Exclusivo DCIAP avalia com “muito bom” procuradora que mandou vigiar jornalistas
Andreia Marques concorreu ao DCIAP. Na avaliação, o júri ignorou os casos decididos contra as acusações da procuradora. Diretor do DCIAP, no parecer, diz mesmo que magistrada é "de muito bom nível".
“Simplicidade, capacidade de síntese, clareza e objetividade” e “de muito bom nível”. A descrição, feita pelo atual diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Francisco Narciso, é relativa à procuradora do Ministério Público (MP), Andreia Marques, que se encontra neste momento a concurso para o departamento que investiga a mais alta e complexa criminalidade.
A mesma magistrada do MP que foi responsável pela acusação a dois jornalistas – Carlos Rodrigues Lima e Henrique Machado – pelo crime de violação de segredo de Justiça e que, nessa investigação, tomou a decisão de os vigiar. O processo acabou na absolvição dos dois jornalistas, tal como o caso dos Colégios GPS e das viagens fantasma, que envolvia o social-democrata José Silvano. Todos com acusações assinadas por esta procuradora.
Andreia Marques foi ainda alvo de um processo de averiguações por parte da PGR, Lucília Gago, por ter dado ordens à PSP para vigiar os dois jornalistas. A 6 de março de 2018, os dois jornalistas avançaram com a informação da detenção de Paulo Gonçalves, assessor jurídico da SAD do Benfica que foi detido no âmbito da investigação do processo E-Toupeira por crimes de corrupção.
Dias depois, os dois jornalistas foram alvo de um processo de violação de segredo de Justiça pela titular do inquérito, a procuradora-adjunta DIAP, Andrea Marques. Com o intuito de descobrir as fontes dos jornalistas, a 3 e abril de 2018 a procuradora ordenou que a PSP vigiasse Carlos Rodrigues Lima e Henrique Machado. Pedido esse que não foi validado por um juiz.
Durante cerca de dois meses, entre abril e junho de 2018, os dois jornalistas foram vigiados pelas autoridades que seguiram os seus movimentos, fotografando-o em frente ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal, onde os agentes registaram um cumprimento circunstancial entre o jornalista e o procurador José Ranito, que liderou a investigação do caso BES, e no Campus da Justiça, em Lisboa.
Na avaliação que o júri – composto pelo vice-PGR, Carlos Adérito Teixeira, os procuradores-gerais adjuntos Pedro Baranito e António Paes Faria e ainda a vogal do CSMP, Vânia Gonçalves – consideram que as “intervenções processuais da magistrada revelam muito bons conhecimentos, um excelente domínio da técnica jurídica exigida para este tipo de funções, capacidade de trabalho, ponderação, espírito analítico e qualidade de fundamentação e argumentação, muita clareza de exposição, tendo designadamente em conta a complexidade e volume de elementos de prova apreciados.” A magistrada ficou classificada com a terceira melhor nota (155 pontos), no grupo de 25 candidatos.
A magistrada há vários anos que trabalha no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa e faz equipa com o procurador Válter Alves. Não assina a acusação do processo E-Toupeira, mas acompanhou a investigação.
A avaliação feita pelos magistrados no decorrer do processo de concurso, começa com a sua colocação – em abril de 2009 – no DIAP de Lisboa, tendo ficado afeta à 3ª secção, onde lhe foi atribuída a direção do inquérito nos processos de burlas, contrafação ou falsificação de moeda e passagem de moeda falsa, poluição e dano contra a natureza, branqueamento de capitais e crimes fiscais. “Nesta secção teve a seu cargo a tramitação de alguns inquéritos de alguma complexidade, quer em razão da matéria, quer do seu volume, e que exigiram um acompanhamento especial”, escrevem os colegas.
Continuam com a descrição falando da sua passagem, desde 25 de Setembro de 2012, da secção especializada do DIAP de Lisboa na investigação de crimes de corrupção e afins, passando pelo processo do chamado Universo BES, para a 1ª secção do crime económico-financeiro e crime violento. E, a partir de 2018, na investigação de crimes praticados no âmbito da atividade de competição desportiva de futebol. Acabando com a nomeação de Andreia Marques, em janeiro de 2020, para o Gabinete de Cooperação Judiciária Internacional do DIAP de Lisboa, para desempenhar funções de assistência judiciária internacional.”Dirigiu e tramitou inquéritos de muito elevada complexidade. A esta experiência profissional, muito consolidada, robusta e diversificada na área da criminalidade económico-financeira, tributária, bancária, fraude, branqueamento de capitais e criminalidade conexa e ao seu percurso profissional na área da direção de inquéritos corresponde uma pontuação de 25″, escrevem os magistrados.
