TLTRO, juros e dívida. BCE poderá seguir Fed na reação ao coronavírus
Christine Lagarde garante que o banco central da Zona Euro está a acompanhar desenvolvimento do surto. Após a decisão surpresa da Fed, cresce a expetativa sobre o que vai fazer o BCE.
Bolsas a caírem a pico, reuniões de emergência de líderes mundiais e cortes de juros surpresa. O coronavírus criou um cenário nos mercados financeiros que traz à memória o pânico da crise financeira, com a falência do Lehman Brothers, em 2008. Banqueiros centrais e ministros das Finanças prometem estímulos monetários e orçamentais, mas o primeiro a premir o gatilho foi a Reserva Federal norte-americana (Fed), aumentando a expetativa sobre a reação do Banco Central Europeu (BCE).
“O surto de coronavírus é uma situação em rápido desenvolvimento, que cria riscos para o outlook económico e para o funcionamento dos mercados financeiros. O BCE está a monitorizar de perto os desenvolvimentos e as suas implicações para a economia, inflação de médio de longo prazo e transmissão da nossa política monetária“, diz Christine Lagarde, em comunicado.
“Estamos prontos a tomar medidas específicas e apropriadas, se necessário de forma proporcional aos riscos”, sublinhou, replicando o que vários banqueiros centrais têm dito. O discurso é unânime, mas poucos tomaram medidas: a Austrália e a Malásia cortaram taxas de juros nas habituais reuniões de política monetária em que definem a estratégia a seguir, mas foi a Fed que surpreendeu.
O banco central liderado por Jerome Powell anunciou um corte de juros surpresa devido ao surto, que já infetou 91 mil pessoas em todos os continentes e causou mais de três mil mortos. A queda foi de 50 pontos base para um intervalo entre 1% a 1,25% e Powell deixou a porta a novas descidas, se necessário. Powell garantiu ainda que os bancos centrais de todo o mundo estão em contacto constante, no mesmo dia em que o G7 se reuniu para discutir uma intervenção conjunta.
"O rápido e assertivo corte de juros da Fed apoia a nossa visão de que o BCE irá participar no exercício global coordenado de alívio. O BCE irá provavelmente cortar a taxa de depósitos em 10 pontos base e aumentar o volume de compras de obrigações mensais, temporariamente, em 20 mil milhões de euros.”
A próxima reunião do BCE está marcada para quinta-feira da próxima semana, dia 12 de março, mas — tal como aconteceu com a Fed — a instituição liderada por Christine Lagarde poderá surpreender. A diferença é que a margem de manobra do BCE é menor.
“O rápido e assertivo corte de juros da Fed apoia a nossa visão de que o BCE irá participar no exercício global coordenado de alívio“, acredita Jörg Krämer, economista-chefe do Commerzbank. Numa nota de research divulgada esta terça-feira, o banco de investimento antecipa que o BCE corte a taxa de juro dos depósitos em 10 pontos base e que aumente o volume de compras líquidas em 20 mil milhões de euros.
Ambos instrumentos foram relançados em setembro do ano passado, com a taxa de juro aplicada aos depósitos a cair para os atuais -0,5% e o recomeço das aquisições de dívida, em 20 mil milhões de euros por mês. Ou seja, se a projeção do Commerzbank se concretizar, as compras poderão passar para 40 mil milhões de euros por mês e essa taxa poderá cair para a -0,6%. E o mercado parece já o estar a descontar, com a yield das Bunds a 10 anos a negociarem em -0,6%.
“No entanto, é menos claro o que é que o BCE irá fazer. No final das contas, já usou grande parte das munições e os efeitos secundários da política monetária acomodatícia estão a tornar-se incrivelmente visíveis”, aponta Krämer. Na mesma nota, cortou a projeção de crescimento para a Zona Euro para 0,5% em 2020, contra a anterior estimativa de 0,9%.
"Há muito pouco que o BCE possa fazer além de acalmar os mercados financeiros. Para ser franco, neste momento, uma vacina ajudaria muito mais do que mais um corte de juros.”
Além destas, há ainda a opção do financiamento de longo prazo a baixos custos, as Targeted Longer-Term Refinancing Operations (TLTRO). Estes programas têm como objetivo aumentar a liquidez na banca e “obrigá-la” a repassar essa liquidez para a economia. Questionado sobre o assunto, o governador austríaco Robert Holzmann confirmou que reforçar as TLTRO está em cima da mesa. “É definitivamente uma área que será discutida na próxima reunião”, disse, citado pela Bloomberg.
Há apenas três meses como presidente do BCE, Christine Lagarde enfrenta o primeiro momento determinante e a reação poderá determinar a forma como será lembrada, ao género do “whatever it takes” dito pelo antecessor Mario Draghi durante a crise.
“O BCE está num impasse com as opções quase esgotadas”, alerta Carsten Brzeski, economista-chefe do ING. “O coronavírus e o seu impacto para a economia precisa, na nossa opinião, mais de políticas orçamentais do que monetárias. Há muito pouco que o BCE possa fazer além de acalmar os mercados financeiros. Para ser franco, neste momento, uma vacina ajudaria muito mais do que mais um corte de juros“.
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