Oposição à assembleia de representantes da mutualista Montepio defende cortes nos salários dos administradores

  • Lusa
  • 15 Novembro 2025

A Associação Mutualista Montepio Geral, com mais de 600 mil associados, tem em 19 de dezembro eleições para os órgãos associativos dos próximos quatro anos.

A lista da oposição à assembleia de representantes da mutualista Montepio defende cortes nos salários dos administradores, considerando que os valores se comparam erradamente com os pagos na banca, disse em entrevista o cabeça de lista, Tiago Mota Saraiva.

A Associação Mutualista Montepio Geral — com mais de 600 mil associados — tem em 19 de dezembro eleições para os órgãos associativos dos próximos quatro anos (2026-2029). Para a gestão da mutualista (mesa da assembleia geral, conselho de administração e conselho fiscal) há uma lista única (lista A), liderada por Virgílio Lima, presidente da mutualista desde 2019.

Já para a assembleia de representantes (uma espécie de parlamento onde são discutidos os temas estratégicos da mutualista, com 30 pessoas eleitas por método proporcional) foram apresentadas duas listas, a lista A, que volta a propor Vítor Melícias como primeiro nome, e a lista B, com Mota Saraiva a cabeça de lista.

Em entrevista à Lusa, Mota Saraiva considera que é desproporcionado o volume de gastos que a mutualista tem com os membros de órgãos sociais (cerca de 2,3 milhões de euros em 2024), explicando que isso acontece porque a mutualista faz comparar os salários dos gestores aos pagos na banca, quando se devia “comparar ao terceiro setor, à economia social”, ainda que o grupo Montepio seja dono do Banco Montepio.

Defendemos a compatibilização com aquilo que é o setor social, com o que são os rendimentos dos órgãos sociais de outras associações e não da banca. A Associação Mutualista não tem de se comparar à banca“, afirmou o arquiteto e professor universitário.

O candidato (que já nas eleições de 2021 integrou uma lista de oposição, liderada por Eugénio Rosa) afirmou que a lista B não tem já um valor de corte definido mas que quer levar esse tema à assembleia de representantes.

Um dos princípios dessa revisão salarial, acrescentou, é também a subida do salário mínimo no grupo e que o salário máximo seja uma proporção desse para que os dirigentes também tenham incentivo no aumento das remunerações mais baixas.

Questionado sobre por que razão não concorre a lista B à gestão, Mota Saraiva disse que entenderam que a administração deve concluir dossiês, como a revisão do código mutualista com o Governo, e porque querem focar-se na assembleia de representantes para levar a cabo tarefas como a revisão de estatutos, “fundamental para garantir alguma dose de democraticidade dentro da associação”.

O objetivo da lista B é eleger 16 representantes para ter a maioria dos membros do órgão associativo e poder forçar a transparência de informação e o escrutínio, disse. A lista usa como trunfo agregar como apoiantes pessoas como António Godinho e Pedro Corte Real, que no passado se candidataram em listas da oposição.

Entre os apoiantes da lista B estão figuras como Carvalho da Silva (ex-dirigente da CGTP), Helena Roseta (ex-deputada pelo PSD e pelo PS) e Marina Gonçalves (ex-ministra do PS).

Na revisão de estatutos, a lista B quer também quotas de género, considerando que os órgãos associativos são muito dominados por homens e mais velhos. “A associação mutualista tem 58% de mulheres e 48% de homens como associados. No entanto, enquanto nós nos quatro primeiros da nossa lista temos duas mulheres e dois homens, na lista de Vítor Melícias a primeira mulher está em oitavo lugar [Guta Moura Guedes]“, disse.

Quanto às notícias de que Tomás Correia (ex-presidente do Montepio) é acusado dos crimes de abuso de confiança e branqueamento de capitais e questionado sobre se a gestão devia fazer inspeções a atos de gestão passados, Mota Saraiva foi cauteloso e disse que tem havido um caminho de valorização do grupo e saneamento apesar do legado problemático. “Eu não defendo só que se limpe [o grupo] das pessoas que têm um passado relacionado com Tomás Correia mas temos de limpar os estragos do que foi esta ideia ultramercantilizada da associação“, afirmou.

