Disparidade diminui, mas salários de topo são o triplo dos mais baixos

O Parlamento vai voltar a discutir projetos para limitar a disparidade dentro das empresas, impondo um diferencial máximo entre a remuneração mais alta e a mais baixa.

A disparidade salarial entre os profissionais de topo das empresas e os não qualificados tem vindo a diminuir na última década, mas a um ritmo muito lento. No final de 2017, os quadros superiores ganhavam mais do triplo do que recebiam os profissionais não qualificados e, ainda, o dobro da média em Portugal. É neste contexto que o Parlamento volta a discutir duas iniciativas para limitar a disparidade salarial dentro das empresas: já esta quinta-feira, uma do PS, que quis adiar a votação desta questão para poder discuti-la com os parceiros sociais; e outra, cuja discussão ainda não está agendada, do Bloco de Esquerda, que volta a apresentar um projeto que já foi chumbado no ano passado.

Os dados, relativos aos trabalhadores por conta de outrem a tempo completo e com remuneração completa, são do Instituto Nacional de Estatística (INE) e mostram uma redução pouco significativa da disparidade salarial. Em 2007, os quadros superiores tinham um ganho médio mensal de 2.378 euros, valor quatro vezes superior ao ganho médio mensal dos profissionais não qualificados, que era então de 570 euros. Dez anos depois, os salários mais baixos aumentaram 25%, enquanto os quadros superiores ganham praticamente o mesmo.

Ainda assim, a disparidade mantém-se elevada. Os trabalhadores por conta de outrem com os salários mais elevados ganhavam, no final de 2017, uma média de 2.390 euros por mês, montante que ainda é mais do triplo do atual ganho médio mensal dos profissionais não qualificados, agora de 717 euros.

Mesmo quando a comparação é feita com o salário médio do universo total de trabalhadores por conta de outrem, os quadros superiores ganham mais do dobro do que a média. Neste caso, a disparidade salarial é hoje quase a mesma de há dez anos.

Salários dos não qualificados sobem, mas disparidade mantém-se

Fonte: INE

Os dados do INE consideram o universo total dos trabalhadores por conta de outrem, mas a disparidade é muito mais acentuada quando são analisadas apenas as grandes empresas. No PSI-20, que concentra as maiores empresas portuguesas cotadas, a remuneração atribuída aos gestores era, em 2017, quase 23 vezes superior ao salário médio anual que foi pago aos trabalhadores destas destas mesmas empresas.

Remunerações dos gestores e trabalhadores das empresas do PSI-20 em 2017.

Agravamento da TSU aproxima PS e Bloco

As duas propostas em cima da mesa, de socialistas e bloquistas, têm o mesmo propósito — definir um mecanismo que limite a disparidade salarial dentro de uma mesma empresa –, mas pesos diferentes. A do PS é um projeto de resolução, que visa apenas recomendar ao Governo que seja iniciada uma discussão em torno deste assunto. A do Bloco de Esquerda é um projeto de lei, que introduz este mecanismo de imediato, obrigando o Governo a definir leques salariais de referência. Contudo, as duas propostas estão agora mais próximas, depois de os bloquistas terem acolhido uma ideia dos socialistas relativa ao agravamento da Taxa Social Única (TSU) para as empresas que não respeitem estes leques salariais.

O projeto do PS foi apresentado ainda em setembro do ano passado e chegou a ser discutido no Parlamento, mas os socialistas acabaram por adiar a votação da iniciativa, com o argumento de que o assunto deveria ser discutido em sede de concertação social. O projeto volta agora ao Parlamento, sem alterações: os socialistas propõem recomendar ao Governo que este “estabeleça, após consultados os parceiros sociais, um mecanismo de limitação proporcional da disparidade salarial no interior de cada organização, pública ou privada, considerando para esse efeito um salário como o montante resultante de todas as prestações atribuídas em dinheiro ou espécie a um trabalhador, salvaguardando situações de exceção como a de trabalhadores a tempo parcial”.

O projeto de resolução prevê ainda as empresas privadas que não implementem essa limitação proporcional da disparidade salarial sejam penalizadas, através de mecanismos como o “agravamento da sua contribuição para a Segurança Social ou impedindo o seu acesso a subsídios e apoios públicos à criação de emprego“.

Já o Bloco, que viu o seu projeto ser chumbado no ano passado, com os votos contra do PS, PSD e CDS, apresenta agora um novo projeto que traz apenas uma alteração face ao original. Os bloquistas propõem a introdução de um “leque salarial de referência”, que imponha um “diferencial máximo entre a remuneração mais elevada e a remuneração mais baixa paga por uma mesma entidade empregadora”. Este leque salarial será imposto às empresas da Administração Pública, das autarquias locais e do setor empresarial do Estado, mas as empresas privadas também serão abrangidas pela lei, já que aquelas que desrespeitem este leque empresarial ficam privadas do direito de participar em concursos públicos, bem como de beneficiar de apoios públicos.

Nesta segunda versão que leva ao Parlamento, o Bloco vai ao encontro do PS e introduz também a penalização das empresas que não respeitem os limites à disparidade salarial por via do agravamento da TSU. A proposta prevê que tanto o leque salarial como o agravamento da TSU sejam definidos por portaria a publicar pelo Governo.

A discussão no Parlamento desta nova proposta ainda não foi agendada, mas os bloquistas acreditam que poderá ser aprovada ainda durante esta legislatura. “A nossa expectativa é que possa haver uma evolução da posição dos vários partidos e, sobretudo, que não nos fiquemos apenas por uma recomendação, mas que possa ser discutido com os parceiros sociais a concretização da medida e não a sua existência ou a sua não existência”, afirma o deputado José Soeiro ao ECO.

“Nada contra que se discuta o assunto, mas o Parlamento pode fazer um pouco mais. Pode sinalizar a importância de se tomarem medidas, ainda que não feche totalmente o detalhe de como é que elas se concretizam, e é nesse sentido que vai o nosso projeto de lei. Acreditamos que ele pode, até ao final da legislatura, vir a ser aprovado”, acrescenta.

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