Análise de risco. 64% dos bancos já têm em conta riscos ambientais e sociais

Um inquérito realizado pela Fitch Ratings a 1.400 analistas de crédito em mais de 30 países concluiu que os temas ESG (Environmental, Social and Governance) estão a impactar os ratings de crédito.

Um dos objetivos do Plano de Ação da Comissão Europeia para o financiamento sustentável é: gerir os riscos financeiros decorrentes das alterações climáticas, degradação ambiental e questões sociais. Este objetivo é consubstanciado na Ação 8 do Plano, que prevê a Incorporação da sustentabilidade nos requisitos prudenciais.

Nesse Plano, a Comissão Europeia afirma que “explorará a viabilidade da inclusão dos riscos associados às alterações climáticas e a outros fatores ambientais nas políticas de gestão de risco das instituições e na eventual calibração dos requisitos de fundos próprios dos bancos no âmbito do Regulamento e da Diretiva Requisitos de Fundos Próprios. O objetivo será que esses fatores sejam tidos em consideração sempre que tal se justifique do ponto de vista do risco, a fim de salvaguardar a coerência e a eficácia do quadro prudencial e a estabilidade financeira. Qualquer recalibração dos requisitos de fundos próprios, com base nos dados e na avaliação do risco prudencial das exposições dos bancos, terá de se basear e ser coerente com a futura taxonomia da UE para as atividades sustentáveis”. A Comissão irá apresentar um relatório sobre este tema ao Parlamento Europeu e ao Conselho até 1 de janeiro de 2021 ao abrigo da Diretiva Solvência II31 .

De acordo com Paul Fisher, a maioria dos peritos concordam que os principais riscos ambientais – riscos físicos, de transição e de liability – podem criar externalidades negativas para o setor financeiro e economia em geral. A regulamentação e a supervisão prudenciais, que ambicionam manutenção da estabilidade financeira, reconhecem hoje que esses riscos ambientais podem ser sistémicos e, portanto, os reguladores têm o dever de garantir que sejam considerados adequadamente pelas instituições financeiras.

Este economista afirma ainda que “ao realocar o crédito para setores mais sustentáveis da economia e ao gerir os riscos de crédito e de mercado, os bancos contribuem, em particular, para (i) a adaptação às consequências das mudanças ambientais ao longo do tempo, (ii) a redução da probabilidade de ocorrência dos riscos de sustentabilidade ambiental, (iii) a mitigação do impacto desses riscos quando eles se materializarem e (iv) para a recuperação de um determinado impacto.”

Também o Financial Stability Board, através da Task Force on Climate-Related Financial Disclosures, veio reforçar a importância da gestão dos riscos climáticos, pelo setor privado, incluindo os bancos e instituições financeiras, recomendando que estes divulguem informação sobre: como incluem os riscos climáticos no seu modelo de governação; a sua estratégia para lidarem com os riscos climáticos e as metas e métricas usadas.

Nos bancos, cumprir com este reporte, implica incluir uma análise de riscos climáticos, e ambientais em geral, quando se está a conceder crédito, uma vez que essa é uma das áreas mais relevantes de negócio para os bancos.

Os riscos ambientais e sociais na análise de crédito já são incorporados

São vários os bancos que já desenvolveram algum tipo de análise de risco ambiental e social quando analisam os créditos a conceder a empresas. Um inquérito realizado pela Fitch Ratings no final de 2019 [1] [2] a mais de 1400 analistas de crédito em mais de 30 países, concluiu que os temas ESG (Environmental, Social and Governance) estão a impactar os ratings de crédito de forma genérica a todos os grupos de clientes, e que um número crescente de bancos têm agora critérios ESG nas suas matrizes de risco. Na realidade, cerca de 64% dos 182 bancos disseram que já incorporam considerações ESG na sua análise de risco, e 16% afirmam realizar análise de cenários para uma temperatura mundial com mais 2ºC e/ou testes de stress incluindo riscos climáticos.

Este inquérito identificou também que são os bancos de dimensão média (ativos consolidados de 100 a 500 mil milhões de dólares) e grande (ativos consolidados superiores a 500 mil milhões de dólares) que têm uma maior presença de políticas de ESG nas decisões de conceder empréstimos.

A nível regional são os bancos africanos, da América Latina e Europa de Leste que apresentam uma maior presença de políticas de ESG no crédito, ou seja, são aqueles bancos que têm uma base de investidores mais preocupados com os temas ambientais e uma maior pressão social, que mais avançam nesta matéria.

Os setores mais afetados

Os principais projetos aos quais os empréstimos foram negados estavam associados a transações que implicavam riscos elevados ao nível da violação dos direitos humanos, do trabalho forçado ou condições de trabalho não seguras, e que normalmente ganham maior relevância nos setores mineiros, metais, agricultura e têxtil. Muitos dos bancos da Europa Ocidental também apresentam proibições de financiamento relacionados com a produção de energia vinda de carvão.

