Marcas de luxo juntam-se para incentivar portugueses a regressarem à Avenida da Liberdade

Sob o mote “Um dia na Avenida”, 30 marcas de luxo unem-se "a uma só voz" para lançar a campanha #deVoltaàAvenida, convidando os portugueses a frequentarem a mais luxuosa artéria comercial do país.

Longe vão os tempos em que a Avenida da Liberdade, em Lisboa, se enchia de turistas e portugueses. A pandemia do novo coronavírus obrigou o comércio a fechar portas, originando prejuízos sem precedentes. Agora, lojas, hotéis, restaurantes e escritórios da principal artéria comercial do país juntam-se numa campanha conjunta para incentivar o regresso a este “centro comercial ao ar livre” e estimular a economia.

Sob o mote “Um dia na Avenida”, 30 marcas de luxo reúnem-se “a uma só voz” para lançar a campanha #deVoltaàAvenida, convidando os portugueses a frequentar os seus espaços, por forma a retomar o dinamismo da zona. No espaço de dois meses, esta é já a segunda iniciativa da Associação Passeio Público (APP), que, reúne um grupo de empresários, empreendedores e amigos da Avenida, para fazer face ao impacto económico da pandemia.

Se a primeira campanha lançada em maio se focava no regresso em segurança à Avenida da Liberdade, a segunda pretende demonstrar a versatilidade da luxuosa artéria portuguesa. “Cada retalhista está a fazer vídeos com pessoas que chamamos “normal people” (pessoas comuns, em português) que podem ser amigos, clientes, colaboradores ou outra pessoa qualquer que usufrui do dia-a-dia da Avenida. A ideia é cruzarmos o tipo de atividades e demonstrar o quão versátil e agradável é a vida na Avenida”, explica ao ECO David Kolinski, administrador da Boutique dos Relógios Plus.

Além da Tod’s, o grupo Brodheim é detentor de outras marcas conhecidas, como a Burberry, Furla, Guess ou Timberland,D.R.

Com a duração de uma semana, a campanha arrancou na segunda-feira dia 13 e termina a 20 de julho, sendo que os vídeos são publicados nos diversos canais digitais dos promotores. Para Lídia Simão, sales executive manager do grupo Brodheim (detentor das marcas Burberry, Furla, Guess, Timberland ou Tod’s), “esta iniciativa faz todo o sentido”, assim como a criação da APP, justificando as parecenças entre Avenida da Liberdade e Regent Street, em Londres, que “está de alguma forma organizada como centro comercial ao ar livre”.

Presente desde 1985 na Avenida da Liberdade, o grupo Brodheim “foi dos primeiros retalhistas em Portugal a apostar naquela avenida”, conta, orgulhosa, Lídia Simão. Contudo, a pandemia do novo coronavírus trocou as voltas ao negócio, já que vivia essencialmente de turistas. Com todas as lojas fechadas desde dia 19 de março, a estratégia virou-se “para manter o contacto com os clientes através de Whatsapp, telefone ou outras plataformas, como a parceria da Farfetch”. Contudo, a aposta no digital por parte dos clientes foi “residual” e “não chegou a compensar a perda a nível físico”, admite a responsável. Agora que as lojas já reabriram “as visitas de clientes estrangeiros não estão a zero”, mas são muito menores, refere Lídia Simão. “Neste momento o peso de nacionais deverá rondar eventualmente os 90% e 10% de estrangeiros. Antes entre entre 20% a 50% de nacionais, consoante a marca“, revela.

As visitas de clientes estrangeiros não estão a zero. Temos algumas visitas principalmente de europeus e também de estrangeiros residentes, mas a maior afluência tem sido por parte de nacionais”.

Lídia Simão

sales executive manager do Grupo Brodheim

A economia portuguesa é em grande parte impulsionada pelo turismo e a pandemia veio colocar um travão ao crescimento do setor. No ano passado, o setor valia 8,4% do Produto Interno Bruto (PIB) português e 20% das exportações nacionais, sendo que mais de 336 mil pessoas trabalhavam no turismo. Depois do mês “negro” de abril, marcado pelo confinamento, o mês do desconfinamento não foi muito melhor para o turismo. Segundo os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), atividade turística ficou “praticamente parada” em maio, registando-se quebras de mais de 90% nas dormidas e de perto da totalidade no que diz respeito aos proveitos do setor.

