As contas à moda do Porto: a visão de Rio para a economia
Qual é o pensamento económico do candidato à liderança do PSD? Com este mote, o ECO foi à procura das declarações de Rui Rio que dão pistas sobre o que quer para o país.
Depois de anos como o “eterno” candidato à liderança do PSD, Rui Rio apresenta esta quarta-feira a sua candidatura às diretas marcadas para dia 13 de janeiro. Em Aveiro, o ex-autarca do Porto vai dar o pontapé de partida. Formado em economia, Rio esteve 12 anos à frente da câmara portuense. Desde 2013 que não ocupa nenhum cargo público, mas continuou a dar a sua opinião sobre a economia nacional. O ECO reuniu as ideias que marcam o pensamento económico de Rui Rio.
Atualmente, Rui Rio trabalha na consultora de recursos humanos Boyden. Além disso, é membro do comité de investimento do BCP Capital. Mas agora “é hora de agir”, como se lê no seu slogan revelado pelo Expresso. Depois de ter sido deputado de 1991 a 2002 — dedicando-se maioritariamente à Comissão de Economia e Finanças — e autarca durante três mandatos, agora com 60 anos quer chegar à liderança do PSD e candidatar-se a primeiro-ministro em 2019.
Banca: Do Banif ao Novo Banco
A banca é um dos assuntos com que mais se revoltou. Rui Rio classificou de “chocante” a intervenção da União Europeia no processo de resolução do Banif por não ter em conta o interesse português. Em abril deste ano, num artigo de opinião no Diário de Notícias, o economista criticou “a falta de transparência” e o “desastroso resultado final”, arrasando a burocracia europeia.
Já no processo do Novo Banco, o agora candidato à liderança do PSD defendeu a anulação da venda do Novo Banco e uma nacionalização temporária. Num artigo de opinião no Observador, Rui Rio atacava o processo de venda ao Lone Star, referindo que as regras estiveram “em constante mutação”.
Mais uma vez, o Estado não acautelou o interesse público, argumenta. “Acima de tudo, uma palavra se impõe que seja dita perante tudo o que os portugueses têm sido obrigados a suportar no sistema financeiro: BASTA!”, rematava, não deixando também de criticar a atuação do Banco de Portugal, tendo dito até que o regulador funciona mal. Rio defendeu uma nacionalização temporária em que o Estado rentabilize o banco para, no futuro, ter o retorno de todo o capital investido.
O economista social-democrata salientou, no passado, que “não há dúvida nenhuma” que o Banco de Portugal “não esteve à altura das circunstâncias”.
"O poder político, podendo, deve interferir e influenciar as grandes questões estratégicas para o país.”
Contudo, também deixou elogios a duas pessoas: António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa por se terem unido para influenciar o setor bancário português. Em entrevista à TSF em março de 2016, o ex-autarca afirmou que “o poder político, podendo, deve interferir e influenciar as grandes questões estratégicas para o país”. Porquê? Porque o setor bancário tem um “valor estratégico muito grande”.
Regionalização e descentralização para diminuir despesa pública
Foi em maio deste ano que, num encontro de autarcas do PSD, o social-democrata voltou a insistir numa ideia antiga que defende. Em causa está a regionalização que — “se a coisa for bem feita” — pode resultar numa diminuição da despesa pública, além de aumentar a sua eficiência. “Quem deu cabo das finanças públicas deste país não foram as autarquias, foi a Administração Central”, argumentou Rio, referindo que ao estar mais perto consegue-se fazer mais com menos.
Em abril de 2016, num debate sobre o poder local promovido pelo Clube Coimbra XXI, dizia: “Não consigo descortinar nenhuma grande reforma que possa dar esse abanão no regime. A única que eu vejo é a regionalização”.
"Quem deu cabo das finanças públicas deste país não foram as autarquias, foi a Administração Central.”