Mas em momento algum se referem aos casos (pelo menos os mediáticos) cuja magistrada era titular na fase de inquérito e que acabaram em absolvições, em julgamento. Fique a saber quais são.
Jornalistas vigiados por suspeita de violação de segredo de Justiça
Em fevereiro deste ano, os jornalistas Carlos Rodrigues Lima e Henrique Machado foram absolvidos do crime de violação do segredo de justiça pelo qual foram acusados por Andreia Marques, devido à divulgação de notícias sobre os casos dos “emails” do Benfica, E-toupeira e Operação Lex.
Ao absolver os jornalistas Carlos Rodrigues Lima, atualmente na revista Visão, mas que integrava a Sábado à data dos factos e Henrique Machado jornalista da TVI/CNN e que então trabalhava no Correio da Manhã, o tribunal considerou que os arguidos não tiveram “qualquer intenção de violar o segredo de justiça e que a sua intenção foi informar os leitores de acordo com a liberdade de imprensa”.
Carlos Lima estava acusado de três crimes de violação do segredo de justiça e Henrique Machado de um crime de violação do segredo de justiça. Segundo o Juízo Central Criminal de Lisboa, toda a prova testemunhal foi “perentória” no sentido de que “estas notícias não prejudicaram as investigações”, tendo juízes, procuradores e inspetores da Polícia Judiciária inquiridos corroborado esta ideia durante o julgamento.
Nesta decisão, o tribunal valorizou a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão, muito embora tenha reconhecido que estes direitos possam entrar em conflito com o segredo de justiça.
Por isso, considerou que, perante estes direitos conflituantes, cabe ao tribunal ver caso a caso e analisar se as notícias causaram prejuízo ou não à investigação, concluindo que, neste caso, os arguidos exerceram os seus direitos sem se excederem na sua responsabilidade de divulgar informações sobre investigações em curso de reconhecido interesse público.
Na apreciação deste caso, o tribunal entendeu que as declarações de Carlos Rodrigues Lima e Henrique Machado durante o julgamento foram “muito relevantes”, ao explicarem de forma “pormenorizada” as “notícias que escreveram, a investigação jornalística e o interesse público” das matérias abordadas, que envolvem a justiça e o desporto.
As presenças fantasma de José Silvano
Também em fevereiro mas do ano passado, José Silvano e Emília Cerqueira foram absolvidos pelo tribunal no caso “das presenças fantasma” no plenário da Assembleia da República. O tribunal considerou que José Silvano nunca deu indicações a Emília Cerqueira para que esta assinalasse a sua presença nas reuniões plenárias em que esteve ausente, nem terá sido essa a intenção da deputada do PSD. Apesar da acusação de Andreia Marques.
Na leitura da sentença, a juíza admitiu que Emília Cerqueira “sabia” que o acesso com as credenciais de José Silvano iria assinalar uma falsa presença do colega de bancada, mas aceitou a explicação da deputada, que alegou ter acedido aos dados do secretário-geral do PSD apenas para “consultar informação e documentos” de trabalho, um procedimento considerado “habitual. “É uma explicação plausível “, sublinhou a juíza.
Caso dos Colégios GPS
No ano passado, também os cinco arguidos do caso dos Colégios GPS foram absolvidos, tendo a juíza considerado não provada a apropriação indevida em proveito próprio de verbas do Estado, defendendo ainda que o serviço educativo foi prestado.
Em julgamento estiveram os gestores do grupo GPS António Calvete, Fernando Manuel Catarino, Agostinho dos Santos Ribeiro, Manuel Marques Madama e António Marques Madama, acusados de peculato, burla qualificada e falsificação de documentos, depois de verem cair na fase de instrução as acusações por crimes de corrupção ativa e abuso de confiança.
Segundo a acusação do Ministério Público, assinada por Andreia Marques, os arguidos ter-se-ão apropriado de mais de 30 milhões de euros dos mais de 300 milhões de euros recebidos pelos colégios para financiar contratos de associação com o Estado.
Nesta modalidade contratual as instituições de ensino privado recebem financiamento público para acolher alunos que não têm uma escola pública na sua área de residência que possam frequentar.
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