Vêm aí os combustíveis do futuro. Vão custar às petrolíferas 650 mil milhões de euros até 2050

Em 2025, as "refinarias do futuro" vão produzir uma nova geração de combustíveis limpos, com menos 90% de emissões. Os carros serão os mesmos mas, para poluir menos, os preços na bomba vão subir.

Não há volta a dar. A transição energética para uma economia europeia menos descarbonizada já está em marcha e ninguém quer ficar para trás. Nem mesmo as petrolíferas. Depois de as empresas do setor elétrico e do gás natural já terem defendido o seu papel na estratégia para tornar a Europa no primeiro continente neutro em carbono em 2050, são agora as empresas de combustíveis que vêm anunciar investimentos multimilionários para não serem excluídas de um futuro que se quer com emissões poluentes muito mais baixas.

Esta segunda-feira, 15 de junho, a FuelsEurope, associação que representa a indústria de refinação da União Europeia e com a qual a portuguesa Apetro – Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas colabora ativamente, apresenta o seu novo plano de ação “Combustíveis limpos para todos” com investimentos entre 400 e 650 mil milhões de euros nos próximos 30 anos para alcançar a neutralidade climática, de acordo com a pesquisa do braço científico Concawe – Environmental Sciente for European Refining.

Já na próxima década, até 2030, o esforço de investimento terá de chegar a um valor entre 30 e 40 mil milhões de euros para ser possível criar as chamadas “refinarias do futuro”: unidades de produção de uma nova geração de combustíveis líquidos de baixo carbono, capazes de produzir até 30 milhões de tonelada equivalente de petróleo.

Estas “refinarias do futuro” poderão começar a operar “o mais tardar já em 2025″, garante a FuelsEurope (da qual faz parte a petrolífera portuguesa Galp, mas também a BP, Shell, Total, Cepsa, Repsol, Eni, ExxonMobil, entre outras), com base no “conhecimento tecnológico atual e na estimativa de custos”. Em vez de transformarem crude, como fazem há mais de 100 anos, as refinarias utilizarão novas matérias-primas de base para os combustíveis do futuro, como biomassa, energias renováveis, resíduos e CO2 capturado, transformadas depois em hidrocarbonetos na sua forma líquida, através de novas tecnologias

Já daqui a cinco ou 10 anos, as refinarias serão então mais pequenas e estarão espalhadas por toda a Europa, junto a florestas, parques eólicos ou centrais solares: no leste e norte da Europa será privilegiada a biomassa; o vento dominará nos países costeiros; o sol nos países europeus do sul, como Portugal; e as unidades de reciclagem de resíduos próximas de áreas urbanas.

A tecnologia necessária inclui biocombustíveis sustentáveis de 1ª geração, hidrogenação de óleos vegetais/desperdícios e resíduos, biomassa, biocombustíveis avançados e e-combustíveis, além de captura e armazenamento de carbono e ainda hidrogénio limpo aplicado em refinarias”, explica a Apetro. Neste momento, os combustíveis do futuro existem apenas em pequena escala industrial em algumas fábricas piloto, como por exemplo: Re-Oil da OMV, em Schwechat (Áustria); e-combustíveis da Sunfire, em Dresden (Alemanha); biorrefinarias da ENI, em Veneza (Itália).

“A via traçada para os combustíveis líquidos de baixo carbono mostra como uma redução intermédia de 100 milhões de toneladas de CO2 por ano pode ser concretizada no setor dos transportes até 2035, e como isto poderia contribuir desde logo para a neutralidade das emissões da UE em 2050. Até esta data, a produção de 90 a 150 milhões de toneladas de combustíveis líquidos de baixo carbono reduzirá 425 milhões de toneladas de CO2/ano, o que corresponde a 90% das emissões do transporte rodoviário e a 50% do transporte aéreo e marítimo. Adicionando estratégias de captura e sequestro de carbono e ainda a captura de emissões na produção de biocombustíveis, o transporte rodoviário atingirá a completa descarbonização”, garante a FuelsEurope.