No caso da Agência Europeia do Medicamento, Rio também saiu em defesa de uma candidatura fora de Lisboa, ainda que não obrigatoriamente o Porto. “Acho bem que o país seja descentralizado e que se deem oportunidades de desenvolvimento a todas as cidades e ao dizer a todas as cidades, começo pela cidade de Lisboa, porque a cidade de Lisboa, com a concentração que aqui tem, degrada a vida das próprias pessoas que vivem em Lisboa“, argumentou num almoço do International Club of Portugal.
“Mão de ferro” nas finanças públicas
Questionado sobre o primeiro Orçamento do Estado da geringonça, relativo ao ano passado, Rui Rio foi elogioso perante as reversões aplicadas por António Costa. “Concordo com todas as medidas — devolução dos salários da Função Pública, redução do IVA, eliminação da sobretaxa de IRS, melhores prestações sociais”, disse numa entrevista à RTP, mas acrescentou uma nuance: “As pessoas merecem, o problema é correr riscos demasiado grandes“. Mais tarde disse também que o Governo “conseguiu uma solidez superior” à esperada.
Ainda assim, também reconheceu que os Orçamentos de 2016 e 2017, no conjunto, tinham mais impostos. O antigo autarca defendeu que não acredita que os impostos diretos sejam socialmente mais justos do que os indiretos. “Isso é verdade até certo ponto, mas por diversas razões não se pode levar esse raciocínio até ao infinito”, explicou em entrevista ao DN. E Rio não deixou de criticar os Orçamentos por não serem virados para o objetivo de promover o crescimento económico.
No passado, disse haver um “discurso político de facilidades”, um “desprezo pela poupança” e um “desprezo pelo endividamento externo” — três fatores que tiram potencial de crescimento ao país. Além disso, Rio rejeita uma política keynesiana, dado que só seria possível num contexto diferente, onde uma dívida pública superior a 250 mil milhões de euros não existisse.
"Com o país neste estado, haver quem ainda não entende que não pode ser assim porque conduz a isto já é um problema de inteligência.”
Sobre a situação atual, numa das últimas vezes em que falou publicamente, Rio assinalou que o país vive “um momento de excesso de confiança” que pode comprometer o alcance de uma “competitividade a sério da economia”. “Otimista e responsável”, classifica, são os dois ingredientes que é necessário ter para o futuro de Portugal.
Ao mesmo tempo que criticava o Governo de Passos Coelho, Rio reconhecia, em 2013, quando abandonou a Câmara do Porto, que era “quase antipatriótico” pensar que era negativo para o país “pôr as contas direitas”. Em entrevista à SIC, o ex-autarca chegou mesmo a dizer que “com o país neste estado, haver quem ainda não entende que não pode ser assim porque conduz a isto já é um problema de inteligência”.
O ajustamento orçamental no Porto
Quando entrou para a autarquia, Rio comprometeu-se com um ajustamento das contas do Porto. Quando saiu da câmara, Rio garantiu que herdou uma dívida de 200 milhões de euros e que deixou uma dívida de 99 milhões de euros. Além disso, congratulou-se por ter um prazo médio de pagamento a fornecedores de seis dias. Mas, pelo caminho, Rio colecionou inimigos, nomeadamente na área da cultura onde fez vários cortes.
Acresce que o então presidente da Câmara do Porto garantia que as empresas municipais e as fundações não tinham dívida à banca. Rui Rio chegou a dizer que a gestão da autarquia exigiu “mão de ferro”: reduziu funcionários, criou maior disponibilidade financeira, avançou com a reabilitação urbana e recuperou os bairros sociais da cidade. Ainda assim, deixou por fazer o investimento no mercado do Bolhão e do Palácio de Cristal — algo que reconheceu numa entrevista de balanço dos três mandatos à SIC.
Imposto para a dívida? Sim, mas há nuances
Classifica a dívida pública portuguesa de “brutal”. É, por isso, preciso diminuí-la, mas acima de tudo fazer com que os portugueses saibam quanto pagam de juros por causa do endividamento do país, argumenta Rio. Por essa razão, sugeriu que se reduza algum imposto para que, em contrapartida, seja criado um imposto “consignado” ao pagamento dos juros da dívida pública.
