Há cinco fundos do Consolidar que têm investimento de vistos gold
O ministro da Economia disse no Parlamento que ia afastar do Consolidar investimentos com vistos gold. Bruxelas sublinha riscos de corrupção e evasão fiscal.
Há cinco fundos do Programa Consolidar, do Banco Português de Fomento, que têm investimentos de vistos gold, apesar de o Governo ter dito que ia “afastar esse tipo de situações”. As regras não o proíbem claramente, mas a Comissão Europeia alerta que este tipo de esquema acarreta riscos de corrupção e evasão fiscal.
Os fundos de investimento constituídos para a capitalização de empresas obedeciam a uma regra: 70% das verbas eram garantidas pelo Fundo de Capitalização e Resiliência (FdCR), lançado no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência, e 30% de investimento privado.
As regras destes fundos não têm requisitos explícitos sobre quem pode ou não investir nestes veículos especiais, criados no âmbito do PRR, para ajudar as empresas nacionais a aceder a financiamento. Mas, o ministro a Economia disse no Parlamento, a 12 de maio de 2022 – quando ainda nem tinham sido selecionadas as 14 capitais de risco com as quais o programa arrancou (mas que, terminado o first closing, foram reduzidas as 11) –, que o Executivo iria afastar esse tipo investimento.
Na altura a deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, perguntou a António Costa Silva se, “na componente privada dos fundos de capital de risco, o Governo” ia “aceitar fundos que sejam transferidos para Portugal ao abrigo dos vistos gold ou fundos que” estivessem “a receber esse dinheiro através de um benefício fiscal chamado Sifide?”. “Aqui não está em causa um apoio a capitais de risco, mas uma total subsídiodependência destes fundos”, criticou.
Numa curtíssima resposta, António Costa Silva disse: “Quanto aos vistos gold, e essas questões que mencionou, vamos afastar esse tipo de situações. Vamos ter em atenção o processo e focar para que seja o mais transparente possível e em benefício da economia do país, porque é isso que nos move”.
O Consolidar já está no terreno e até já investiu 43,46 milhões de euros em beneficiários finais, mais exatamente em sete empresas, e algumas das 11 capitais de risco que asseguraram condições para, até 31 de julho, realizarem a primeira subscrição com envolvimento do FdCR até aumentaram a meta de capital privado a angariar. O ECO questionou todas sobre se, nesta tranche privada, tinham investimentos de vistos gold e concluiu que cinco tinham: ActiveCap, Growth Partners Capital, Inter-Risco, Oxy Capital e 3XPGlobal.
As posições das sociedades variam entre a exclusão do recurso a este tipo de investimento e a naturalidade da sua utilização, dada a escassez de capital privado e a necessidade de atrair investimento estrangeiro e o facto de as sociedades terem de cumprir as regras de compliance e de qualidade dos investidores e anti-lavagem de dinheiro como é exigido pelos reguladores.
O ECO voltou a questionar o Ministério da Economia sobre esta questão, mas não obteve resposta. Já a Comissão Europeia optou por recordar que saudou o anúncio feito pelo Governo português, em fevereiro, de abolir os vistos gold”. “Embora, até agora, ainda não recebemos confirmação oficial de que as medidas para abolir as autorizações de residência para investimento tenham sido adotadas”, acrescentou ao ECO fonte oficial da Comissão Europeia. O fim dos vistos gold foi aprovado no Parlamento, em julho, no âmbito do Programa Mais Habitação que ainda aguarda promulgação presidencial. Até à entrada em vigor da lei são permitidos novos pedidos e depois disso, ainda será possível renovar as autorizações já concedidas.
“Os vistos gold levantam múltiplos riscos em termos de segurança, lavagem de dinheiro, evasão fiscal e corrupção, para os Estados-membros em causa e para a União como um todo”, acrescentou a mesma fonte, lembrando que a Comissão tem “consistentemente levantado as suas preocupações sérias”.
Por outro lado, numa perspetiva de ajudas de Estado, cofinanciar projetos com investimentos de vistos gold não é em si uma violação das regras de auxílio de Estado. O mesmo já não se passa quanto à elegibilidade dos fundos Consolidar para benefícios fiscais no âmbito o Sifide. Este benefício pode configurar uma ajuda de Estado e, se assim for, terá de ser comunicado à Comissão Europeia, para a necessária aprovação. A decisão de conceder ajudas de Estado a um setor ou empresa específica cabe a cada Estado-membro.
De acordo com o levantamento feito pelo ECO, apenas a HCapital candidatou o seu fundo ao Sifide. “Registámos o fundo na Agência Nacional de Inovação (ANI), e confirmaram-nos que somos elegíveis”, disse ao ECO João Arantes. “Não vamos fazer uma utilização fraudulenta, vamos investir, se for elegível então entra para o Sifide. Não vamos chamar tudo à cabeça”, explicou o partner fundador da capital de risco.
O problema colocado pela atribuição de incentivos fiscais aos investidores privados destes fundos pode estar na violação da regra de que a participação do Estado se cinge a 70% e que tem de haver um mínimo de 30% de participação privada.
O Banco de Fomento garante que as “11 sociedades gestoras cumpriram os critérios de elegibilidade e conformidade” e frisa que compete ao banco “validar todos os critérios de elegibilidade e conformidade, impostos pela regulamentação em vigor, das sociedades de capital de risco que se candidatam ao Programa Consolidar, escrutínio já realizado”.
Depois, caberá à Comissão Europeia, no âmbito dos pedidos de pagamento dos vários cheques do PRR aferir mais uma vez se todas as regras foram cumpridas.
O ECO não conseguiu contactar a Fortitude Capital até à publicação deste artigo
Nota: Após a publicação deste artigo, a ActiveCap esclareceu que não quer que o seu fundo no âmbito do Consolidar seja considerado para Sifide. João Ferreira Marques, partner fundador da sociedade, em declarações ao ECO, disse que se houvessem oportunidades poderiam tentar ver se alguns dos investimentos do fundo seriam elegíveis, numa referência à possibilidade de as empresas beneficiárias finais do fundo poderem candidatar alguns investimentos a este benefício fiscal e nunca à possibilidade de o fundo inteiro ser elegível.
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