O whistleblowing e as relações laborais

  • Augusto Almeida Correia
  • 30 Setembro 2022

Muito mais do que a criação de um canal de denúncias, esta Lei veio prever uma série de obrigações e ónus legais sobre as empresas, nomeadamente ao nível laboral e da privacidade/proteção de dados.

Estarão as empresas portuguesas preparadas para o cumprimento das obrigações decorrentes da famosa Lei do Whistleblowing? Como é do conhecimento geral, esta lei visa regular a proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União, relativas a matérias bem especificas, de entre as quais se destacam a contratação pública; serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo; proteção do ambiente; defesa do consumidor; proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação, bem como violação de regras de concorrência e de auxílios estatais, tendo criado uma série de obrigações e ónus para as empresas que afetam a já tão complexa relação entidade patronal/trabalhador.

A obrigação principal, e a mais badalada, é a necessidade de implementação de canais de denúncia e respetiva garantia de proteção dos denunciantes.

Tais canais de denúncias, devem assegurar, entre outros aspetos, a confidencialidade e a possibilidade das denúncias poderem ser realizadas anonimamente.

E quem é que é considerado um Denunciante? Qualquer pessoa singular que denuncie ou divulgue publicamente uma infração com fundamento em informações obtidas no âmbito da sua atividade profissional, independentemente da natureza desta atividade e do setor em que é exercida, como é o caso do trabalhador.

E que entidades estão obrigadas a ter um canal de denúncia?

  • entidades privadas com 50 ou mais trabalhadores;
  • independentemente do número de trabalhadores, as empresas abrangidas pelo âmbito de aplicação da legislação relativa a serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo, segurança dos transportes e proteção do ambiente;
  • entidades públicas que empreguem 50 ou mais trabalhadores, com exceção das autarquias locais que tenham menos de 10000 habitantes.

Além do atrás mencionado, e um ponto igualmente importante mas não tão falado, é a questão da proibição de atos retaliatórios contra o denunciante.

Nesse sentido a Lei aqui em análise veio estabelecer uma série de presunções de atos de retaliação, praticados até dois anos após a denúncia ou divulgação pública, que irão obrigar as empresas a ter um especial cuidado, nomeadamente no que aos seus trabalhadores diz respeito.

Assim, assiste-se a uma verdadeira inversão do ónus da prova, competindo às empresas ilidir tais presunções e provar que um determinado ato praticado contra um trabalhador/denunciante foi efetivamente fundamentado e justificado.

E que presunções são essas? No âmbito laboral destacamos as seguintes:

  • alterações das condições de trabalho;
  • suspensão de contrato de trabalho;
  • avaliação negativa de desempenho ou referência negativa para fins de emprego;
  • despedimento ou não renovação de um contrato de trabalho a termo;
  • a aplicação de uma sanção disciplinar.

Assim, muito mais do que a criação de um canal de denúncias, esta Lei veio prever uma série de obrigações e ónus legais sobre as empresas, nomeadamente ao nível laboral e da privacidade/proteção de dados. Nesse sentido devem as empresas reforçar e/ou implementar procedimentos mais exaustivos e documentados ao nível das suas relações com os trabalhadores, bem como proceder à implementação de medidas técnicas e organizativas rigorosas de forma a assegurarem o compliance com as temáticas da proteção de dados e confidencialidade.

  • Augusto Almeida Correia
  • Associado sénior da PRA

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