O economista-chefe da OCDE não está preocupado com um abrandamento na Zona Euro, numa altura de expansão, mas sublinha a importância de continuar a fazer reformas, incluindo em Portugal.
No dia em que a Organização para o Comércio e Desenvolvimento Económico (OCDE) divulga as suas previsões macroeconómicas para os países do G20, o economista-chefe da OCDE e antigo ministro da Economia português, Álvaro Santos Pereira, falou ao ECO para explicar melhor a perspetiva positiva dos economistas da instituição. Portugal, afirmou, beneficia desta conjuntura positiva, mas não deve deixar de continuar a fazer reformas.
A OCDE vê a economia mundial numa luz positiva. O que motiva esta fase de expansão?
Nós estamos, de facto, bastante positivos em relação à economia mundial, com taxas de crescimento que rondam os 4%. Finalmente, estamos a sair do modo de recuperação e a entrar na expansão.
"Se as coisas continuarem a correr bem, não ficaria surpreendido se em maio revíssemos novamente em alta estas previsões.”
Isso está a acontecer por dois grandes motivos. O primeiro é que o comércio mundial, que está a crescer a taxas razoáveis, e depois principalmente, que é a grande novidade, temos o investimento a começar a aparecer com força em vários países. Na Alemanha, estamos a ter um aumento do investimento bastante interessante, noutras partes da Europa também, mas também em países como a Índia. O aumento do investimento tem um reflexo no comércio mundial.
O terceiro fator que tem estimulado e vai estimular ainda mais o comércio mundial são os estímulos fiscais nalguns países. Nos Estados Unidos estamos a falar de cerca de 1% do PIB todos os anos, e na Alemanha de cerca de 0,2% do PIB.
Para a Zona Euro, as previsões são de uma redução gradual do ritmo de crescimento. É caso para preocupações?
Eu não interpretaria isso como um abrandamento. Estamos a falar das principais economias europeias a crescer bem acima do verificado nos últimos anos.
Previsões de crescimento do PIB da OCDE em março de 2018
Dados: OCDE.
Estamos a ver França já a crescer a ritmos acima dos 2%, Itália chega aos 1,5%, que são ritmos bastante apreciáveis. E se as coisas continuarem a correr bem, não ficaria surpreendido se em maio revíssemos novamente em alta estas previsões.
Quais são os principais riscos a ter em atenção?
Estamos a assistir ao que é uma possível escalada de tensões no comércio mundial. É importante não cair na tentação de continuar as tendências protecionistas. Existem outros riscos, mas são mais positivos porque estão associados à normalização das economias mundiais — por exemplo, a nível dos mercados financeiros, os preços das ações estão um bocadinho mais altos, historicamente altos nalguns países, mas é natural que haja um pouco mais de volatilidade.
Estas tendências protecionistas são novas? E estão para ficar?
Desde 2008, mais de 1.200 medidas protecionistas foram aplicadas só nos países do G20. Temos vindo a observar um aumento gradual do protecionismo, e é isso que estamos a dizer que não queremos que aconteça, porque vai ter um impacto muito grande no comércio mundial.
Qual seria impacto de um aumento generalizado do protecionismo?
Olhando para o passado, se virmos momentos em que houve uma escalada das tensões protecionistas, foram períodos de menor crescimento.
Se há problemas a nível de excessos, por exemplo relativamente à produção do aço ou alumínio, é preciso resolver isso a nível internacional. A OCDE tem um fórum mundial para resolver a questão do excesso de aço, exatamente para estimular o diálogo, para chegarmos a uma solução. Através do diálogo, há medidas que podem ser tomadas sem recorrer ao protecionismo.
Como é que as economias que não pertencem ao G20, como Portugal, beneficiam deste clima positivo?
Obviamente que quando a economia mundial está em expansão e quando falamos, como no caso da economia portuguesa, de uma economia aberta, é possível beneficiar disso. No caso de Portugal, pode beneficiar ainda mais quando a economia europeia está a expandir a um ritmo que já não se via há algum tempo. Claro que isso tem um impacto positivo sobre a economia nacional e esperamos que continue.
No entanto, é importante lembrar que em 2005 e 2006 a economia nacional não crescia apesar do crescimento europeu. O que é que mudou? Na minha opinião, foram as reformas do mercado laboral, entre outras, que foram feitas desde então.
E Portugal deve continuar a fazer reformas neste período?
Sem dúvida nenhuma, isso vai ter que acontecer. A continuação da melhoria do clima de negócios tem de continuar, com baixas de impostos. É importante, como muitos países neste momento estão a baixar as suas taxas de impostos das empresas, que Portugal faça o mesmo.
Mas é importante também continuar a fazer reformas em duas ou três áreas. Nomeadamente, é necessário continuar a reforma da administração pública e, por outro lado, manter a sustentabilidade da Segurança Social. Penso ainda que as reformas da Justiça e da Educação são fundamentais.
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Álvaro Santos Pereira: Com a Europa a puxar pela economia, é “fundamental” continuar reformas em Portugal
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