Ex-titulares da Cultura defendem acordo com a banca na Coleção Berardo. Mas o Estado tem dinheiro?

Um acordo entre o Estado e os bancos deveria ser a solução para garantir que a Coleção Berardo permanece em território nacional e em exposição ao público. Acordo para a Coleção BES pode ser modelo.

Um acordo entre o Estado e os bancos credores para que as obras da Coleção Berardo continuem em Portugal e em exposição ao público é o que desejam os antigos titulares da Cultura ouvidos pelo ECO. Luís Filipe Castro Mendes, o ministro da Cultura que antecedeu a Graça Fonseca, e Jorge Barreto Xavier, o secretário de Estado da Cultura de Pedro Passos Coelho (que não teve ministro da Cultura), estão satisfeitos com o rumo que os acontecimentos estão a levar.

Esta segunda-feira foi decretado o arresto da coleção Berardo, conforme avançou o Público. A providência cautelar decretada sobre os quadros foi acionada judicialmente a pedido dos bancos credores, que decidiram depositar nas mãos do Estado a salvaguarda das obras de arte. Por outro lado, os bancos — Caixa Geral de Depósitos, BCP e Novo Banco — vão avançar em breve com uma ação principal, que poderá determinar a penhora da coleção para executar a dívida do empresário madeirense.

“Há um bom espírito entre os três bancos e o Governo”, sublinha Luís Filipe Castro Mendes, “mas ainda estamos longe de haver uma decisão jurídica em tribunal”, alerta o ex-ministro da cultua. “Estamos perante uma negociação com uma instituição pública e duas privadas, sendo que com o Novo Banco pode ser algo no género do que foi obtido com o Lone Star com a coleção BES. Assim, há uma forte razão para fazer acordo com a CGD, com o Novo Banco já há um precedente e com o BCP não vejo razões para não se conseguir“, afirma o responsável pela protocolo assinado entre o Lone Star e o Estado, em janeiro de 2018, para o Novo Banco disponibilizar, à fruição pública, o património cultural e artístico herdado do BES, que reúne pintura, fotografia, numismática e uma biblioteca.

“Fico contente que seja possível chegar a acordo com os bancos que me parece ser a solução mais adequada. O pior seria a alienação das obras como bens de forma comercial”, afirma Barreto Xavier. O antigo responsável da Cultura defende que se trata de “um ativo que não se deve vender”, pelo que”se deve chegar a acordo com os bancos”, uma solução que já tinha defendido em declarações ao ECO em maio. Barreto Xavier recorda que “o Estado não se substitui à decisão dos bancos privados e o banco público tem autonomia, e deve continuar a ter”, por isso, este acordo vai “depender da capacidade negocial do Estado” para que seja “disponibilizado o acesso a uma coleção importante e única no panorama nacional e até no contexto internacional”. Mas, “os bancos têm de estar confortáveis com essa situação”, sublinha.

Na apresentação de resultados semestrais do BCP, Miguel Maya, presidente do banco, disse claramente que a instituição não deixará “nada por fazer para recuperar os créditos”. Ora as obras são um ativo que poderá integrar o balanço dos bancos credores. Luís Filipe Castro Mendes considera que vender as obras não geraria “montantes com significado face aos problemas que os bancos têm”, mas também admite que algumas peças da coleção até podem ser vendidas.

“Há um núcleo muito importante, que não pode ser alienado, sendo que algumas eram as obras que Berardo tentou vender no estrangeiro“, afirmou o ex-ministro da Cultura de António Costa, nomeadamente obras raras de Jean Dubuffet, Joan Miró, Yves Klein e Piet Mondrian. “Mas há estudos que admitem a possibilidade de algumas obras serem alienadas”, referiu, acrescentando que isto é uma matéria que vai além do seu conhecimento e que “tudo é passível de discussão”.

Mas e se o acordo com os bancos falhar? O Estado deve comprar as obras? E tem dinheiro para isso? Luís Filipe Castro Mendes garante que “é possível” o Estado comprar, mas admite que será “um montante difícil de orçamentar”. “O montante é elevado, mas não é tão elevado que esteja acima de qualquer possibilidade”, sublinha o ex-ministro.

No primeiro acordo de comodato entre o Estado português e Joe Berardo, que terminava em 2006, era fixado o valor de 316 milhões para a aquisição da coleção — um valor apurado pela avaliação feita pela leiloeira Christie’s. Mas na renovação do acordo, dez anos depois, em 2016, caiu a cláusula que estabelecia o preço do exercício de compra, e Joe Berardo passou a ter a palavra final no valor. “Agora estamos nas mãos de Berardo”, disse a coordenadora do Bloco, Catarina Martins, no debate quinzenal após a audição do empresário madeirense no Parlamento.

Opinião diferente tem Barreto Xavier. “O Estado não tem capacidade” financeira para aumentar de forma tão significativa a despesa. A avaliação de 316 milhões de euros é “muito acima do Orçamento da Cultura que ronda os 200 milhões”, sublinhou o responsável que assumiu os destinos da Cultura em Portugal entre outubro de 2012 e outubro de 2015, em declarações ao ECO em maio. Se o Estado vier a adquirir as obras, o ex-secretário de Estado admite que “não tem de comprar todas as obras”. “Há que fazer um trabalho crítico” de escolha das obras, em função do valor das mesmas.

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