Como o IGCP ajudou Medina a baixar o nível da dívida pública para valores recorde
A realização de 17 leilões de recompra de dívida em 2023 foi apenas uma das intervenções valiosas da equipa do IGCP liderada por Miguel Martín para baixar a dívida pública para 98,7% do PIB.
Por trás do “brilharete” de Fernando Medina e do Governo em colocar a dívida pública abaixo dos 100% do PIB e reduzir o stock da dívida em 2023, pela segunda vez em 50 anos de democracia, está Miguel Martín, presidente da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública – IGCP desde setembro de 2022.
Sob uma gestão bastante criteriosa da dívida, o IGCP, que está sob a tutela do ministro das Finanças, conseguiu fazer com que a República terminasse o último ano com um rácio da dívida equivalente a 98,7% do PIB, como resultado de uma redução de 9,4 mil milhões de euros do stock da dívida.
Não é por acaso que Fernando Medina, no decorrer da conferência de imprensa que deu na quinta-feira, após o Banco de Portugal comunicar os dados finais da dívida pública em 2023, deixou elogios a Miguel Martín e à sua equipa, que em 2023 completou o primeiro ano completo à frente do IGCP.
“Agradecer muito reconhecidamente ao presidente IGCP e nele a toda a equipa do IGCP pelo extraordinário trabalho que tem realizado em prol do nosso país na gestão da dívida pública que nos tem permitido a todos, ao longo dos anos, pagar menos juros, reduzir os encargos e ter maior capacidade de aplicar os recursos a servir os portugueses”, disse o ministro das Finanças.
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Na base da receita do feito alcançado em 2023 estão, essencialmente, quatro ingredientes:
- Liquidação de uma obrigação do Tesouro que tinha sido emitida em junho de 2008, que apresentava um saldo-vivo de 9,4 mil milhões de euros e cujo capital foi angariado pelo Estado sem a necessidade de emitir nova dívida. Essa operação foi realizada a 25 de outubro, levando a que somente nesse mês houvesse uma redução imediata da dívida pública em cerca de 9,5 mil milhões de euros, essencialmente por conta desta operação.
- O ano passado contou com muito poucos leilões de dívida de médio e longo prazo. Segundo dados do IGCP, foram realizados apenas sete leilões de obrigações do Tesouro em 2023 que permitiram ao Estado financiar-se em cerca de 3,7 mil milhões de euros. Nos cinco anos anteriores, o IGCP realizou, em média, 14 leilões de obrigações do Tesouro que geraram cerca de 8,4 mil milhões de euros em financiamento por ano.
- Realização de várias operações de recompra de dívida ao longo de todo o ano. Só em leilões de recompra de dívida, o IGCP realizou 17 operações que permitiram ao Tesouro retirar do mercado mais de cinco mil milhões de euros em dívida antes desta vencer. No entanto, algumas destas operações foram acompanhadas por operações de venda (6 leilões) que aumentaram a dívida em cerca de 2,4 mil milhões de euros. Em termos líquidos, as operações de recompra/venda produziram uma redução da dívida em 2,6 mil milhões de euros.
- Amortização parcial do empréstimo ao Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira (MEEF). Segundo o boletim de dezembro do IGCP, o Estado reembolsou em novembro 1,5 mil milhões de euros dos 22,3 mil milhões euros que pediu emprestado ao MEEF, no âmbito do resgate da troika em 2011.
Nas contas da República, o efeito destas operações, a que se junta ainda uma “fatura” de cerca de 2,35 mil milhões de euros de Bilhetes do Tesouro que foram emitidos em 2023 através de cinco leilões de dívida de curto prazo e que só vencem em 2024; e a liquidação de 7,75 mil milhões de euros de Bilhetes do Tesouro que constavam nas contas do Tesouro em dezembro de 2022 com vencimento em 2023, traduz-se numa redução do stock da dívida em cerca de 15,3 mil milhões de euros.
No entanto, a este montante é preciso ainda acrescentar 1,6 mil milhões em outros empréstimos pagos pelo Estado em 2023 e, sobretudo, deduzir cerca 8,9 mil milhões de euros de numerário e depósitos, segundo dados do Banco de Portugal.