Estabelecimentos comerciais e lojas de marcas de luxo na Avenida da Liberdade - 17JUL20
Loja da Guess na Avenida da LiberdadeHugo Amaral/ECO

Nesse sentido, a recuperação ainda vai ser longa e, por enquanto, o setor adapta-se para incentivar os portugueses a saírem à rua, dado que ainda vários países têm restrições com Portugal. Apesar de a agitação das lojas não ser a mesma, Lídia Simão diz que “quem desconfiou tem mais vontade de comprar”, sendo por isso importante chamar cada vez mais clientes à Avenida. Além das habituais promoções, o grupo que detém a Burberry ou a Guess tomou outras medidas para incentivar o regresso às lojas, como a possibilidade de os clientes optarem por visitas exclusivas à porta fechada, sendo que estas são habitualmente feitas antes da hora de abertura ou depois do fecho e têm de ser antecipadamente marcadas.

“O cliente português está mais receoso agora. Vivemos tempos de incerteza”

Também para a Rosa & Teixeira, situada no número 204 da Avenida da Liberdade, “os tempos não são fáceis”, sublinha ao ECO Pedro Castro, um dos administradores da marca de vestuário masculino. Presente há mais de 40 anos nesta artéria lisboeta, a loja perdeu “quase todas vendas aos turistas”, já que o turismo é “praticamente diminuto”, sublinha o responsável. Contudo, apesar de “o impacto ser muito significativo” talvez esta marca tenha uma “vantagem” em relação às restantes, uma vez que a “maior parte da clientela sempre foi portuguesa”, aponta. Se antes da pandemia 30% dos clientes eram turistas, agora é os clientes são quase todos nacionais.

Com o espaço aberto desde 18 de maio, já que a loja tem mais de 400 metros quadrados, há menos frequência de clientes no estabelecimento e ao contrário do que acontece nas lojas do grupo Brodheim, o perfil do consumidor mudou. “O cliente português está mais receoso agora, vivemos tempos de incerteza. É verdade que temos vendido, essencialmente a clientes portugueses, mas o grau de compra não é o mesmo que havia antes da Covid-19″, aponta. Esta opinião é partilhada por David Kolinski, administrador da Boutique dos Relógios Plus e responsável pela loja Omega, que diz não sentir “que as pessoas gastem mais dinheiro “, mas sim que os clientes “estão mais criteriosos” na compra. “As pessoas estão a consumir consoante a credibilidade da marca e isso tem muito mais influência do que antes”, explica.

Segundo David Kolinski, administrador da Boutique dos Relógios Plus, os clientes estão “mais criteriosos” nas suas compras.D.R.

Assim, apesar das dificuldades decorrentes da pandemia, nem a gerência da Rosa & Teixeira nem a Omega ponderam fazer promoções especiais para atraírem clientes. Se na marca de vestuário masculino haverá uma semana de descontos em agosto, como habitual, na relojoaria de luxo diz que dada “exclusividade da marca” a política da empresa não tem por hábito fazer descontos, preferindo apostar em “serviços adicionais”, como portes gratuitos para se diferenciarem.

“O desafio é gerir as incertezas que existem”

Com a maioria dos aviões em terra e as deslocações terrestres limitadas, a hotelaria foi também uma das indústrias mais afetadas pela pandemia. Em Portugal, o setor “começou a ressentir-se em fevereiro e a partir de março já estávamos numa situação ao mesmo nível que estava a acontecer em Itália e Espanha”, explica ao ECO Miguel Garcia, diretor-geral do Tivoli Avenida da Liberdade e diretor regional de operações do grupo. Entre março e maio, cerca de 90% dos hotéis aderiram ao lay-off e 40% às linhas de financiamento do Governo, segundo o inquérito mais recente da Associação de Hotelaria de Portugal (AHP). As estimativas do setor apontam ainda para quebras de até 90% das receitas na totalidade do ano, o equivalente a uma perda superior a três mil milhões de euros.

