Advocacia in-house. Conheça as heads of legal que estão a dar que falar lá fora
Heads of legal da Tabaqueira, Visabeira e Volkswagen Financial Services estão a dar cartas lá fora. Foram distinguidas pela Iberian Lawyer em compliance, corporate e melhor equipa legal.
Há quatro portugueses entre os vencedores dos Iberian Lawyer Gold Awards 2018. Para trás deixaram a advocacia de escritório, e são hoje heads of legal de grandes empresas. Há ainda outros fatores que partilham: o talento e o trabalho, que já começam a ser reconhecidos lá fora.
Os Gold Awards, atribuídos pela publicação Iberian Lawyer, distinguem todos os anos a excelência dos melhores profissionais legais ou de compliance de empresas portuguesas e espanholas. Entre os quatro portugueses distinguidos, três são mulheres: Isabel Fernandes, head of legal da Visabeira, vencedora na categoria de corporate, Alexandra Reis, head of legal da Tabaqueira, vencedora na categoria de compliance, e Patrícia Mendes, head of legal da Volkswagen Financial Services Portugal, vencedora na categoria de equipa legal do ano. Fomos conhecê-las. O quarto vencedor foi Manuel Luís Gonçalves, head of legal do grupo Casais.
À Advocatus, as três vencedoras contam como este prémio é um reconhecimento do mérito e do esforço, levado a cabo todos os dias. Para Isabel Fernandes, “trata-se inegavelmente de uma importante distinção”, uma vez que os Gold Awards valorizam “o rigor técnico” e reconhecem o profissionalismo, entre as principais equipas in-house de legal e compliance na Península Ibérica.
Para Alexandra Reis a distinção “representa um marco e reconhece o esforço de toda uma equipa”. “Nunca nos tínhamos apresentado aos Gold Awards e verificar que o nosso trabalho é reconhecido a este nível na nossa primeira candidatura foi uma agradável surpresa a confirmação do trabalho de excelência que temos desenvolvido”, conta.
Já Patrícia Mendes explica que o prémio não era, de todo, um objetivo. “Só tive conhecimento do “Gold Awards Iberian Lawyer” pouco tempo antes de encerrarem as candidaturas, e porque me foi proposto que me candidatasse”, conta.
"Nos serviços jurídicos, o head of legal de uma empresa é indissociável da própria empresa.”
É por essa razão, pelo facto de não ter trabalhado para esse objetivo em concreto, que “é ainda maior a satisfação porque foi algo inesperado e que aconteceu naturalmente”. “Estou muito feliz e orgulhosa pelo prémio e por aquilo que representa – o reconhecimento externo do meu trabalho e do trabalho da equipa que lidero, porque são também excelentes profissionais”.
O que é, afinal, ser-se head of legal?
O dia-a-dia de um head of legal passa muito pelos desafios que enfrentam, quer a nível jurídico, quer a nível de prazos. Mas o que distingue a prática da advocacia de escritório da que é praticada numa empresa? Orientação para os negócios e para os objetivos das empresas que representam, resumem as juristas portuguesas.
“Nos serviços jurídicos, o legal de uma empresa é indissociável da própria empresa”, explica Alexandra Reis. Patrícia Mendes fala num “papel ativo e participativo” que um head of legal deve ter, além da capacidade “de ouvir atentamente e estar aberto às propostas que as equipas de negócio querem desenvolver”. Para Isabel Fernandes “ser-se head of legal de uma empresa implica necessariamente ser ‘parceiro do negócio’ desenvolvido pela estrutura empresarial em que se integra”.
"Ser-se head of legal de uma empresa implica necessariamente ser ‘parceiro do negócio’ desenvolvido pela estrutura empresarial em que se integra.”
Esta visão multidisciplinar é necessária, mas pode representar um trabalho acrescido. “Também é um grande desafio focar-me em áreas do direito com as quais ainda não tenha tido contacto ou tenha um contacto menor e também garantir que temos conhecimento de todas as alterações legais”, explica Patrícia Mendes, que realça que nos últimos anos a legislação na área bancárias, financeira e do consumo tem crescido, exigindo um grande esforço para acompanhar e implementar o seu cumprimento dentro de prazos.
A gerir a equipa de “Legal and Compliance and Collections” da Volkswagen em Portugal, o dia-a-dia de Patrícia Mendes passa muito por assessorar as questões internas e lidar com advogados externos, “com quem trabalhamos em matérias que exijam o conhecimento especializado e com equipas de consultores, nomeadamente na área fiscal”, realça. Os dias são preenchidos e o stress é muito, garante.
"Um head of legal deve ter um papel ativo e participativo e capacidade de ouvir atentamente e estar aberto às propostas que as equipas de negócio querem desenvolver.”
Isabel Fernandes, trabalhando na direção jurídica do grupo Visabeira/Vista Alegre, que opera em cerca de 17 países e em diferentes setores de negócio, desde as telecomunicações, passando pela energia, construção, até ao turismo, afirma que o principal desafio para a equipa interna do departamento jurídico “decorre da diversidade das matérias e complexidade de assuntos com que a mesma é diariamente confrontada pela administração e demais colegas”.
Quanto à correria do dia-a-dia, a jurista descreve-o como “aliciante, exigente, duro e gratificante”. Tanto pelo “teor das questões colocadas, como pela quantidade e diversidade dos assuntos endereçados e as cautelas que a sua análise normalmente impõe”, responde. O facto de ser duro passa, claramente, pela “pressão colocada e o limite de tempo”, mas a partilha de conhecimentos e experiências é o resultado que faz com que tudo valha a pena, no final.