Ao nível do rácio da dívida pública face ao PIB, que baixou de 113,9% em 2022 para 98,7% em 2023, grande parte deste contributo veio da concretização de um significativo excedente do saldo primário das Administrações Públicas (excluindo o peso dos juros), do efeito da inflação e do crescimento nominal do PIB.
Atendendo que o PIB tenha registado um crescimento real de 2,3% em 2023, segundo a estimativa rápida do Instituto Nacional de Estatística publicada esta semana, ficando acima do projetado pelo Governo (2,2%), e que o deflator do PIB tenha atingido os 6,9%, segundo previsões do Ministério das Finanças, significa que, em termos nominais, segundo contas do ECO, o PIB tenha crescido 9,4% em 2023, depois de em 2022 ter expandido 12,2%.
Contributos para a redução da dívida
Mas se os números alcançados pelo Governo na gestão da dívida pública em 2023 já são por si bastante relevantes, é ainda mais extraordinário a mudança da trajetória da estratégia definida pelo Governo ao longo do ano.
Segundo as previsões do Programa de Estabilidade 2023-2027 (PE 23-27), que foi apresentado em abril e que assentava numa previsão de crescimento do PIB para 2023 de 2%, o stock da dívida deveria aumentar cerca de quatro mil milhões de euros no ano passado.
No entanto, como foi anunciado na quinta-feira pelo Banco de Portugal e depois por Fernando Medina, a dívida pública baixou 9,4 mil milhões de euros, com um crescimento do PIB de 2,3%, não muito longe das previsões avançadas no Programa de Estabilidade 2023-27.
Esta mudança deve-se a uma profunda diferença entre as previsões do Governo no início do ano e o que acabou realmente por acontecer. Isso é imediatamente visível por um excedente orçamental das Administrações Públicas de 7,3 mil milhões de euros no final do ano passado, segundo a Síntese da Execução Orçamental de dezembro da Direção-Geral do Orçamento, quando inicialmente o Governo tinha orçamentado no Orçamento de Estado para 2023 (OE 23) um défice orçamental de 3,2 mil milhões de euros.
Grande parte da redução da dívida pública em 2023 terá assim de ser explicada pelas disponibilidades de tesouraria dos Serviços e Fundos Autónomos, das Administrações Local e Regional e da Segurança Social, que encerrou 2023 com um excedente orçamental de 5,5 mil milhões de euros.
Segundo as contas da execução orçamental de dezembro, o saldo orçamental ficou assim em 10,5 mil milhões de euros acima do que estava previsto na proposta do Orçamento do Estado inicial, muito por conta de uma receita fiscal 9,3% superior ao inicialmente orçamentado e também ao congelamento de investimentos inscritos no OE 23, que ficaram 26% abaixo do inicialmente contabilizado.
No entanto, a amortização dos 9,4 mil milhões de euros da dívida pública que se verificou em 2023 não é totalmente explicada pela execução orçamental da Administração Central, porque daí só surge a explicação para cerca de 2,4 mil milhões euros, o equivalente a 0,8% do PIB – estimado pelo Governo como excedente orçamental do Estado para 2023.
Os remanescentes 7 mil milhões de euros de amortização do stock da dívida tiveram como origem o uso das disponibilidades de tesouraria de outras áreas da Administração Pública que não da Administração Central porque, segundo dados do IGCP, a disponibilidade de tesouraria do Estado teve uma variação mínima na ordem dos 300 milhões de euros entre 2022 e 2023.
Grande parte da redução da dívida pública em 2023 terá assim de ser explicada pelas disponibilidades de tesouraria dos Serviços e Fundos Autónomos, das Administrações Local e Regional e da Segurança Social, que encerrou 2023 com um excedente orçamental de 5,5 mil milhões de euros por conta de um crescimento de 12,5% das contribuições e quotizações e da passagem do fundo de pensões da Caixa Geral de Depósitos no valor de 3 mil milhões de euros para a Caixa Geral de Aposentações.
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