Portugal quer mecanismo ibérico para UE, mas Bruxelas lembra riscos e diferentes realidades

  • Lusa
  • 28 Fevereiro 2023

Portugal defende a criação de uma "cláusula de emergência" semelhante ao mecanismo ibérico limitador do preço do gás na eletricidade. Bruxelas lembra riscos e diferentes realidades no bloco.

Portugal defende, aquando da reforma do mercado elétrico da União Europeia (UE), a criação de uma “cláusula de emergência” semelhante ao mecanismo ibérico limitador do preço do gás na eletricidade, mas Bruxelas lembra riscos e diferentes realidades energéticas.

Numa altura em que a Comissão Europeia ultima a sua proposta legal de reforma do mercado da eletricidade para permitir melhor acesso a energias renováveis de menor custo e preços mais estáveis a longo prazo, o Governo português defendeu, numa posição submetida ao executivo comunitário em consulta pública, que “para além do funcionamento regular do mercado, há uma necessidade de enquadrar a extrema volatilidade do mercado”.

“Uma solução seria prever uma cláusula de emergência”, apontou o executivo no documento de trabalho a que a Lusa teve acesso, salientando que “a prática provou que a colocação de um limite máximo nos preços de mercado provou ser eficaz”, isto é, o mecanismo ibérico, que a seu ver tem tido “resultados muito positivos”.

“O desenvolvimento de uma cláusula de emergência compatível com o mercado da UE, desencadeada em circunstâncias excecionais e sob um processo de decisão transparente, assegura proteção contra a extrema volatilidade do mercado, sem comprometer o funcionamento adequado – e muito necessário – do mercado em tempos regulares”, insistiu Lisboa na posição submetida a Bruxelas em meados de fevereiro.

“Tal cláusula reforçaria a confiança dos intervenientes no mercado e dos consumidores”, adiantou.

Questionado pela Lusa, um alto funcionário da Comissão Europeia vincou que “a medida espanhola e portuguesa para baixar os preços da eletricidade durante a crise energética foi considerada justificada pelas circunstâncias particulares do mercado grossista de eletricidade ibérico”, dada a “limitada capacidade de interligação da Península Ibérica, a elevada exposição dos consumidores aos preços grossistas da eletricidade, bem como a elevada influência do gás na fixação dos preços” da luz.

Porém, “os Estados-membros da UE são muito diversos no que diz respeito aos seus mix energéticos, ligações e sistemas de energia”, assinalou o responsável, recordando que, numa recente análise, o executivo comunitário realçou “riscos relacionados com este tipo de medidas ao nível da UE, incluindo o de aumentar a procura de gás e aumentar a exportação de eletricidade subsidiada para países vizinhos não pertencentes à UE”, como Reino Unido ou Suíça.

Além disso, a Comissão Europeia já adotou “várias medidas que têm um impacto de facto no acoplamento dos preços do gás e da eletricidade […] como o limite de receitas infra marginal que visa lucros excessivos da produção de energia e redireciona as receitas para os utilizadores finais que são geradas quando o sinal do preço do gás cria preços elevados no mercado da eletricidade”, lembrou ainda o alto funcionário da instituição, falando num “instrumento concebido para ajudar os consumidores de energia sem criar os sinais errados sobre a procura de gás”.

Em janeiro deste ano, a Comissão Europeia lançou uma consulta pública, entretanto concluída, sobre a reforma da conceção do mercado de eletricidade da UE, que visa melhor proteger os consumidores da excessiva volatilidade dos preços, facilitar o seu acesso a energia segura proveniente de fontes limpas e tornar o mercado mais resiliente. Bruxelas deve apresentar a sua proposta sobre a matéria em meados de março.

Na atual configuração do mercado europeu, o gás determina o preço global da eletricidade quando é utilizado, uma vez que todos os produtores recebem o mesmo preço pelo mesmo produto — a eletricidade — quando este entra na rede. Na UE, tem havido consenso de que este atual modelo de fixação de preços marginais é o mais eficiente, mas a acentuada crise energética, exacerbada pela guerra da Ucrânia, tem motivado discussão.

Bruxelas em contacto com Lisboa e Madrid para prolongar o mecanismo ibérico

A Comissão Europeia está “em contacto” com autoridades espanholas e portuguesas para prolongar, após maio, o prazo de funcionamento do mecanismo ibérico que limita o preço do gás na produção de eletricidade, aguardando notificações de Portugal e Espanha.

“A Comissão está em contacto com as autoridades espanholas e portuguesas em relação ao prolongamento da medida destinada a reduzir os preços grossistas da eletricidade no mercado ibérico através da redução dos custos de produção das centrais elétricas alimentadas a combustíveis fósseis”, indica fonte oficial do executivo comunitário em resposta escrita à agência Lusa.

Questionada sobre a prorrogação, após maio deste ano, do mecanismo excecional e temporário de ajustamento dos custos de produção de energia elétrica na formação do preço de mercado da eletricidade no referencial grossista do mercado ibérico de eletricidade, a Comissão Europeia afirma à Lusa que, “em geral, cabe ao Estado-membro avaliar se uma medida específica envolve auxílios estatais”.

“Se uma medida constituir um auxílio estatal na aceção da legislação da UE, deve ser notificada pelo Estado-membro em causa à Comissão para avaliação, antes de qualquer concessão de auxílio aos beneficiários, a menos que esteja abrangida por isenções por categoria”, acrescenta a instituição.

Escusando-se a “tecer mais comentários sobre o conteúdo destes contactos, nem condicionar a sua duração ou resultado”, a fonte oficial garante que o executivo comunitário “está bem ciente das dificuldades causadas pela atual crise energética resultante do ataque injustificado da Rússia à Ucrânia”, estando por isso “disponível para avaliar urgentemente a compatibilidade das medidas de emergência neste contexto”.

Já outra fonte ligada ao processo explicou à Lusa que as autoridades espanholas e portuguesas “ainda não notificaram formalmente à Comissão a prorrogação da medida”.

Em vigor até ao final de maio próximo, este instrumento foi solicitado a Bruxelas por Portugal e Espanha devido à crise energética e à guerra da Ucrânia, que pressionou ainda mais o mercado energético na Península Ibérica, com limitada capacidade de interligação ao resto da UE.

Questionado pela Lusa, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática assinala que, após o acordo político alcançado em janeiro passado entre Lisboa e Madrid para prolongamento deste mecanismo ibérico, os dois governos “prosseguem o trabalho conjunto e com a Comissão Europeia com o objetivo de estender a vigência […] para lá do seu horizonte temporal inicial, de maio de 2023”.

“Refira-se que, entre 15 de junho de 2022 e 31 de janeiro de 2023, esta medida gerou um benefício líquido superior a 570 milhões de euros e uma redução do preço final no mercado grossista de 43,78 €/MWh”, destaca a tutela na informação enviada à Lusa, falando numa “redução de 19% no preço que ocorreria sem a aplicação da medida”.

Já fonte do Governo espanhol adianta à Lusa que não existe para já uma previsão de quando é que o pedido formal será enviado à Comissão Europeia, garantindo contudo que Portugal e Espanha o irão submeter “ao mesmo tempo”

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