Estabelecimentos comerciais e lojas de marcas de luxo na Avenida da Liberdade - 17JUL20
Hotel Tivoli na Avenida da LiberdadeHugo Amaral/ECO

Nesse sentido, com três hotéis na Avenida da Liberdade, — o Tivoli Avenida, AVANI Avenida Liberdade Lisbon e NH Collection –, para o responsável o desafio “é gerir as incertezas que existem”. Por isso, o grupo decidiu abrir os espaços de forma faseada, sendo que o NH Collection reabriu no início de junho, o Tivoli da Avenida da Liberdade vai reabrir no final deste mês” e a reabertura do AVANI vai depender “do que acontecer no mês de agosto”.

“Temos alguma expectativa com a vinda da Champions em agosto. Vamos ver o que virá. Estamos a gerir semana a semana as perspetivas e elas podem mudar rapidamente.”

Miguel Garcia

diretor-geral do Tivoli Avenida da Liberdade e diretor regional de operações do grupo Tivoli

A decisão é justificada pelo facto de existir “uma retoma progressiva” do turismo e “as fortes restrições” de circulação que vigoram em alguns países, como os Estados Unidos, Brasil e Reino Unido não abonam a favor, já que antes da pandemia eram os três principais mercados a apostarem no mercado português, segundo Miguel Garcia. Agora, ainda que a taxa de ocupação esteja “baixo do desejável”, o principal mercado do grupo são portugueses e espanhóis, dada a proximidade fronteiriça. “No ano passado, nesta altura estaríamos com uma taxa de ocupação acima dos 85%, agora estamos com uma taxa de ocupação de 50%, o que para as circunstâncias é bastante positivo”, aponta.

Para esta nova fase, o grupo está expectante com a vinda da Champions a Portugal, em agosto, sendo que a decisão de ter ou não público não foi tomada. Não obstante, seja qual for a decisão, a estratégia principal do Tivoli passa por transmitir confiança e segurança aos clientes, através, por exemplo, do selo Clean&Safe atribuídos pelo Turismo de Portugal a todos os seus espaços. Além disso, estabeleceram protocolos de segurança, bem como algumas campanhas para “incentivar o mercado interno”, já que “é o mercado com o qual podemos contar”, assinala o diretor-geral do Tivoli Avenida da Liberdade. “Temos uma campanha de verão que além de uma flexibilidade de cancelamento estamos a oferecer um desconto de 25% nas estadias“, destaca.

No topo do hotel Tivoli Avenida Liberdade fica o restaurante SeeN, uma parceira do grupo Tivoli com o Chef OliverD.R.

A posição relativa à importância de transmitir confiança aos clientes é partilhada pelo JNcQUOI, detido pelo Grupo Amorim, que refere que “os clientes reconhecem o esforço” das medidas de higiene implementadas pelo grupo. Com dois na Avenida da Liberdade — o JNcQUOI Asia e JNcQUOI Avenida –, as perspetivas para esta nova são positivas. “Estamos a ter casa cheia obviamente com os limites de imposição de espaço e temos a sorte de ter dois espaços ao ar livre. Já tínhamos o terraço do Asia, mas abrimos também uma esplanada do JNcQUOI Avenida“, assinala Rita Silvério Marques, general manager of fashion retail do Grupo Amorim.

Estabelecimentos comerciais e lojas de marcas de luxo na Avenida da Liberdade - 17JUL20
Pormenor da fachada do restaurante JNcQUOI AsiaHugo Amaral/ECO

 

Quanto à quebra de faturação no período em que estiveram encerrados, segundo a responsável, foi “obviamente muito relevante” já que tiveram “alguns dias sem nenhuma atividade”. Contudo, para fazer face a esta situação, o grupo reinventou-se e lançou no início de abril um serviço de take-a-way, que pretende “garantir que os clientes têm em casa a mesma qualidade de produtos dos restaurantes”, e por isso, “todos as refeições são préprontas e exigem a cozedura posterior”, explica. Apesar de o ritmo deste serviço ter diminuído ligeiramente com a reabertura dos restaurantes, Rita Silvério Marques não descarta ainda a possibilidade de o estender a outras zonas do país, já que por enquanto só funciona na Grande Lisboa.

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