“BCE está num dilema: ou dá atenção à inflação ou à estabilidade das finanças públicas”, diz Vítor Bento
Economista e presidente da Associação Portuguesa de Bancos diz que Governo deve usar o excesso de IVA para compensar as famílias mais afetadas pela perda de poder de compra com a subida dos preços.
O Banco Central Europeu (BCE) está perante um dilema “inusitado”: ou dá atenção à inflação, mas corre o risco de criar uma crise financeira na Zona Euro; ou dá atenção à estabilidade das finanças públicas, mas arrisca a perder instrumentos para controlar a subida dos preços.
Foi o que defendeu o economista e presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Vítor Bento, num almoço-debate organizado pela Câmara do Comércio Americana em Portugal (AmCham), considerando que o banco central liderado por Christine Lagarde “vai tentar” gerir a atual situação de elevada inflação por via de “um equilíbrio da mesma forma como os ouriços fazem amor: com muito cuidado”.
Como os outros bancos centrais mundiais, também o BCE está sob pressão para subir as taxas de juro de forma a travar o pico da inflação, que atingiu os 8,1% em maio, mas alguns responsáveis têm alertado para o impacto que o aperto monetário poderá ter na economia, podendo provocar uma recessão.
Perante o atual cenário, Vítor Bento considera que os bancos centrais estão “metidos numa camisa-de-onze-varas”, em particular o BCE, “pela multiplicidade de objetos a que se submeteu” nos últimos anos: além da estabilidade dos preços, que era o objetivo inicial, passou a ter de trabalhar também para a estabilidade financeira e a estabilidade das finanças públicas, que podem ser conflituantes entre si.
Excesso de IVA para os mais afetados
Na mesma intervenção, Vítor Bento defendeu que o Governo deve utilizar o que considerou ser “excesso de IVA” em resultado a elevada inflação para compensar as famílias mais afetadas pela perda de poder de compra.
Uma vez que Portugal deixou de ter a política monetária e da taxa cambial ao seu dispor para fazer face à aceleração dos preços, deve fazer uso da política de rendimentos, da política orçamental e da regulação e persuasão moral para que os salários e os preços “não se desviem do comportamento” da Zona Euro. Mas não deve deixar de apoiar os mais penalizados pela atual situação.
“A política orçamental deve apoiar as situações mais graves, a parte social mais afetada por este choque” e para isso “o Estado tem ao seu dispor o excesso de IVA que este choque inflacionário permite (…) para fazer essa compensação aos setores que são mais afetados pela perda de poder de compra”, disse.
O presidente da APB também destacou o papel que a concertação social poderá ter no controlo dos salários, sobretudo no setor não transacionável, que é visto como “o elemento potencialmente desestabilizador” e onde se pode gerar fatores de pressão sobre a inflação.
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