Queda da moeda do FMI dá borla de mil milhões a Portugal
Governo de António Costa acelerou os reembolsos à instituição liderada por Lagarde. Desvalorização da moeda internacional do FMI pagou mil milhões de euros do empréstimo em 2017.
Nem sempre dois mais dois são quatro. E a dívida de Portugal junto do Fundo Monetário Internacional (FMI) é um bom exemplo de como a lógica dos mercados pode influenciar as contas da matemática. Senão vejamos: o Estado português devolveu dez mil milhões de euros do empréstimo do Fundo em 2017. Mas a dívida portuguesa junto deste credor caiu no ano passado mais de 11 mil milhões de euros. Pode repetir?
Sim, leu bem. No final de dezembro de 2016, Portugal devia ao FMI cerca de 17.300 milhões de euros. Entretanto, amortizou um total de 10.013 milhões de euros em várias tranches realizadas ao longo de 2017. Aparentemente, o país deveria ter chegado ao final do ano passado a dever cerca 7.300 milhões de euros à instituição. Mas não: no dia 31 de dezembro de 2017, a dívida era de pouco mais de 6.200 milhões de euros.
Portugal pagou dez mil milhões de euros ao FMI em 2017
Fonte: IGCP, Banco de Portugal e cálculos ECO
A dívida não desapareceu pura e simplesmente. Mas como se explica esta diferença de mais de mil milhões de euros?
A explicação é relativamente simples e reside na moeda internacional do FMI — os Special Drawing Rights (SDR), que em português significa Direitos Especiais de Saque. Esta moeda é calculada com base num cabaz composto pelas cinco principais divisas mundiais: dólar, euro, iene, libra e yuan, cada uma com diferentes pesos (ligação para o site FMI com conteúdo em inglês).
O que acontece é que a moeda do Fundo observou uma acentuada desvalorização face ao euro em 2017 e isso “embarateceu” o empréstimo de Portugal no FMI. No dia 31 de dezembro de 2016, cada Direito Especial de Saque valia 1,2859 euros. Um ano volvido, passou a valer apenas 1,18747 euros, traduzindo uma depreciação de 7,6%. Feitas as contas, cada SDR passou a ficar dez cêntimos de euros mais barato. Um euro passou a comprar mais SDR.
SDR está em mínimos de três anos contra o euro
Fonte: Banco de Portugal
Assim, embora a dívida portuguesa denominada em SDR não tenha registado uma queda além daquela proporcionada pelos reembolsos antecipados de 8.232 milhões de SDR (10.013 milhões de euros) em 2017 — que é a denominação que conta para efeitos de cálculo do prémio de risco agravado e ainda das missões do FMI a Lisboa — , o montante denominado em euros observou uma queda mais acentuada em função da depreciação do SDR: mais mil milhões de euros.
“A valorização do euro veio ajudar e muito qualquer dívida denominada em euros”, sublinha ao ECO o diretor de investimentos do Banco Carregosa, João Pereira Leite. “Isso justifica o ganho na amortização da dívida ao FMI”, diz ainda.
A valorização do euro veio ajudar e muito qualquer dívida denominada em euros. Isso justifica o ganho na amortização da dívida ao FMI.
O que vale um SDR?
São cinco moedas que fazem a conta do que vale um Direito Especial de Saque. E é o dólar norte-americano a divisa que mais pesa: 41,73% (ver gráfico em baixo com o peso de cada divisa). Em 2017, a nota verde caiu 12,4% face ao euro e isso ajuda a explicar em grande medida o comportamento da moeda do FMI.
Qual o peso de cada moeda no SDR
Fonte: FMI
Mas o dólar não foi a única moeda a perder terreno para a moeda comunitária no ano passado. Também o yuan chinês, o iene japonês e a libra britânica, as outras divisas que compõe o cabaz dos SDR, observaram desvalorizações substanciais contra o euro: -5,9%, -9% e -4%, respetivamente.
Em 2018, o euro continuou a fortalecer-se contra estas divisas, sobretudo depois de o Banco Central Europeu (BCE), que reúne esta quinta-feira em Frankfurt, se ter mostrado mais conservador no que toca à política monetária a seguir nos próximos tempos. Deixou um primeiro sinal de que o fim dos estímulos monetários está ao virar da esquina e a seguir virá uma agravamento da taxa de juro. No mercado cambial, há quem já tenha aposta no euro a valer 1,25 dólares. E isso vai continuar a beneficiar o perfil de crédito de Portugal junto do FMI.
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