Exclusivo Estado vai refinanciar dívida ao preço mais elevado dos últimos cinco anos
Os dois leilões de dívida agendados para esta semana serão realizados com a curva de rendimentos das obrigações do Tesouro em máximos de 2017.
O Estado prepara-se para acorrer novamente ao mercado obrigacionista para financiar a dívida pública. Em comunicado, a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública – IGCP anunciou na sexta-feira que vai realizar a 14 de setembro dois leilões das linhas de obrigações do Tesouro com maturidade em julho de 2026 (OT 2,875% 21jul2026) e em julho de 2032 (OT 1,65% 16jul2032), com o intuito de angariar um valor global entre mil milhões e 1.250 milhões de euros.
Esta operação irá decorrer poucos dias depois de o Banco Central Europeu (BCE) ter anunciado um aumento histórico das taxas de juro do euro e numa altura em que a curva de rendimentos (yield curve) das obrigações do Tesouro está a alargar-se rapidamente.
Curva de rendimentos de Portugal
(Em apenas seis meses, o custo de Portugal para se financiar no mercado obrigacionista a 10 anos aumentou 170 pontos base e a 5 anos 184 pontos base)
Há um ano, a yield das obrigações do Tesouro a 10 anos era de 0,14%. Hoje está a negociar nos 2,8%, o valor mais elevado desde agosto de 2017, mas ainda distante do recorde de 13,85% registados em janeiro de 2012, quando Portugal já estava ao abrigo do programa de ajuda da Troika.
Na última sexta-feira, numa nota enviada aos seus clientes, o Banco BPI revelava que o tom relativamente hawkish do BCE fez subir as yields da dívida soberana dos países da zona euro. Porém, nem todos reagiram da mesma forma.
Desde junho que o spread entre a yield das obrigações do Tesouro a 10 anos da República portuguesa face às bunds (obrigações do Tesouro alemão a 10 anos) tem vindo a alargar-se. Atualmente é de 110 pontos base. Significa que Portugal tem de pagar 1,7 vezes mais do que a Alemanha para se financiar no mercado obrigacionista a 10 anos.
Entre os 19 países da zona euro, apenas a Grécia, Itália, Chipre, Letónia, Malta, Lituânia e Espanha apresentam hoje um spread das suas obrigações a 10 anos face às bunds maior que Portugal.
As duas emissões obrigacionistas extraordinárias que o IGCP realizará esta semana são assim uma antecipação por parte da equipa de Miguel Martin para garantir o mais cedo possível o financiamento necessário da República, antes de as taxas escalaram ainda mais, como antecipam os especialistas.
Recorde-se que a 8 de setembro, em comunicado, o BCE anunciou que “espera continuar a aumentar as taxas de juro, porque a inflação permanece demasiado elevada, sendo provável que se mantenha acima do objetivo durante um período prolongado.”
A prova de fogo do IGCP chega em outubro
As operações de 14 de setembro serão as primeiras a cargo de Miguel Martin como presidente do IGCP, depois de a 1 de setembro ter substituído Cristina Casalinho no cargo. E serão também as primeira depois da revisão em alta do rating da República por parte da agência de rating S&P, para “BBB+”.
Uma semana depois, a 21 de setembro, é a vez de testar o mercado de dívida de curto prazo, com a realização de dois leilões de bilhetes do Tesouro num montante indicativo entre 500 milhões e 750 milhões de euros por via da reabertura de uma linha a 6 meses e o lançamento de uma linha a 12 meses.
Mas, de acordo com o calendário do programa de financiamento da República para este ano, as operações de setembro são apenas uma antecâmara para o que reserva o mês seguinte.
A 17 de outubro, o Estado terá de pagar 8,4 mil milhões de euros aos investidores detentores da obrigação do Tesouro emitida há 7 anos (OT 2,20% Out 2022), que chegará à sua maturidade nesse dia. E para realizar esse pagamento, terá de voltar ao mercado de dívida com o intuito de angariar o dinheiro necessário.
A última vez que o Estado se financiou a sete anos foi a 26 agosto 2020, num leilão que terminou com a angariação de 450 milhões de euros pelo preço de 0,095%. Se hoje tivesse de fazer o refinanciamento dos 8,4 mil milhões de euros por via de uma emissão obrigacionista a sete anos teria de pagar cerca de 2,3% por ano.
Atualmente, a curva de rendimentos das obrigações de Portugal apresenta taxas acima dos 2% para emissões com maturidades a mais de 5 anos. Significa que para refinanciar a dívida que vencerá a 17 de outubro, e tendo em conta os preços de hoje, o Estado terá sempre de contar com um custo de financiamento entre 2% e 3,3%, dependendo da maturidade que opte por emitir a nova dívida.
De momento, o saldo-vivo em obrigações do Tesouro é de 164 mil milhões de euros, cerca de 72% do PIB. A próxima obrigação do Tesouro a chegar à maturidade é a linha OT 4.95% Out 2023, atualmente com um saldo-vivo de 10,6 mil milhões de euros, que terá de ser liquidada a 25 de outubro de 2023.
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