Alguns outros bancos europeus também não financiam projetos associados à produção de armamento. Por outro lado, os setores de tecnologia, telecomunicações e media, retalho, serviços de saúde e produtos farmacêuticos são os menos propensos a enfrentar triagem negativa.

A análise “pela positiva”

Um dos temas em discussão relativamente ao potencial desenvolvimento dos rácios prudenciais, prende-se com dois possíveis cenários: deverão os rácios prudenciais ser inferiores quando se empresta capital a um projeto ambientalmente sustentável? Ou deverão os rácios prudenciais ser superiores quando se empresta capital a um projeto “castanho” (ou poluente)?

Uma grande maioria dos bancos diria preferir a primeira situação, existindo assim um incentivo aos empréstimos verdes, não existindo nenhuma punição aos empréstimos “castanhos”. No entanto, este inquérito da Fitch veio-nos dizer que, em geral, os bancos parecem menos propensos a fazer uma análise positiva às boas práticas das empresas. Este facto pode-se dever à ainda inexistência de incentivos a estas análises, ou à falta de prática em se implementarem taxas de juro diferentes, consoante as boas práticas ambientais e sociais praticadas pela empresa.

Riscos e Taxonomia

De recordar que a Taxonomia sobre as atividades ambientalmente sustentáveis, abarca os seguintes setores:

  • Agricultura e Floresta
  • Manufatura
  • Eletricidade, gás, vapor e ar condicionado
  • Água, sistemas de esgotos, resíduos
  • Transporte
  • Tecnologias de comunicação e informação
  • Edifícios

Como tal, e se os bancos quiserem, por exemplo, identificar a percentagem de empréstimos que concedem a projetos ambientalmente sustentáveis, então terão indiretamente de ter políticas ambientais de análise de risco, uma vez que uma atividade ambientalmente sustentável tem de contribuir para pelo menos um dos objetivos ambientais abaixo, não podendo, em simultâneo, causar danos significativos em nenhum dos outros objetivos.

Os seis objetivos ambientais são:

  • Mitigação às alterações climáticas
  • Adaptação às alterações climáticas
  • Uso e proteção dos recursos marinhos
  • Transição para a economia circular, prevenção dos resíduos e reciclagem
  • Prevenção e controlo da poluição
  • Proteção de ecossistemas saudáveis sustentável

Apesar de poder parecer ser muito complexa a criação de políticas de risco que possam ir ao encontro dos seis objetivos ambientais definidos pela Comissão Europeia, o que é facto é que há já vários bancos que têm criado as chamadas políticas de risco ambiental e social. Uma das críticas recorrentes é que estas politicas não são aplicadas em todos os projetos, nem em todas as regiões. E, por vezes, alguns dos bancos com estas políticas acabam por ser também aqueles que ainda investem, de outras formas, em projetos com impacte negativo ambiental.

Este é um tema que a banca tem tido dificuldade em trabalhar de forma global e coerente. No entanto existe um tipo de bancos – os bancos por valores – que incorporam uma análise de risco ambiental e social na sua gestão de risco, não apenas por ser uma boa prática de gestão de risco, mas porque também consideram ser a prática correta a implementar.

Exemplos de políticas de análise de risco ambienta e social:

Barclays: https://home.barclays/citizenship/the-way-we-do-business/environmental-risks-in-lending/

DeutscheBank: https://www.db.com/cr/en/concrete-our-social-and-environmental-risk-framework.htm

ING: https://www.ing.com/Sustainability/Sustainable-business/Environmental-and-social-risk-policies.htm

Rabobank: https://www.rabobank.com/en/images/sustainability-policy-framework.pdf

HSBC: https://www.hsbc.com/our-approach/risk-and-responsibility/sustainability-risk

BNP Paribas: https://group.bnpparibas/en/financing-investment-policies

[1] https://www.fitchratings.com/research/structured-finance/esg-credit-trends-2020-19-12-2019

[2] https://www.fitchratings.com/research/banks/esg-bites-into-banks-lending-to-corporates-07-01-2020?FR_Web-Validation=true&mkt_tok=eyJpIjoiTXpVeE0ySmtPVE00TnpsbSIsInQiOiJlazF2QTllOWwyUlhZRDc5bnNqYnkxMFpCQ0JXQ3pLT3ZiVzk4SlZRc3pabmRDWlpKUUxCRzhZY0ZLYnBqNk5WbUR6YUxrZEZTSXRibWYwcGZQK0hUWTZBUkNOZlNwZ3owWUtaWXZxR3RoWkRxNjM3QnppYnczT1M2cHBjUmhJNSJ9

  • Economista especializada em sustainable and climate finance

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