“Um português na presidência do CCBE é obviamente prestigiante para a advocacia nacional”, diz José de Freitas
Fundou o escritório do Porto da Cuatrecasas e é desde janeiro o presidente do Conselho das Ordens de Advogados Europeias. José de Freitas conta como a sociedade ibérica tem sido uma grande escola.
Escolher Direito foi natural para José de Freitas, advogado há mais de trinta anos, que associa à profissão “desafio, diversidade e liberdade”, conta à Advocatus. “Com o andar do tempo associei-lhe a satisfação intelectual e o compensador sentido de missão”. E percebe-se porquê: fundou e gere o escritório da Cuatrecasas do Porto, desde 1989, e tem várias atividades lá fora, nomeadamente em organizações internacionais.
Admite, contudo, que não se sente constrangido por o país ser tão centralizado. Até porque, por outro lado, “a grande industrialização e os muitos serviços instalados na zona de influência do Porto favorecem os serviços de proximidade”, diz.
É o terceiro português que chega à presidência do Conselho das Ordens de Advogados Europeias (CCBE), o órgão que representa cerca de um milhão de advogados europeus através das Ordens de Advogados nacionais. Se pudesse dar um conselho aos mais novos seria apostar no “cultivo da seriedade e responsabilidade”, ferramenta que considera essencial para qualquer bom advogado.
CCBE lida desde 1960 com advogados de toda a Europa
Antes de chegar à presidência, José de Freitas foi vice-presidente desta organização europeia em 2016, 2017 e 2018. Tomou posse como presidente no início de 2019 e segue-se-lhe um mandato de um ano, que encara como um desafio, mas sobretudo uma honra.
“Um português na presidência do CCBE é obviamente prestigiante para a advocacia portuguesa que, assim, se vê referenciada ao mais alto nível representativo europeu”, explica à Advocatus. Sobre o trabalho deste Conselho, sediado em Bruxelas, conta como foi criado em 1960 com “o intuito de constituir um interlocutor entre o legislador europeu e a advocacia europeia, em altura de relevante discussão legislativa, designadamente, no que respeitava à regulação da livre circulação e estabelecimento dos advogados dos vários Estados-Membros dentro da União”.
Hoje em dia, esse dito papel de interlocutor mantém-se, mas também dá resposta a assuntos mais recentes. “O CCBE lida, por natureza e definição, com situações transfronteiriças, ou melhor, transeuropeias, que dizem respeito ao exercício da advocacia em todo o espaço europeu”. Nesse sentido, a experiência na Cuatrecasas, Gonçalves Pereira, ajudou-o bastante.
"O CCBE lida, por natureza e definição, com situações transfronteiriças, ou melhor, transeuropeias, que dizem respeito ao exercício da advocacia em todo o espaço europeu””
Desde as várias operações internacionais que realiza ao contacto com várias jurisdições, a sociedade ibérica “tem-me ajudado a apreender, sem estranheza, a diversidade das posições das delegações nacionais e a construir soluções de compromisso para situações conflituantes”, conta.
No Conselho toda “as decisões, posições, recomendações ou emissão de pareceres são discutidas e preparadas em comités especiais, que rondam os trinta e que são técnico políticos, tais como o comité do Brexit, o do Advogado Europeu, do Futuro da Advocacia e da sua relação com a inteligência artificial e outras novas tecnologias”, por exemplo, explica.
Existem ainda comités de direito substancial, como o comité do direito da família, o do direito europeu dos contratos, das empresas, do direito criminal e outros. E ainda existem comités ligados “à defesa dos valores fundamentais da profissão e do estado de direito, a exemplo, o comité dos direitos humanos, da deontologia e da migração”, enumera.
Tecnologia mudou o paradigma da advocacia
José de Freitas iniciou-se na advocacia em 1980. Estagiou num escritório tradicional no Porto, generalista, “com maior incidência no que hoje se chama advocacia dos negócios e das empresas” e que, nessa altura, já “se distinguia pelo uso de telex e fotocopiadora de papel térmico”, revela.
Aliás, é mesmo a tecnologia que considera o fosso entre a advocacia que se fazia e a que se faz agora.“A evolução tecnológica foi, sem dúvida, a causa das grandes diferenças entre a prática da advocacia de há quarenta anos e a de hoje”, diz. O que não se deve só à rapidez e eficiência “que proporciona aos serviços, mas sobretudo pelo acesso à informação que permitiu a advogados e clientes, diminuindo a assimetria informativa entre ambos”. A seu ver estas mudanças obrigaram o advogado a “diferenciar-se, especializar-se e a organizar-se complementarmente, para poder prestar serviços e informações de acuidade superior àquela que as tecnologias genericamente facultam”.
Seguindo o seu percurso, depois, em 1989, foi convidado por André Gonçalves Pereira “para abrir no Porto o escritório da então recém-constituída sociedade lisboeta denominada Gonçalves Pereira, Vinhas e Castelo Branco, precursora da hoje internacional Cuatrecasas, Gonçalves Pereira”, conta. E assim foi, e lá continua.
"A evolução tecnológica foi, sem dúvida, a causa das grandes diferenças entre a prática da advocacia de há 40 anos e a de hoje.”
Passados 30 anos, o advogado diz que cresceu à medida que a sociedade foi crescendo “em todos os sentidos e parâmetros, ou seja, meios humanos e técnicos, organização, formação e competências, que atraíram clientela e assuntos de crescente complexidade, grandeza e relevância”, conta. Isto tudo seria impossível de aceder “se fosse advogado de prática individual, ou de uma sociedade com estrutura de pequena ou média dimensão”.
Sobre as possíveis diferenças de mercado entre a capital e o Porto, o jurista considera “evidente que o investimento e a atividade de empresas estrangeiras tendem a aproximar-se e a procurar serviços junto dos centros de decisão”. O que, no caso de Portugal, “por cultura e conveniente inércia, estão em Lisboa”.
Aqui também estando centradas as competências governativas e regulatórias, “atraem-se mais as grandes operações e clientes”. Contudo, classifica a economia nortenha como sendo de “referência familiar”, e que assenta muito “na confiança pessoal a escolha dos prestadores de serviços”.
O futuro dos advogados? Passa pela seriedade
Se pudesse deixar dicas aos advogados mais novos, José de Freitas diz que o advogado é-o tanto mais “quanto mais merecer a confiança do cliente”. “E esta confiança alcança-se com a reunião das qualidades éticas, deontológicas e técnicas que definem uma pessoa séria, respeitadora e competente em qualquer ramo”, diz, em jeito de conselho.
Nos tempos livres, o advogado especializado em arbitragem, fusões e aquisições e em resolução de litígios, entre outras áreas, dedica-se a alguns desportos sazonais, relacionados com a neve e a água. “Também vou jogando golfe, paixão esta que tenho vindo a trair com a plantação e produção vinícola, a que tenho dedicado os escassos tempos que vou libertando”, remata.
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