Inapa acelera reestruturação com fecho de armazéns logísticos e despedimentos
Distribuidora de papel com sede em Sintra reestrutura operações logísticas na Alemanha, França e Portugal. Plano inclui encerramento de instalações e uma “redução sensível no número de pessoas".
Com o negócio do papel em perda acentuada na Europa e as estimativas a apontarem para que tenha desaparecido um terço deste mercado nos últimos dois anos, o CEO da Inapa avança ao ECO que o grupo decidiu “antecipar e acelerar” o processo de reestruturação das operações logísticas na Alemanha, França e Portugal, que inclui o encerramento de vários armazéns e a redução do número de trabalhadores.
Em Portugal, o número de instalações foi reduzido para metade. Além de ter saído do escritório que ocupava no centro de Lisboa e mudado a sede da holding para Sintra, onde trabalham agora 150 pessoas, a distribuidora de papel acaba de encerrar um armazém que tinha no Porto, na zona de Campanhã, concentrando em Santa Cruz do Bispo (Matosinhos) as funções logísticas e administrativas no Norte do país.
Já no mercado alemão, que representa 60% das vendas, a empresa que tem como principal acionista a holding estatal Parpública (44,89%) vai concluir ainda este ano todo o projeto de reinstalação logística, que estava calendarizado apenas para 2025. O número de localizações baixa de 14 para 11, com Frederico Lupi a explicar que “implica a centralização em quatro armazéns principais, que passam a ser o eixo da distribuição” nas três áreas de negócio: papel, embalagem e comunicação visual.
Este plano para “reduzir o footprint e (…) procurar flexibilidade para garantir que [consegue] reagir às novas realidades do mercado no lado dos custos”, acrescenta o gestor, implica a saída de dezenas de trabalhadores do grupo, que emprega atualmente 1.400 pessoas. Perto de 200 estão em Portugal, incluindo uma equipa de 80 nos serviços partilhados de tecnologias de informação (IT), contabilidade ou jurídicos. Mas é na Inapa Deutschland, que tem agora cerca de 800 funcionários, menos uma centena do que há um ano, que mais está a dispensar.
“Há, de facto, uma redução sensível no número de pessoas. Toda a operação logística está a ser repensada e, obviamente, isso leva a uma diminuição do efetivo”, indica o CEO. Uma reestruturação que já fechou em França, o segundo maior mercado e que no ano passado foi “a operação com mais resultados do grupo”. No papel, tal como no packaging — concentrou a sede e instalações numa infraestrutura em Dourdan –, ficou apenas com dois armazéns centrais nos arredores de Paris, que servem todo o país.
Há, de facto, uma redução sensível no número de pessoas. Toda a operação logística está a ser repensada e, obviamente, isso leva a uma diminuição do efetivo.
Presente em oito países com instalações e equipas locais – Portugal, Espanha, França, Bélgica, Luxemburgo, Alemanha, Turquia e Angola – e vendas regulares também nos Países Baixos e na Áustria, através da empresa alemã, o grupo faturou perto de 1.200 milhões de euros em 2022. Alemanha e França representam 85% e Portugal vale cerca de 5%. Na distribuição de papel, metade da faturação vem do segmento office (escritório) e a outra do segmento gráfico, que inclui a publicidade e a edição de jornais e revistas.
Sem adiantar os valores concretos, que o grupo fundado em 1965 e cotado na Bolsa de Lisboa desde 1980 irá reportar à CMVM nas próximas semanas, Frederico Lupi refere que depois um primeiro semestre de 2023 “difícil” e em que caiu menos que o mercado (-15% vs. -28%), tendo baixado os custos na ordem dos 12% neste período, na segunda metade do ano a Inapa teve um “comportamento mais em menos em linha com o mercado”, que terá caído à volta de 25%.
“Numa primeira fase todos nos concentrámos no efeito de destocking, ou seja, toda a cadeia de valor a libertar-se dos stocks em excesso que tinha acumulado no ano de 2022. Terá sido verdade em boa parte do ano de 2023, mas escondeu também uma quebra estrutural bastante significativa do mercado, que agora se revela”, aponta o gestor, que em junho de 2023 foi cooptado para CEO da holding, após a saída de Diogo Rezende. A expectativa para 2024 é, na melhor das hipóteses, de um “aumento muito moderado da procura”.
Das compras em França ao corte na dívida “histórica”
A par da melhoria da eficiência operacional na atividade core da distribuição de papel, o plano estratégico em vigor até 2024 previa a expansão dos outros dois negócios, por via de aquisições. Nos últimos anos, comprou a empresa francesa de embalagens Embaltec e ficou com a carteira de clientes de uma empresa que fechou; e adquiriu a JJ Loos, uma empresa especializada na comercialização de equipamento de impressão e consumíveis para comunicação visual (Viscom) em França.
