Leadership Summit 2019: Como liderar na idade do algoritmo?
A 3.ª edição do Leadership Summit Portugal desafiou especialistas a refletir na resposta para uma das questões do futuro da liderança: "Estaremos a caminhar juntos?".
“Eu não sou um robô, sou um ser humano”. Foi assim que se apresentou o primeiro orador, vindo da Grécia, o professor de gestão e filósofo Haridimos Tsoukas, que abriu as hostes das sessões da 3.ª edição do Leadership Summit Portugal, que decorreu esta terça-feira, no Casino do Estoril.
Na conferência intitulada “O belo mal e o desejo transcendental: IA e espiritualismo”, Haridimos explicou algumas técnicas para “liderar na era do algoritmo” e explicou de que forma a filosofia e o espiritualismo na liderança podem ser parte das respostas. “Precisamos de desenvolver o que já temos: competências humanas e únicas de compreensão, adaptação, empatia e transcendência”, revela o filósofo, que acredita que as particularidades que nos tornam humanos serão insubstituíveis pela inteligência artificial. “A IA (inteligência artificial) é parte da nossa vida, mas não percebe os inputs que processa e os outputs que gera”, justifica Tsoukas.
"Liderar de forma inteligente é desenvolver perceção, perceber as nuances da situação e conectar-se emocionalmente consigo próprio e com os outros”
“Os humanos podem oferecer mais do que a IA e que os robôs, através da filosofia, gestão e da liderança”, por exemplo, através da “capacidade humana da espontaneidade”, alerta Tsoukas. Entender o “horizonte do significado”, o que está implícito, sentir a dimensão tácita — do que não se mostra com a voz, ou com palavras –, analisar o presente com experiências do passado, sentir empatia e o “sexto sentido”, são características inimputáveis aos robôs, exemplifica.
Para o filósofo, a liderança e a filosofia podem encontrar um ponto em comum, partindo de uma perspetiva política Aristotélica: “A forma como um ser humano responde a uma situação vai depender do seu caráter que, por sua vez, depende da sua perceção, emoções e motivos”. Assim, “liderar de forma inteligente é desenvolver perceção, perceber as nuances da situação, e conectar-se emocionalmente consigo próprio e com os outros”.
“A gestão feliz”
“E se o sucesso não fosse o indicador mais importante para os líderes e para os gestores? E se a felicidade passasse a ser uma forma de medir a liderança?”. Foram estas as duas questões lançadas pelo CEO da Altice, Alexandre Fonseca, que refletiu sobre o impacto da liderança nas organizações, e em particular na atração e retenção de talento. Uma das prioridades da Altice tem sido a “aposta nas novas gerações e a preparação dos futuros líderes”, referiu ao ECO na entrevista de antecipação do evento.
Para o gestor, o “fator humano é o critério chave da liderança”, e um líder deve ser próximo, criar laços e envolver os colaboradores. “A liderança constrói-se”, sublinha Alexandre Fonseca, e sem estereótipos, assente em valores como a “proximidade, o conhecimento, a empatia, inteligência emocional e o espírito de equipa“.
"Liderar é ter coragem para transformar.”
“Liderar não tem de ser solitário”, refere o CEO, que acredita que o líder de sucesso deve rodear-se de uma equipa e, acima de tudo, conhecê-la, contribuindo “para a felicidade dos colaboradores“. Um líder deve ser “politicamente incorreto” e “continuamente irreverente” porque “liderar é ter coragem para transformar”, defende Alexandre Fonseca.
Um líder deve “fazer os outros quererem aquilo que nós também queremos”. Alexandre Fonseca considera-se um “gestor feliz,” numa “viagem que não faz sozinho”, por isso, deixa uma mensagem a futuros líderes: “Devemos a nós próprios ser felizes”.
A etimologia da liderança
Henrique Monteiro trouxe ao Leadership Summit outro olhar sobre a definição de liderança: a origem etimológica das palavras. Para o jornalista e escritor, é possível encontrar a definição de um bom líder na origem de três palavras: “liderança”, “manipulação” e “carisma”.
