Lucros dos bancos privados duplicam mas nem todos são ainda rentáveis
Caixa anuncia esta quinta o melhor resultado em 15 anos. Não é preciso esperar pelo banco público para perceber que o setor regista ano como há muito não via. Rentabilidade ainda não chegou a todos.
Não será preciso esperar pelos resultados da Caixa, que deverá anunciar esta tarde o melhor resultado em 15 anos (a avaliar pelo desempenho semestral), para se perceber que os bancos estão a ter um ano como há muito não viam. Os lucros nos primeiros nove meses do ano quase duplicaram no setor privado. Porém, nem todos estão no mesmo comprimento de onda em termos de rentabilidade.
Que o diga o BCP. A Polónia continua a ser um fardo para o banco liderado por Miguel Maya que, apesar de ter visto o lucro subir 63,4% para 97,2 milhões de euros até setembro, apresenta uma rentabilidade dos capitais próprios (ROE) de 2,5%– a mais baixa entre os grandes bancos e muito longe da fasquia dos 10% considerada referência para o setor.
Para o BCP, a baixa rentabilidade surge num contexto de alguma indefinição na estrutura acionista, perante os problemas da Fosun – que detém quase 30% – com a sua gigante dívida. O grupo chinês tem vindo a desfazer-se de ativos, mas já garantiu que vai continuar no banco.
Porque é que o ROE é um indicador relevante? Porque nos diz se é atrativo ou não para investir no banco. Um ROE baixo levanta dois problemas à primeira vista: não cobre o custo do capital e leva um investidor a procurar alternativas mais atrativas para os seus investimentos. E, num setor a precisar de capital para responder aos desafios tecnológicos e à concorrência, o BCP tem um longo caminho a percorrer para melhorar a sua atratividade no mercado e não ficar para trás, como reconheceu Miguel Maya.
Novobanco passou de prejuízos para ser o mais rentável
Fonte: Bancos; ROTE para BPI Portugal e Novobanco
Do outro lado, o banco com a rentabilidade dos capitais próprios mais elevado é o Novobanco: registou um ROTE (return on tangible equity) de 12,4% em função do lucro de 428,3 milhões de euros entre janeiro e setembro, uma subida de 177,9% em relação a 2021. Depois da longa caminhada no deserto e 3,4 mil milhões pedidos ao Fundo de Resolução, que é financiado pela banca, o Novobanco parece ter encontrado o caminho da sustentabilidade e Mark Bourke, enquanto admite rever em alta os objetivos, já pensa no futuro com um IPO.
Estes resultados não deixam de trazer alguma ironia: Miguel Maya, que tem sido um dos banqueiros mais críticos do regime de injeções no Novobanco, vê agora o banco rival a bater toda a concorrência quando o seu BCP se defronta com vários problemas para ser rentável. O polaco Millennium Bank tem sido um fardo que o grupo tem sido capaz de aguentar, muito compensado pelo negócio em Portugal – que atingiu um lucro de 295,7 milhões.
Banca lucra 4,4 milhões por dia
Em termos agregados, os quatro maiores bancos privados em Portugal tiveram lucros de 1.196,6 milhões de euros até setembro, cerca de 4,4 milhões por dia. Em relação ao ano passado, temos uma subida homóloga de 90,6%. “Não temos visto lucros caídos do céu, mas penalizações vindas do inferno”, atirou o CEO do BCP na apresentação dos resultados, apontando aos vários encargos que os bancos têm de pagar, com contribuições para os fundos de resolução, imposto extraordinário e adicional de solidariedade.
Cada banco enfrenta a sua própria realidade e há fatores extraordinários que explicam as variações. No caso do Novobanco, contabiliza os ganhos com a venda da sede em Lisboa, por cerca de 100 milhões, o que deu um impulso aos resultados. Já o Santander, há um ano, contou com um encargo extraordinário de cerca de 100 milhões com o plano de saídas e agora, sem essa despesa, viu o lucro mais do que duplicar para 385 milhões, que dá um ROE de 11,1% – melhorou 6,2 pontos percentuais face a 2021.
Já o BPI chegou a setembro com um ROTE de 7,3% na atividade em Portugal, que teve um lucro de 159 milhões. Outros 100 milhões vieram do angolano BFA e mais 25 milhões do moçambicano BCI.
Lucro da banca duplica para 1.200 milhões
Fonte: Bancos
Margem e comissões disparam
À boleia da subida dos juros do Banco Central Europeu (BCE), já era expectável que a margem financeira dos bancos engordasse. Os números até setembro mostram que as receitas com juros dispararam mais de 15% para 2.873,6 milhões de euros. Com os bancos ainda a resistirem a subir a remuneração dos depósitos, estão a ganhar mais nos juros que recebem dos empréstimos às famílias e empresas, o que ajuda a explicar este desempenho.
No BCP, o novo ciclo da política monetária está a conduzir a um aumento significativo da margem: acelerou 32,7% para 1.545,8 milhões (metade do valor conseguido pelos 4 bancos privados) muito à boleia da atividade na Polónia, onde o banco central foi mais rápido a subir as taxas de juro. O banco liderado por João Pedro Oliveira e Costa também observa um aumento de 10% na margem, totalizando os 374 milhões.
Por seu turno, a margem no Novobanco caiu 5,6% para 405,9 milhões, com o banco a ser penalizado pelo custo das emissões de dívida sénior no final do ano passado e o registo conservador dos juros para as operações TLTRO (empréstimos baratos do BCE). Também o Santander, presidido por Pedro Castro e Almeida, ainda não está a tirar partido da alta dos juros, na medida em que também está a pagar mais no mercado interbancário: a margem caiu 2% para 547,9 milhões.
BCE engorda margem
Fonte: Bancos
Contudo, a perspetiva de o BCE continuar a agravar os juros para controlar a inflação promete reforçar os ganhos dos bancos naquela que é a sua atividade principal (empréstimos e depósitos), depois de anos pressionados pelos juros negativos.
Em relação às comissões, subiram 8,2% para 1.366,4 milhões de euros. Não se deveu a uma subida do preçário, mas antes ao aumento das transações com a reabertura completa da economia, após o impacto da pandemia. Todos os bancos registaram crescimentos nesta rubrica.
Depósitos sobem mais que crédito
Apesar de os depósitos pouco renderem, os portugueses continuam a confiar o seu dinheiro aos bancos: os recursos de clientes de balanço subiram quase 6% para 187,1 mil milhões de euros no final de setembro.
O crédito aos clientes também aumentou, mas a um ritmo inferior: a carteira subiu cerca de 2% para 156,8 mil milhões de euros. Tendo em conta o atual contexto de alta dos juros e da inflação, que ameaça atirar a economia para uma recessão, os bancos já admitiram que vão apertar os critérios de concessão de empréstimos a empresas e famílias.
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