Exclusivo Bial reforça negócio no Parkinson e entra na Austrália e Israel

Farmacêutica compensa perda da patente europeia na epilepsia com medicamento para Parkinson e entrada em dois novos mercados. Investimento de 30 milhões duplica capacidade industrial na Trofa.

Depois de ter fechado 2021 com um volume de negócios consolidado de 310,1 milhões de euros, uma descida homóloga de 6% em resultado de um crescimento de 3% nas vendas, para 298,7 milhões, mas um decréscimo de 70% nos serviços prestados, neste ano “particularmente duro” de 2022, a Bial prepara-se para regressar a terreno positivo. A garantia é dada pelo presidente executivo, António Portela, que antecipa “um crescimento muito modesto” devido à perda da patente europeia do antiepilético Zebinix, que chegou ao mercado em 2009, após um investimento de 350 milhões, e foi o primeiro medicamento de raiz portuguesa.

“Nos EUA, que é outra geografia que nos interessa, ainda temos proteção da nossa patente, pelo menos, até maio de 2025. Mas na Europa perdemos larga faturação à custa disso. É um ano de transição duro. As nossas vendas do Zebinix baixaram muitíssimo em valor. Vamos ver quanto exatamente no final do ano, mas serão cerca de 40%. Levámos uma pancada grande. Temos compensado com outros medicamentos que estão a crescer, fundamentalmente com o Ongentys”, descreve ao ECO o presidente executivo da Bial. Este medicamento para a doença de Parkinson, no qual investiu 280 milhões de euros durante mais de uma década de investigação, foi lançado apenas em 2016, mas é já o segundo produto com mais peso no negócio.

Na Europa perdemos larga faturação à custa da perda da patente do Zebinix. Vamos ver exatamente quanto no final do ano, mas serão cerca de 40%. Levámos uma pancada grande. Temos compensado com outros medicamentos que estão a crescer, fundamentalmente com o Ongentys.

António Portela

CEO da Bial

Uma das geografias em que este antiparkinsoniano mais se tem afirmado é o Japão, onde há apenas dois anos não faturava um único iene. Graças à parceria firmada com um distribuidor local, o mercado japonês já representa atualmente perto de 8% da faturação global da maior empresa farmacêutica portuguesa, que emprega 900 pessoas, das quais 550 em Portugal, e assegura 75% do negócio no estrangeiro. Outros dois países que “podem vir a ter algum peso” e que vão “ajudar em termos de crescimento e de produção” são Austrália e Israel, onde assinou já este ano dois novos acordos.

António Portela adianta ao ECO que o contrato assinado na Austrália envolve o licenciamento do Ongentys a uma farmacêutica local, enquanto no país do Médio Oriente o acordo é válido para os dois medicamentos made in Portugal. “Já está tudo fechado. São mercados atrativos e que nos faltavam. Temos ido mercado a mercado, completando o puzzle mundial”, ilustra o empresário nortenho, salientando a importância da diversificação dos destinos na exportação, que já superam a meia centena. Espanha (25%) e EUA (21%) são os mais valiosos, seguidos de Alemanha, Itália, Reino Unido e França.

Em sentido contrário, no verão de 2021, a Bial acertou com a norte-americana Sunovion a aquisição, em exclusivo e durante dez anos, dos direitos de comercialização do seu medicamento para o Parkinson em toda a Europa. Na altura estimou que, até ao final da década, este novo fármaco poderá valer tanto, em termos de faturação, como o Ongentys e o Zebinix. Volvido mais de um ano, a Bial ainda está a tentar registá-lo junto das autoridades europeias. “No nosso negócio tudo demora bastante tempo [risos]. Esperamos em 2023 ter isso aprovado e depois ainda temos os preços, a comparticipação”, desabafa o gestor, que em 2011 substituiu o pai, Luís Portela, na liderança executiva da empresa fundada em 1924.

