição digital, mas será que os engenheiros portugueses estão a ocupar o espaço de liderança tecnológica que essa mudança exige?
As novas gerações estão muito sensibilizadas para este tema e são grandes utilizadoras dessas ferramentas. Há que ajudar a encaminhar esse potencial para o desenvolvimento e progresso da sociedade, aproveitando as novas formas de agir que elas transportam consigo: o caso da adaptação do gaming aos processos de construção de cenários, de simulação e decisão é um bom exemplo.
As gerações mais experientes deverão ter o estímulo e os meios adequados para atualizar e absorver os novos métodos de raciocinar e trabalhar que essas novas tecnologias trazem. Os engenheiros sempre o fizeram de uma forma exemplar, como no século passado quando passarem das réguas de cálculo, às calculadoras, aos computadores, aos PCs, até aos laptops e smartphones, num contínuo e exponencial movimento de avanço. É, no fundo, o que entusiasma um engenheiro: a vontade de descobrir, aprender e avançar, transformando.
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