Tiago Mota Saraiva também foi crítico para com Vítor Melícias, por enquanto presidente da mesa da assembleia geral ter tido posições próximas de Tomás Correia, mas não defendeu taxativamente que Melícias deixe de ser candidato mas que seja o próprio a fazer a avaliação se tem condições para continuar. “Vítor Melícias era o braço direito nas assembleias gerais. Fazia barreira a qualquer pergunta e ridicularizava qualquer pergunta, qualquer questionamento de Tomás Correia, que falava alto e humilhava cada associado que ali fosse questionar” a sua gestão, disse.

Oposição quer que mutualista faça “muito mais” na produção de habitação

A lista de oposição à assembleia de representantes do Montepio defende que a produção de habitação seja a linha central de atuação da mutualista e que seja feito “muito mais” do que previsto, disse Mota Saraiva. “A Associação Mutualista pode intervir para a ajudar diretamente os associados e a questão da habitação é fundamental neste momento, a todos os níveis, para todas as gerações. A Associação Mutualista nos anos 30 do século passado tinha uma componente bastante expressiva de investimento na habitação para os associados. Neste momento é pouco expressiva — é óbvio que já houve pressão nossa, Virgílio Lima já apareceu com um programa sobre essa matéria — e pode ser feito muito mais”, disse o líder da lista B, Tiago Mota Saraiva, em entrevista à Lusa.

Segundo o arquiteto e professor universitário, a atual administração fez recentemente propostas na área da habitação e já foram aprovadas na Assembleia de Representantes, mas considerou que tem de ser feito mais. Além do impacto nos associados, a lista B considera que a dimensão do grupo Montepio fará com que essas medidas tenham impacto, face à crise de habitação.

Segundo Mota Saraiva, a mutualista tem atuado na habitação sobretudo através de financiamento de crédito (através do Banco Montepio) e de fundos de investimento e tem de ser sobretudo produtora de habitação “a rendas acessíveis para os seus associados”.

Defendeu ainda que, através do grupo, crie linhas próprias de financiamento para cooperativas de habitação. Mota Saraiva considera que estes investimentos serão seguros, pois o imobiliário valoriza-se historicamente e há a garantia física do imóvel. “Durante muitos anos, sobretudo nas últimas décadas, o Montepio virou-se para uma lógica de produzir capital (…). Nós queremos dar o passo atrás e dizer assim ‘vamos ajudar os associados muito mais diretamente do que estávamos a ajudar‘”, explicou o arquiteto.

Para a lista B, a mutualista tem um “impacto estrutural na sociedade portuguesa” de que há pouca noção mesmo entre os associados. Para se ter noção da grandeza, disse, em 2024 os gastos consolidados ascenderam a 1.500 milhões de euros, superando entidades como a Câmara Municipal de Lisboa (gastos de 1.000 milhões de euros) e bem acima do Benfica (cerca de 200 milhões de euros).

A escala do Montepio é uma escala estrutural para o país. (…) Acho que a maioria dos associados não percebe a escala que a associação tem neste momento. Somos a maior associação da Península Ibérica. São os maiores mutualistas da Europa“, disse.

Mota Saraiva afirmou ainda que a lista B quer reconstruir a relação de afeto entre associados e a mutualista, que muitas vezes a usam de forma utilitarista, para ter desconto num crédito ou acesso a serviços médicos, e se envolvem pouco na associação. Isso, considerou, também se deve a estar gerida por um grupo de pessoas muito fechada sobre si mesma e em que passa pouca informação para os associados.

Além de Tiago Mota Saraiva, pela lista B, os candidatos seguintes são Francisco Alhandra Duarte (ex-diretor do banco Montepio), Marta Silva (gestora cultural, integra a assembleia de representantes atual), Ana Silva (investigadora) e Carlos Areal (reformado bancário do Montepio, integra a assembleia de representantes atual). Faz ainda parte da lista Andreia Galvão (deputada do BE).

A Associação Mutualista Montepio Geral registou lucros de 210 milhões de euros em 2024, mais 87,5% face a 2023.

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