EDP só pode ser condenada se Mexia também for. No máximo, terá de pagar multa
Se uma pessoa singular pode ser presa, o mesmo não acontece com uma sociedade. A EDP foi constituída arguida no caso das rendas excessivas e, caso seja considerada culpada, poderá apenas ser multada.
Para lançar um aumento de capital no mercado, a EDP teve de publicar um prospeto onde descreve todos os riscos do que pode acontecer ao negócio, mas não só. Uma das principais preocupações prende-se com o processo judicial em que a elétrica está envolvida e que levou à suspensão do CEO António Mexia. Mas a própria empresa é arguida no caso das rendas excessivas. Numa situação que só é possível em Portugal há pouco mais de uma década, a EDP poderá ter, no máximo, de pagar uma multa e dificilmente será condenada sem que o gestor também o seja.
“A partir de 2007, pessoas coletivas, nomeadamente as sociedades, passaram a poder ser responsabilizadas criminalmente por alguns crimes que estão no código penal, o que quer dizer que a própria pessoa coletiva pode ser condenada. É preciso que se prove que que o crime foi cometido em nome e interesse da pessoa coletiva, por alguém com um cargo de representação“, explica Henrique Salinas, sócio e responsável pela área de penal económico e compliance da CCA.
A EDP foi notificada, a 12 de julho, pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), de que deveria designar um legal representante a fim de ser constituída arguida. Em causa estão suspeitas de corrupção relacionadas com a contratação, pela EDP, do pai do então Secretário de Estado de Energia, Artur Trindade.
"O regime sancionatório das pessoas coletivas prevê que não sejam sancionadas da forma que é a mais comum para as pessoas singulares que é a pena de prisão. Como alternativa, as pessoas coletivas têm um regime sancionatório próprio, e o preferencial é a multa.”
O processo passou, assim, a contar com sete arguidos, incluindo o CEO da EDP António Mexia e o CEO da EDP Renováveis João Manso Neto. A medida de coação aplicada aos dois gestores implica a suspensão de funções e espera-se agora a acusação. Os seis arguidos que são pessoas singulares podem, caso seja provada culpa, ser presos, enquanto a EDP incorre no equivalente para uma sociedade.
“O regime sancionatório das pessoas coletivas prevê que não sejam sancionadas da forma que é a mais comum para as pessoas singulares que é a pena de prisão. Como alternativa, as pessoas coletivas têm um regime sancionatório próprio, e o preferencial é a multa“, aponta Paulo Saragoça da Matta, sócio fundador da SM&SB – Sociedade de Advogados.
Há também a possibilidade de proibição de exercer atividade (se a empresa tiver mais que uma atividade), podem ser aplicadas restrições à atividade ou pode ser decidida a dissolução da sociedade. Mas este último caso “é o equivalente à pena de morte para uma pessoa singular” e é muito improvável.
Multa por corrupção ativa pode ir de 12 mil a 6 milhões
“A pessoa coletiva não age sozinha. O caminho é começar pela responsabilização da pessoa singular e depois é que se chega à responsabilização da pessoa coletiva”, refere Salinas. Significa que, para que a EDP seja condenada, é quase certo que tenha sido provada também a culpa do gestor. “Há questões muito concretas que poderão ser exceção, como, por exemplo, caso de morte ou caso a pessoa tenha sido enganada por outro”, diz.
Nesse caso, é então feita a correspondência, de acordo com as tabelas do código penal, entre pena de prisão e multa. No caso de corrupção ativa, a pena de prisão para pessoas singulares pode ir de um a cinco anos de prisão. A correspondência é de que um mês de prisão equivale a 10 dias de multa. Cada dia pode variar entre 100 e 10.000 euros.
"A pessoa coletiva não age sozinha. O caminho é começar pela responsabilização da pessoa singular e depois é que se chega à responsabilização da pessoa coletiva. Há questões muito concretas que poderão ser exeção, como por exemplo caso de morte ou caso a pessoa tenha sido enganada por outro.”
Feitas as contas, um crime de corrupção ativa é, para uma empresa, punível com uma pena que varia entre 12 mil e 6 milhões de euros. Esta multa diz respeito apenas a um crime, sendo que é preciso apurar o correspondente a cada crime que seja provada a culpa e é aplicada uma pena coletiva. O número de dias é fixado em função da culpa, ou seja, da gravidade do facto, enquanto o montante diário é escolhido em função da situação económico-financeira da empresa.
“A diferença é tão grande que dá ao juiz total liberdade na escolha, o que levanta questões sobre a constitucionalidade”, diz Salinas sobre a aplicação da pena. As dúvidas são partilhadas por Saragoça da Matta, que sublinha que “a legislação portuguesa deixa completamente livre, nas mãos dos juízes, a decisão sobre a concreta quantificação das multas a aplicar”.
Acrescenta que, mesmo que venha a acontecer, ainda há um todo um processo a seguir até que seja concluída a culpa. “Neste momento, pelo que se sabe, só há indícios para aplicar medidas de coação, que podem ser até rejeitados em recurso. Ainda não há os indícios suficientes exigidos por lei para proferir uma acusação no caso EDP. Ou seja, pode haver indícios, para um juiz de instrução criminal, para que sejam aplicadas medidas de coação, mas daí não se pode concluir que os haja para uma acusação“.
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