Emergência Climática? A avaliar pelos debates, ninguém diria…

  • Inês Estrela Amorim
  • 16 Fevereiro 2024

Onde está a responsabilidade dos moderadores em questionar os nossos futuros governantes sobre o seu plano para combater a maior ameaça existencial que já conhecemos?

Como tantos portugueses, tenho acompanhado os debates para as eleições legislativas com um ouvido atento aos assuntos que mais me preocupam. Todos os dias, o meu cartão do bingo inclui: habitação, emprego e alterações climáticas. Sobre este último, tinha ouvido dizer que estávamos em “emergência climática”. Urgência é o que não tenho visto.

Já não me surpreende que a classe política se demita de assumir a emergência climática com a urgência que esta exige – os incentivos para o foco no longo prazo são escassos. Além do mais, o desenho de um projeto político de carbono zero e de restauração da biodiversidade obriga a uma série de reflexões desconfortáveis. As reivindicações de agricultores, um pouco por toda a Europa, são um exemplo de como os políticos serão cada vez mais confrontados com a tensão entre crescimento económico e a escassez de recursos naturais (ou, por outro lado, políticas ambientais para a sua preservação). Outros sintomas do fim dos crescimentos infinitos surgirão em breve.

Surpreende-me, sim, que os media continuem a não assumir o seu papel central nesta equação. E, por isso, apelo ao compromisso dos moderadores dos debates. Os meios de comunicação social têm a capacidade de influenciar o leque de assuntos discutidos na sociedade, conforme observámos durante o período pandémico, no qual cumpriram o seu papel de informar os cidadãos sobre a gravidade do surto global. E hoje, onde está a responsabilidade dos moderadores em questionar os nossos futuros governantes sobre o seu plano para combater a maior ameaça existencial que já conhecemos? Não se trata de alarmismo, mas de dar atenção aos factos e tratar a crise climática como emergência que é.

Dos políticos, exige-se ousadia no desconforto. Em altura de eleições, é absolutamente irresponsável ignorar um tema que é central a todos os outros. O calor extremo e o aumento de riscos de hospitalização devido a doenças cardiovasculares ou respiratórias, partos prematuros e mortalidade. Os refugiados climáticos e a emigração. Na economia, os danos avultados devido aos eventos climáticos extremos, diretos ou indiretos (recorde-se que a Autoeuropa, que representa 1,5% do PIB nacional, esteve em lay-off durante 6 semanas devido a cheias severas na Eslovénia). Reinventar um modelo de sociedade menos dependente do extrativismo, exige coragem política que só pode ser atingida com pressão pública nesse sentido.

Deixo um desafio aos dirigentes partidários: que tenham a audácia de propor uma transformação dos nossos sistemas de produção e consumo, que o nosso país pode e deve liderar, centrada nas oportunidades de um modelo verdadeiramente sustentável, de forma a evitarmos uma transição com desigualdades e contestação insuportáveis. Aos moderadores, deixo um repto diferente: que questionem todos os partidos sobre o seu plano de ação climática e que exijam uma resposta à altura dos avisos da ciência. Tal terá impacto na nossa sobrevivência, mas ainda antes disso, na nossa democracia.

  • Inês Estrela Amorim
  • Senior Associate - Climate Action no World Business Council for Sustainable Development (WBCSD)

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