Questionado sobre outras oportunidades deste género, o CEO indica que “é um esforço que nunca acaba” e que está “sempre a analisar possíveis alvos e opções”. “Elas têm de ter um fit com a nossa lógica de mercados e também um fit financeiro que nos permita encaixar. Não houve nenhuma oportunidade que se materializasse em 2023, mas é um dos pontos do nosso plano estratégico que está ainda válido em 2024, que previa um crescimento nestas duas áreas”, detalhou.
Outra das metas traçadas no plano estratégico passava pela redução da dívida numa empresa que “tem historicamente níveis de endividamento muito altos”, que já andaram na ordem dos 600 milhões de euros. “Todos os triénios está lá o objetivo de trazer a dívida para níveis sustentados. Estava nos 377 milhões de euros em 2019 [antes da pandemia] e no final de 2022 tínhamos 221 milhões. Só isso nos dá a capacidade de funcionar e de trabalhar, senão estamos sempre condicionados”, frisa.
Todos os triénios está lá o objetivo de trazer a dívida para níveis sustentados. Estava nos 377 milhões em 2019 e no final de 2022 tínhamos 221 milhões. Só isso nos dá a capacidade de funcionar, senão estamos sempre condicionados.
A Inapa está na lista das próximas participações a alienar pela Parpública. Alegando que é um tema que não faz parte das suas áreas de intervenção, Frederico Lupi salienta que “não [lhe] compete conhecer ou transmitir os planos futuros dos acionistas ou potenciais acionistas”. Com 38,49% em free float, na lista das participações qualificadas consta ainda a Nova Expressão, holding de Pedro Baltazar (10,85%), e o Novobanco (6,55%).
Questionado sobre se teme ou antecipa algum tipo de instabilidade em resultado dessa operação de venda, respondeu que a sua função é “assegurar o desenvolvimento estratégico e operacional do grupo, procurando assegurar o melhor retorno para os acionistas e seu ecossistema”. “Procuramos também assegurar a transparência e consistência da informação disponível no mercado. O processo de compra e venda de ações é uma questão que não faz parte da nossa atividade corrente”, completou.
Não falta papel, mas vem aí nova subida de preços
Depois do disparo em 2022, influenciado sobretudo pelos custos da energia na sequência do início da guerra na Ucrânia, os preços do papel não desceram no mercado europeu, com os produtores locais a optarem por reduzir capacidade e readaptar a oferta à procura. E no início deste ano, os fornecedores avançaram mesmo com novos aumentos de 5% a 7%, nomeadamente no produto de escritório, com o mesmo argumento da subida dos custos da pasta de papel.
“Tipicamente, os produtores anunciam o aumento de preços, 20 e tal dias depois começa a chegar ao mercado e vemos como ele reage e se tem adesão. Estamos ainda nesse processo, mas aparentemente estão a ser aceites por toda a cadeia de valor. Os aumentos de preço estão a chegar ao consumidor final”, descreve Frederico Lupi. Sobre a possibilidade de novos aumentos intercalares durante este ano, com aconteceu em 2022, diz que “a expectativa não é essa, de todo”. “Aliás, arrancámos o ano com a ideia de que os preços iam ficar estáveis”, acrescentou.
Já no que toca ao abastecimento de papel, depois de há dois anos o então CEO ter admitido ao ECO dificuldades em “dar resposta a todas as solicitações”, chegando ao ponto de recusar encomendas maiores por falta de papel, o sucessor de Diogo Rezende garante que a Inapa, um dos líderes europeus do setor, “não tem qualquer problema”, beneficiando de uma estratégia de multisourcing e das “relações privilegiadas com praticamente todos os produtores”.
Embora reconheça que haja agora “alguma especulação” e “pressão nos preços” por causa da crise no Mar Vermelho — por via das matérias-primas provenientes da Ásia, da importação de papel de escritório da Indonésia e das restrições que já atingem o setor químico alemão — e esta questão seja “ainda um grande ponto de interrogação”, Lupi insiste que a indústria do Velho Continente tem capacidade de produção suficiente e não equaciona a possibilidade de vir a faltar papel para vender.
Mais antiga e assumida é a “ameaça da digitalização”, por via da redução do consumo de papel, evidenciando o antigo chief operating officer (COO) que “a transformação digital está aí e afeta-nos a todos”. Por outro lado, procura beneficiar nas operações, lembrando que este movimento não se limita à substituição do papel por um ecrã de computador. “Tem muito mais a ver com a Internet das Coisas ou a interligação com os fornecedores e clientes para haver esquemas diretos e informatizados de faturação e encomendas”, exemplifica o gestor.
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