Clube dos 100% da dívida está cada vez mais apinhado. Reino Unido é o mais recente membro
O Reino Unido foi o último país a juntar-se ao grupo de países que têm uma dívida pública igual ou superior a 100% do PIB. A pandemia vai tornar este no "novo normal" da economia mundial.
Pela primeira vez desde pelo menos 1961, o Reino Unido atingiu, no segundo trimestre do ano, uma dívida pública superior a 100% do PIB. No início da semana, os dados para Espanha, apesar de ainda não serem oficiais, também apontavam para um rácio acima de todo do produto, segundo a Reuters. Estes países juntam-se a um cada vez maior grupo de países que já tinham ou passarão em breve a ter esses níveis de endividamento público por causa da crise pandémica.
É o “novo normal” nas economias avançadas. O Japão já tinha mais de 200% do PIB de dívida pública, a Grécia para lá caminha, Itália está mais próxima dos 150% que dos 100%, Portugal fechou o segundo trimestre com uma dívida pública de 127,1%. A estes juntaram-se recentemente França e Bélgica e em breve será o caso do Chipre e dos EUA também, segundo os cálculos do Committee for a Responsible Federal Budget.
Esta não é uma tendência exclusiva da das economias avançadas. Segundo Gita Gopinath, a economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), e Vítor Gaspar, diretor do departamento de finanças públicas, a dívida pública mundial irá atingir um máximo histórico em 2020 de 101,5% do PIB mundial, mais do que no fim da Segunda Guerra Mundial. Ou seja, a dívida pública corresponderá ao total da atividade económica mundial realizada num ano.
Ainda esta semana o gabinete de estatísticas britânico revelou que, pela primeira vez desde 1961, a dívida pública britânica fixou-se acima de 100% (100,5%, para ser preciso), neste caso por causa da resposta orçamental dada à pandemia. O Reino Unido não faz parte da Zona Euro — e já nem faz parte da União Europeia –, mas serve de exemplo de um país em que a crise pandémica vai levar a dívida pública para um “novo normal”, que é um nível elevado em termos históricos, e levanta a dúvida sobre as obrigações dos países da moeda única.
Impõe-se a questão: os 100% do PIB de dívida pública vão ser os novos 60%, o limite definido pelos tratados europeus? Na Zona Euro, pelo menos, isso é dado como garantido pela Comissão Europeia dado que as suas previsões apontam para um rácio médio de 102,7% do PIB em 2020, um valor inédito nos 20 anos da União Económica e Monetária. Perante este cenário, o Conselho Europeu Orçamental já sugeriu a eliminação do limite de 60% do PIB, classificando-o de “irrealista”.
Em março, Mario Draghi, ex-presidente do Banco Central Europeu, já tinha avisado que o aumento do endividamento era inevitável: “Já é claro que a resposta tem de envolver um aumento significativo da dívida pública“, escreveu no Financial Times, assinalando que “níveis muito mais elevados de dívida pública irão tornar-se uma característica permanente das nossas economias”, com os Estados a serem ajudados pelas taxas de juro historicamente baixas definidas pelos bancos centrais. “Um maior nível de dívida pública não pode ser evitado“, disse também Laurence Boone, a economista-chefe da OCDE, em junho.
A consequência deste aumento da dívida é o potencial peso que colocará sobre gerações futuras. O FMI tem falado do tema, pedindo aos países que “guardem a fatura” para que haja transparência neste processo. Perante o marco histórico, também o ministro das Finanças britânico, Rishi Sunak, deixou um alerta: “Os números de hoje são um forte lembrete de que temos, ao longo do tempo, de colocar as nossas finanças públicas numa posição sustentável, o que vai exigir a tomada de decisões difíceis”.
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