Assim, “as pessoas passariam a perceber melhor os efeitos nocivos de um défice público”. Porém, a medida teria um efeito neutro do ponto de vista fiscal. No entanto, a sugestão foi rejeitada tanto à esquerda como à direita.
Em última instância, Rui Rio defendeu que a carga fiscal tenderia “a baixar paulatinamente” porque a transparência do novo imposto pressionaria os governos a criar excedentes orçamentais. Contudo, o próprio social-democrata identificou uma desvantagem: a possibilidade de o novo imposto “poder dar demasiada força a posturas de perfil mais populista, que reclamem, por exemplo, o não-pagamento da dívida, senão mesmo dos próprios juros”.
Já em 2014, em declarações noutra conferência, admitiu que Portugal pode ter de renegociar a dívida pública caso não haja um crescimento económico sustentável. “Se conseguirmos esse crescimento, teremos riqueza suficiente para fazer face à dívida acumulada”, afirmou, não indicando o período a que se referia. “Temos de eliminar esse défice, conseguir crescimento e ter um horizonte positivo para Portugal”, argumentou.
Empresas públicas, privatizações e nacionalizações
Comecemos pela transportadora aérea. “A TAP não pode continuar a ser um sorvedouro de dinheiros públicos”, disse Rio em entrevista à RTP3, criticando a gestão danosa que levou à acumulação de prejuízos. Além disso, Rui Rio acompanhava as críticas de Rui Moreira à centralização da operação da TAP em Lisboa, retirando da sua estratégia o aeroporto Francisco Sá Carneiro, situado na Maia.
"A TAP não pode continuar a ser um sorvedouro de dinheiros públicos.”
Foi também na privatização dos Aeroportos de Portugal (ANA) à Vinci que Rio pediu ao Governo uma indemnização à autarquia pelo investimento feito no aeroporto do Porto.
Quem teve culpa na crise?
Poder político, em primeiro lugar. Depois a banca e, por fim, a troika. São estes os culpados, disse Rui Rio, à margem de uma conferência no Porto em maio deste ano. “O poder político é aquele que tem um conjunto maior de más decisões tomadas, ou por omissões tomadas, que nos conduziram até aqui“, acusou. Já a banca foi “muito mal gerida durante muitos anos em Portugal”, onde a “dimensão dos erros foi brutal”.
Por fim, a crítica vai para o FMI, o BCE e a Comissão Europeia pela receita que impuseram ao país. “Entrou com uma altivez que nos ia ensinar tudo e que nos ia ensinar como as coisas se fazem e ia fazer as coisas direitas e não foi bem assim e os indicadores do pós-troika não merecem que nós possamos bater palmas à troika. Portanto, ela tem, nesta parte final, algum nível de responsabilidade, porque não soube encontrar as soluções mais capazes e eficazes para a economia portuguesa”, defendeu.
"[A troika] não soube encontrar as soluções mais capazes e eficazes para a economia portuguesa.”
Não é só por causa do papel na troika e na banca que Rio critica a Comissão Europeia. Também no episódio das sanções, o agora candidato à presidência do PSD criticou Bruxelas por se estar a sancionar a si própria, numa altura em que ainda não se sabia se as sanções seriam aplicadas. “Vem agora a Comissão Europeia dizer que nos aplica sanções que, em grande medida, têm origem num programa que eles aqui impuserem e elogiaram o Governo que o levou a cabo”, afirmou, em declarações numa conferência, citadas pela Lusa.
Estas são algumas pistas daquilo que poderá vir a ser um programa eleitoral de Rio. Contudo, as ideias do candidato à presidência do PSD vão para lá da economia. São polémicas as suas declarações sobre a reforma do sistema político, a justiça e até a comunicação social — por exemplo, o anúncio desta quarta-feira não terá direito a perguntas. Rio teve como bandeira o combate à corrupção e a separação entre a política, o poder económico e até o futebol, tendo aberto uma guerra com o presidente do Futebol Clube do Porto, Pinto da Costa. Falta saber que ideias serão prioritárias e que batalhas terá em mente.
(Texto publicado originalmente a 11 de outubro de 2017, quando Rui Rio anunciou a candidatura a líder do PSD)
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