O termo “liderança”, de origem na língua frísia, está ligada à palavra “lead”, que significa a primeira parte de uma peça musical, ou primeiro parágrafo de uma notícia, explica o jornalista. De origem latina, a palavra “manipulação” refere-se ao que é possível “moldar com as mãos”, a “mão que gera” e está relacionado com o termo “manajeiros”, os capatazes que dirigem o trabalho das ceifas. Por fim, do grego caris, carisma significa “mostrar-se favorável”, “estar pronto para tudo”. O carisma — o “poder de sedução” — representa “os favores, a graça e a recompensa, retribuídas a quem segue alguém que tem um impacto positivo na nossa vida”, explica Henrique Monteiro.
“Apesar destes valores não serem materiais, são metafísicos”, sublinha o jornalista, abrindo espaço para a conexão entre a espiritualidade e a liderança. Para Henrique Monteiro, “a inteligência passará sempre pelos sentidos” e, talvez no futuro, “as máquinas possam vir a ter algo parecido com as sinapses que ocorrem no nosso cérebro, mas a pergunta de um milhão de dólares será sempre: o código moral e ético que desenvolverão será igual ao nosso?”.
“A grande liderança é espiritual”
O contexto empresarial deste século é “VUCA”, sigla em inglês para “volátil, incerto, complexo e ambíguo”, afirma Chris Lowney, seminarista jesuíta e antigo diretor-geral da JP Morgan, que fez o convite à reflexão sobre a prática da espiritualidade das organizações. Para Lowney, o líder do futuro terá de “desenvolver competências, profundamente espirituais” para manter as pessoas nas organizações.
Para Lowney, a inteligência artificial pode “ajudar-nos a melhorar a performance, através de dados”, mas nunca poderá substituir o papel “transcendente” de uma liderança espiritual. “Ser solidário, partilhar uma missão comum, promover o respeito mútuo e motivar, são fatores que não se conseguem pesar, são valores profundamente espirituais”, realça.
Combater o “medo de si próprio”, desenvolver coragem, a confiança, integridade, a compaixão e a capacidade de comunicar, são alguns traços de uma liderança mais humana, defende Lowney. Para terminar, o seminarista norte-americano deixou um conselho a todos os líderes: “Fazer uma pausa mental” diária para “agradecer”, “abrir horizontes” e “rever o seu dia”.
O Leadership Summit 2019 trouxe ainda a debate o ambiente e as alterações climáticas, por serem temas que “nos obrigam a caminhar juntos”, e fazem parte da equação da liderança do futuro. O debate “verde” fez-se a três vozes, com Eduardo Rêgo, a voz da BBC Wild Life e fundador da associação Loving Planet, Francisca Salema, uma das organizadoras da greve climática de 27 de setembro, e Diogo Alves, curador da Global Shapers do Fórum Económico Mundial em Lisboa. Os três concluíram que é necessário “trabalhar em conjunto” e, para Eduardo Rêgo, esta é “uma pergunta sacramental”, que deve ser respondida “com a própria vida e com o próprio comportamento”.
Liderança: o poder de “devolver”
Para fechar o dia de conferências, Pedro Afonso, CEO da VINCI Energies Portugal, subiu ao palco para pensar a liderança como “uma oportunidade de devolver”, tendo por base o livro que está a escrever “Leadership: “The power of giving back“. Para o ajudar a encontrar respostas convidou alguns especialistas de áreas distintas como a neurociência, a música e a filosofia.
Tal como um líder numa organização, “o sucesso de um maestro passa pela forma de transmitir a mensagem e lidar com qualquer coisa que não esperava, até no som que lhe é transmitido”, exemplificou a maestrina Joana Carneiro. “Uma orquestra não é mais do que uma forma de tornar o nosso trabalho muito eficaz e eficiente”. Para o professor e filósofo António Caeiro, a filosofia pode ser útil para os gestores pela “utilidade e pragmatismo”. “Dar, restituir, agradecer, homenagear, são ideias que não têm um vetor unidirecional, mas implicam esta compreensão formal que somos uns com os outros”, acrescentou o filósofo.
Para o CEO Pedro Afonso, a liderança precisa de “mais espírito e atitude de altruísmo”, que se materializa na “devolução” ao outro, à sociedade, ou aos colaboradores de uma organização.
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