Alexandra Reis menciona que o seu maior desafio, enquanto senior counsel da Tabaqueira é mesmo gerir a equipa, de acordo com as prioridades e objetivo da empresa. “Costumo dizer que somos, para os advogados, aquilo que os médicos de medicina geral são para a classe médica: temos de ter conhecimentos técnicos abrangentes, que nos permitam identificar e dar resposta a solicitações que “mexem” com as mais variadas áreas de direito, recorrendo a especialistas sempre que se justifique”.
Tanto da área do direito societário, comercial e direito do trabalho, como do direito da concorrência, regulatório e compliance, “áreas muito presentes” no seu trabalho diário.
No dia-a-dia, a jurista conta que costuma chegar cedo ao trabalho, e começa por tentar o organizar o seu dia, mas essa preparação serve-lhe de pouco. “Praticamos uma política de porta aberta e é normal receber várias visitas por dia, que começam invariavelmente por “Tens dois minutos?”, mas nunca são dois minutos”, revela.
Apesar de se queixar, revela que também é esta dinâmica que a entusiasma e motiva. “O meu dia é, assim, variado. Posso de manhã estar a ver um tema de direito de trabalho e de tarde a pensar como é que é podemos melhorar uma determinada relação contratual, à luz do direito da concorrência”, conta.
Em que difere a advocacia interna da prática comum? Na “generalidade”
Com um background em advocacia de escritório, importa saber o que levou estas diretoras jurídicas a optar por uma carreira em advocacia in-house. Isabel Fernandes diz que é a partilha de interesses com outros players e a “visão do negócio” o que distingue um advogado interno de um advogado ou consultor jurídico externo. “A diversidade de assuntos de cariz jurídico com que somos confrontados é, também, um sinal distintivo”, revela.
Alexandra Reis conta que, embora a sua experiência em ambiente de escritório tenha sido muito curta, esta permitiu-lhe perceber que prefere, “sem dúvida”, exercício da advocacia in-house. “Gosto de fazer parte de uma organização empresarial de ter uma visão e prática abrangentes, não tendo de me focar numa área específica do direito”.
Patrícia Mendes afirma que da perceção que tem, pelo trabalho que desenvolve com escritórios de advogados, que “os advogados num escritório de média e grande dimensão podem especializar-se numa ou duas áreas do direito enquanto um advogado numa empresa tem de ser ‘generalista’ e estar apto a resolver e decidir sobre qualquer assunto de direito”, refere. Mas ainda uma outra diferença: “o facto de um advogado numa empresa ter de tomar decisões ou participar na tomada de decisão que envolva risco jurídico e decisões de negócio, não se limitando a aconselhar”, refere.
Quanto ao quarto vencedor português — Manuel Luís Gonçalves, head of legal do grupo Casais, da categoria de equipa internacional com foco em África — o jurista conta que o prémio foi para si um “marco importante”, num ano em que completa 18 anos de carreira jurídica.
"Uma grande parte do nosso trabalho concentra-se na assessoria jurídica à gestão contratual e no direito internacional, tendo em conta que atualmente o grupo exerce atividade em 13 países diferentes, desde a Europa à África, passando pela América e Médio Oriente.”
No seu dia-a-dia, aborda matérias relacionadas com o direito dos contratos, comercial e societário, direito do trabalho, imobiliário, administrativo e contratação pública. “Uma grande parte do nosso trabalho concentra-se na assessoria jurídica à gestão contratual e no direito internacional, tendo em conta que atualmente o grupo exerce atividade em 13 países diferentes, desde a Europa à África, passando pela América e Médio Oriente“, refere.
Para Manuel Luís Gonçalves um advogado in-house é “uma peça fundamental para a gestão de uma empresa” e tem de estar alinhado com a atividade do negócio da empresa. “Como se costuma dizer “quem só sabe de direito nem de direito sabe”. E, de facto, em contexto empresarial, para além de uma forte base de conhecimento jurídico, mostra-se essencial o conhecimento de outras áreas do saber, designadamente economia e gestão, por se tratarem de áreas transversais do negócio”.
O tempo que sobra é para ler, viajar e andar de bicicleta
Com uma agenda tão apertada, falta saber como as juristas gerem o seu tempo e, em particular, como aproveitam aquele que sobra para as outras coisas da vida. Estar com a família é uma prioridade. “Tenho uma filha com três anos de idade um bebé previsto nascer em janeiro. Por isso, os meus tempos livres são dedicados à família”, conta Patrícia Mendes. A jurista conta que gosta de andar de bicicleta e de esquiar, atividades que interrompeu com o nascimento da filha. “Quando sobra algum tempo, ou nas férias, gosto de descansar frente à televisão ou ler um livro”, diz.
Alexandra Reis diz que aproveita sempre para estar com a família e amigos. “Temos uma casinha no Alentejo litoral e é aí que carrego as baterias, junto ao mar ou à mesa com família e amigos. Adoro ler, mas ultimamente não o tenho feito como gostaria. Gosto muito de cinema”.
Já Isabel Fernandes diz que os poucos tempos livres que consegue “são por norma canalizados para exercício físico, leitura e, sempre que possível, programas familiares com particular preferência por viagens pelo mundo fora”, revela.
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