Governador Centeno não revela relatório secreto sobre Carlos Costa que o ministro Centeno queria?

Bloco de Esquerda lamenta que Mário Centeno se recuse a divulgar relatório sobre a atuação de Carlos Costa noo BES, contrariando o que defendeu o Governo a que pertenceu. Centeno contra Centeno?

O Bloco de Esquerda critica a recusa do governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, em divulgar o relatório secreto da atuação do seu antecessor no supervisor, Carlos Costa, no processo de resolução do BES, isto quando o Governo do qual fez parte quando era ministro das Finanças pretendia a sua divulgação.

Foi Mariana Mortágua, deputada bloquista, quem revelou esta quarta-feira que recebeu uma resposta negativa da parte do Banco de Portugal em relação a um requerimento que apresentou há algumas semanas e onde pedia o acesso ao chamado “relatório Costa Pinto”, sobre a atuação de Carlos Costa na medida de resolução aplicada ao BES, em agosto de 2014.

É um documento “é essencial para apurar as responsabilidades do Banco de Portugal e para compreender as perdas que hoje todos os contribuintes estão a pagar”, frisou Mariana Mortágua, depois de ter anunciado que o Bloco vai pedir uma comissão de inquérito à resolução do BES e à venda do Novo Banco ao fundo Lone Star, em outubro de 2017.

A afirmação

“O governador Mário Centeno recusa-se a enviar a auditoria à resolução do BES, contrariando as posições do Governo, incluindo quando fazia parte dele quando era ministro das Finanças. Quero dizer ao sr. governador do BdP que o BE não aceita esta resposta e vai tentar por todos os meios obter este documento que é essencial para apurar as responsabilidades do Banco de Portugal e para compreender as perdas que hoje todos os contribuintes estão a paga.”

Mariana Mortágua, 2 de setembro de 2020

Os factos

Face às críticas quanto à sua atuação na resolução do BES, o então governador do Banco de Portugal Carlos Costa solicitou em 2015 uma análise ao seu papel em todo o processo. Esta avaliação foi feita pelo presidente da comissão de auditoria do Banco de Portugal da altura, João Costa Pinto, com a colaboração da consultora Boston Consulting Group.

Segundo o próprio João Costa Pinto, em entrevista ao ECO em julho, o relatório não aponta “falhas graves” a Carlos Costa, afirmando antes que a “comissão teve conclusões em que, em muitos momentos, muitas vezes por omissão, outras vezes por entendimento do enquadramento jurídico-regulamentar que à comissão pareceu demasiado restritivo, não foram tomadas as medidas que deviam ter sido tomadas” em todo o processo do BES.

Por várias vezes o Parlamento quis ter acesso ao documento secreto. Uma das últimas vezes que pediu o relatório Costa Pinto foi aquando da comissão de inquérito à recapitalização e aos atos de gestão na Caixa Geral de Depósitos (CGD), no ano passado.

Quando foi à Assembleia da República, no dia 27 de março de 2019, Carlos Costa explicou aos deputados a razão pela qual a aquela avaliação não foi divulgada. O documento interno “está protegido pelas regras do sistema dos bancos centrais”, as quais “visam salvaguardar a independência e reflexão da supervisão” dos bancos centrais, disse na altura, esclarecendo ainda que o relatório “não tem nada a ver com a resolução do BES”, foi antes um pedido feito pelo próprio governador para uma reflexão sobre os critérios de supervisão.

A resposta não deixou os deputados satisfeitos. Agora, o Bloco de Esquerda vem solicitar novamente o documento a propósito de toda a polémica em torno do Novo Banco, que nasceu justamente da resolução do BES.

No requerimento apresentado em julho, os bloquistas recorrem a antigas declarações públicas do primeiro-ministro durante um debate quinzenal em março de 2019 em que referia que também o Governo tentou ter acesso ao documento, tendo o mesmo sido negado pelo Banco de Portugal. Lembram ainda as palavras mais recentes de Mário Centeno, na audição que antecedeu a sua nomeação para o cargo de governador do Banco de Portugal, em que disse que o supervisor “não pode viver numa torre de marfim”.

É agora esta a contradição que o Bloco de Esquerda aponta a Mário Centeno, como Catarina Martins, coordenadora do partido, também fez questão de apontar no Twitter.

A prova dos 9

De facto, António Costa sublinhou no Parlamento, durante um debate quinzenal que teve lugar a 7 de março, a necessidade de conhecer tudo que se passou até à venda do Novo Banco no Lone Star. “Suscita curiosidade ao Presidente da República e até a mim próprio suscita porque gostaria de conhecer as auditorias do Banco de Portugal que nunca sequer foram transmitidas ao Governo“, disse o primeiro-ministro, conforme o ECO acompanhou na altura.

Há dois meses, numa crítica velada a Carlos Costa, Mário Centeno disse: “O Banco de Portugal tem de se tornar sinónimo de ação, para enfrentar os desafios do futuro próximo. Mas não os deve enfrentar numa torre de marfim, mas sim com toda a sociedade portuguesa“. Porém, neste caso, o atual governador não se referiu ao relatório Costa Pinto em concreto, defendendo antes que o supervisor não se deveria fechar em si mesmo.

As declarações de António Costa no debate quinzenal de março de 2019 não deixam grandes dúvidas de que o Governo do qual Mário Centeno fez parte queria ter acesso ao documento secreto. Não é tão claro que Mário Centeno tenha defendido a sua divulgação, como disse Catarina Martins.

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