Novo Banco “pode vir a afetar o défice”, diz Mourinho Félix
O secretário de Estado do Tesouro e Finanças assegura, por outro lado, que o risco de liquidação do Novo Banco está "definitivamente afastado".
O Governo espera que a venda do Novo Banco fique fechada até ao final do primeiro semestre deste ano. A indicação é dada por Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, em entrevista ao Jornal Económico (acesso pago). O governante acredita, ainda, que o risco de liquidação do banco está “definitivamente afastado”, mas admite algo que António Costa já tinha dito que não iria acontecer: as possíveis injeções futuras no Novo Banco poderão afetar o défice.
“O closing da operação de venda do Novo Banco ao Lone Star deverá ter lugar no final do primeiro semestre de 2017″, disse o secretário de Estado na entrevista.
"O atual acordo não contempla assim qualquer possibilidade de o Novo Banco vir a ser liquidado. É um cenário que está definitivamente afastado.”
Para já, o contrato de promessa de compra e venda assinado com o Lone Star, bem como o acordo de princípio alcançado com a Comissão Europeia relativamente às condições de venda do banco, faz com que estejam “preenchidos todos os requisitos que permitem afastar definitivamente a liquidação do banco”, assegura Mourinho Félix. “Esse cenário, que tinha sido afastado pelo Governo desde o início, encontra-se agora afastado também pela própria Comissão Europeia. O atual acordo não contempla, assim, qualquer possibilidade de o Novo Banco vir a ser liquidado. É um cenário que está definitivamente afastado“, sublinha.
Apesar das garantias do Governo, não é correto dizer que o risco de liquidação está afastado. Isto porque a execução do acordo alcançado com o Lone Star ainda está dependente de três condições:
- A autorização por parte do Banco Central Europeu (BCE). O regulador da banca europeia tem de aprovar o Lone Star como acionista qualificado do Novo Banco. Isso implica, de acordo com o regulamento n.º 1024 de 2013, que o BCE irá avaliar a idoneidade do Lone Star, “para garantir que não é afetada a idoneidade e a solidez financeira dos proprietários das instituições de crédito”;
- A autorização por parte da Direção Geral da Concorrência, que tem de avaliar se o negócio mantém a viabilidade do banco e não distorce a concorrência;
- E o sucesso da operação de troca de obrigações seniores, que tem como objetivo reforçar o capital do Novo Banco em 500 milhões de euros.
Nenhuma destas condições foi ainda cumprida. E, se alguma não for, o negócio não pode ser fechado. Isso não significa que o banco seja automaticamente liquidado. Significa que as autoridades portuguesas terão de entrar em novas negociações, quer com os reguladores europeus, quer com o Lone Star. Contudo, fica claro que o risco de liquidação não desapareceu. O que desapareceu foi a data de morte. Se o contrato de promessa não tivesse sido assinado até 3 de agosto de 2017, o Novo Banco seria automaticamente liquidado nessa data. Agora, deixa de haver uma data, mas não deixa de haver risco.
Ainda assim, e relativamente à operação de troca de obrigações, o secretário de Estado deixa implícito que, entre perder retorno ou ficar sem banco, os obrigacionistas vão tomar a decisão certa. As condições oferecidas, diz Mourinho Félix, “terão que ser suficientemente atrativas para que os obrigacionistas as aceitem tendo e conta, por um lado, o valor de mercado das obrigações que detêm e, por outro, as consequências que poderão decorrer da não-aceitação [da operação]”.
"Os investidores são agentes racionais e sabem bem avaliar os ativos que detêm em cada momento do tempo e valorizam seguramente uma solução que lhes permite recuperar o seu investimento, mesmo que tal implique um retorno inferior ao inicialmente esperado.”
“Os investidores são agentes racionais e sabem bem avaliar os ativos que detêm em cada momento do tempo e valorizam seguramente uma solução que lhes permite recuperar o seu investimento, mesmo que tal implique um retorno inferior ao inicialmente esperado”, acrescenta.
Défice pode ser afetado
Na entrevista ao Jornal Económico, Mourinho Félix deu ainda novos detalhes sobre o funcionamento do mecanismo de capital contingente. Este mecanismo, que é acionado caso os rácios de capital do Novo Banco caiam abaixo de 12%, é suportado pelo Fundo de Resolução, que, ao todo, poderá injetar um máximo de 3,89 mil milhões de euros para recapitalizar o Novo Banco.
O mecanismo foi criado para cobrir eventuais desvalorizações de ativos que o Lone Star considerou tóxicos e que estão avaliados em 7,8 mil milhões de euros. “Este valor altera-se no tempo de acordo com o desempenho dos ativos” e voltará a ser calculado no momento do conclusão da venda, detalha Mourinho Félix.
Caso venha a ser necessária uma injeção por parte do Fundo de Resolução, esta entidade só poderá injetar, no máximo, 850 milhões de euros por ano no capital do Novo Banco.
"Tendo em conta que se destinam a cobrir perdas de valor de ativos, [essas injeções] poderão vir a afetar o défice das Administrações Públicas, dado a natureza pública do Fundo de Resolução.”
E, ao contrário do que o Governo tem vindo a defender — que a venda do Novo Banco não terá qualquer impacto, direto ou indireto, sobre as contas públicas e sobre os contribuintes — esta possível injeção de capital poderá, afinal, afetar o défice. “Tendo em conta que se destinam a cobrir perdas de valor de ativos, [essas injeções] poderão vir a afetar o défice das Administrações Públicas, dado a natureza pública do Fundo de Resolução”, admite Mourinho Félix.
Mas ressalva: “A probabilidade de o Novo Banco afetar a saída de Portugal do Procedimento por Défice Excessivo é nula“, até porque “não existirá qualquer injeção de capital em 2107, na medida em que a primeira análise sobre o valor dos ativos ao abrigo do mecanismo de capital contingente decorrerá no quadro de apresentação das contas do Novo Banco de 2017, que serão aprovadas no final do primeiro trimestre de 2018”.
Mourinho Félix mantém também que não haverá custos para os contribuintes, ainda que possa haver impacto no défice. “As eventuais responsabilidades recairão sobre o setor bancário, na medida em que, ao longo do tempo, [é ele] o responsável pelo pagamento das contribuições ordinárias para o Fundo de Resolução e pelo pagamento da contribuição sobre o setor bancário”. Ou seja, “não serão os impostos pagos pelos contribuintes a fazer face a estas despesas“.
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