O alvo deste plano de ação são sobretudo setores como a aviação, transporte marítimo e transporte rodoviário pesado, onde atualmente não existem alternativas tecnológicas equivalentes.

O que são combustíveis líquidos de baixo carbono?

Explicam as petrolíferas que são “combustíveis sustentáveis, de origem não petrolífera, com emissões de CO2 muito limitadas durante a sua produção e utilização. Misturados inicialmente com os combustíveis convencionais, estes combustíveis de baixo carbono substituirão progressivamente os de origem fóssil”. Além disso, não exigirão infraestruturas adicionais (de armazenamento, transporte e distribuição) e poderão ser usados em todos os veículos que já hoje circulam nas estradas, incluindo os que ainda são movidos a gasóleo e que já tiveram a sua morte anunciada a curto prazo pelo Governo português.

“Estes combustíveis são compatíveis com a atual tecnologia de motores”, diz a FuelsEurope, garantindo que em 2050 o parque automóvel europeu será composto por um misto de veículos com motores de combustão interna extremamente eficientes e veículos elétricos. Na bombas, os consumidores também não notarão grandes diferenças a olho nu (estas estarão sobretudo na composição do combustível que servirá para atestar o depósito) mas podem ver os preços subir numa primeira fase. Ou seja, vão pagar mais para emitir menos gases poluentes quando se deslocam. “O preço dependerá de vários fatores, como procura do mercado, níveis de impostos alternativos e esquemas de apoio do governo”, dizem as petrolíferas.

Na visão de John Cooper, diretor geral da FuelsEurope, o plano de ação “Combustíveis Limpos para Todos” permitirá que “os transportes contribuam para a neutralidade climática da UE até 2050, com base no fornecimento e utilização de combustíveis líquidos com baixo teor de carbono, em vários setores”. E garante: “As indústrias de combustíveis não voltarão a trabalhar como até aqui”.

Além de não quererem continuar a ser vistas como as “más da fita” no que diz respeito às emissões poluentes, as petrolíferas procuram ocupar o seu lugar na transição energética ao lado das tecnologias de eletrificação e de hidrogénio verde. A FuelsEurope e a Apetro citam uma uma sondagem aos consumidores realizada em vários países europeus, em 2019, que mostra que os cidadãos da UE desejam mais opções na transição para a mobilidade neutra em carbono, bem como o desenvolvimento de várias tecnologias de veículos limpos.

“Os combustíveis líquidos de baixo carbono fazem parte do cabaz energético por direito próprio. A procura global por combustíveis líquidos permanecerá forte, principalmente para o transporte comercial, aviação, marinha, e indústria petroquímica, onde a eletrificação não é tecnologicamente possível. Para o segmento de veículos ligeiros, em especial os automóveis, a eletrificação será muito significativa, mas nalgumas regiões e para alguns utilizadores, pode ser menos prática ou mais lenta. As duas soluções viverão lado a lado, pois não há uma “bala de prata”, nem uma tecnologia única capaz de enfrentar o desafio de descarbonizar todo o setor de transporte”, garante a associação das petrolíferas europeias.

“Os combustíveis líquidos de baixo carbono serão essenciais, garantindo a segurança do abastecimento, fornecendo uma opção ao consumidor e permitindo também a liderança industrial da Europa”, diz John Cooper, apelando aos decisores políticos da UE para que estabeleçam um diálogo de alto nível com a indústria de combustíveis o mais rapidamente possível. Estamos prontos para assumir a liderança.”

Ao poder político da União Europeia, a FuelsEurope pede, entre outras coisas: a criação de um mercado para combustíveis limpos, com um aumento do preço do carbono; a alteração dos padrões de emissões de CO2 nos veículos, para que seja contada toda a pegada carbónica desde a produção do combustível e não apenas à saída do tubo de escape; tributação do carbono e não da energia, para incentivar investimentos em combustíveis renováveis avançados e manter os preços dos combustíveis socialmente aceitáveis; acesso a fundos públicos e privados e tratamento fiscal favorável.

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