António Portela, CEO da Bial, em entrevista ao ECO - 25OUT22
António Portela, CEO da Bial, em entrevista ao ECO.Ricardo Castelo/ECO

Os dois medicamentos criados na Trofa valem já dois terços do negócio e dão argumentos para descrever a atividade de I&D, onde em 2021 gastou um valor recorde anual de 81 milhões de euros, como “absolutamente crítica para o crescimento e a expansão internacional” da companhia. Ora, o próximo candidato, trazido pela aquisição de uma biotechnos EUA, é um fármaco também para o Parkinson, mas com potencial para ser modificador da doença, em vez de “apenas” tratar dos sintomas”. Prestes a entrar na fase 2, espera em 2025 ter os resultados dos ensaios clínicos com doentes. “A partir daí vamos ver. Esta é a principal linha de investigação, onde estamos a pôr mais foco e mais investimento. Temos outras, mas não são tão relevantes nem estão tão avançadas”, completa.

Investimento industrial de 30 milhões para duas décadas

Instalada desde 1996 em S. Mamede do Coronado, no concelho da Trofa, a Bial está a terminar um investimento de 30 milhões de euros – cerca de 15% pago com apoios comunitários do Portugal 2020, a fundo perdido – que vai mais do que duplicar a capacidade de produção neste local: de 10,5 para 23 milhões de embalagens, o equivalente a 750 milhões de comprimidos por ano. E que, nas palavras de António Portela, que esta sexta-feira recebe o primeiro-ministro no renovado complexo fabril, lhe “permite abordar os próximos 10, 15, 20 anos em termos industriais”. “Agora temos de vender mais para pagar o investimento”.

Um dos destaques vai para a ampliação do principal pavilhão industrial em quase 30%, que ficou com uma área total de dez mil metros quadrados e, entre outras melhorias, passou a ter uma linha automática de embalagem em frascos (cerca de 3.000 por hora), como exigem os mercados dos EUA e do Canadá, país onde até agora era feita a produção e o enchimento dos fármacos destinados àqueles dois países. Isto é, a Bial passa agora a produzir e acondicionar a partir de Portugal a totalidade dos dois medicamentos de investigação própria, para a epilepsia e para a doença de Parkinson.

António Portela, CEO da Bial, em entrevista ao ECO - 25OUT22
Campus da Bial em S. Mamede do Coronado, no concelho da TrofaRicardo Castelo/ECO

Outra grande parcela deste investimento, que também revolucionou o parque logístico e construiu um edifício social com ponte pedonal, salão de jogos e sala de leitura, foi direcionada para a nova fábrica de antibióticos, que ocupa um espaço totalmente autónomo de mais de 2.500 metros quadrados. A construção foi iniciada em maio de 2021 e está em produção desde agosto. Já produzia antibióticos (o Clavamox, o mais vendido em Portugal, e o Tricef), num total de 1,5 milhões de embalagens em blister e em frasco, e passa a ter capacidade instalada para três milhões de embalagens. Conta duplicar as vendas de antibióticos nos próximos anos, para 16 milhões de euros.

“A capacidade extra será sobretudo para podermos exportar mais porque em Portugal, onde hoje vendemos metade dos antibióticos, não estou à espera de grandes crescimentos. A nível internacional, há uma grande necessidade de antibióticos, que têm especificidades em termos de produção, de armazenagem, de prazos de validade. Gostava de encher rapidamente a fábrica. Dadas as limitações que tínhamos em termos de crescimento, não estávamos à procura de novos negócios. Com a nova fábrica estamos a começar esse processo”, resume Portela. Para justificar o cariz “estratégico” deste investimento, recorda que, logo no início da pandemia de Covid-19, uma das primeiras coisas que o Infarmed pediu à Bial foi para “reforçar de imediato os stocks de antibióticos”.

Há uma grande necessidade de antibióticos, que têm especificidades em termos de produção, de armazenagem, de prazos de validade. Gostava de encher rapidamente a nova fábrica.

António Portela

CEO da Bial

A Bial tem filiais nos principais mercados farmacêuticos europeus, como é o caso de Espanha, Alemanha, Itália, Reino Unido, Irlanda ou Suíça, nos EUA, Panamá, Costa do Marfim, Angola e Moçambique. Em termos industriais, no entanto, embora já tenha avaliado a possibilidade de ter focos de produção no estrangeiro, mantém Portugal como a base única, pelas “economias de escala, sinergias e apoios que também [tem] tido”. Outra certeza, conclui António Portela, é que vai continuar a alocar anualmente cerca de 20% da faturação para investir em I&D. Uma área liderada pelo alemão Joerg Holenz e em que emprega 170 investigadores de 15 nacionalidades diferentes.

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