Já se disse uma coisa e o contrário sobre a auditoria ao Novo Banco que o país nem conhece

Governo, Novo Banco, Banco de Portugal, Fundo de Resolução e partidos: já todos comentaram o relatório da auditoria contando a sua versão. País ainda aguarda por divulgação do documento.

O termo “one size fits all” é muito usado no sistema financeiro para se referir a políticas ou abordagens padrão (o mesmo serve para todos) e não adaptadas individualmente. A julgar pelas declarações públicas a propósito da auditoria ao Novo Banco, o mesmo relatório da Deloitte parece servir as medidas de cada responsável: Governo, banco, Banco de Portugal, Fundo de Resolução e partidos. Muitas vezes, as declarações até colidem entre si. Já se disse uma coisa e o contrário sobre uma auditoria que o resto do país ainda nem sequer conhece.

Por exemplo, o Novo Banco assegura que a auditoria vem comprovar “a forma transparente e competitiva com que tem vindo a recuperar o seu balanço”, isto é, como o banco tem vindo a vender os seus ativos. Para o Bloco de Esquerda a auditoria nada diz das vendas de carteiras.

Banco de Portugal defende que a auditoria vem provar a importância do mecanismo de capital contingente, enquanto o Fundo de Resolução sublinhou os resultados da auditoria mostram a “adequação” da sua atuação em todo o processo. Algo que não está totalmente alinhado com o que outros intervenientes já disseram. Ao ECO, a deputada do CDS Cecília Meireles esclareceu que “a auditoria explica qual é o mecanismo, mas não traz grande novidade” e quer explicações do Fundo de Resolução.

João Paulo Correia (PS) disse que a auditoria confirma que a resolução do BES foi desastrosa. Do lado do PSD, Rui Rio fez mira à venda: “O fundamental é saber, a partir do momento em que foi vendido à Lone Star, o que aconteceu com todas essas perdas por forma a perceber se o dinheiro que os contribuintes pagaram está correto ou não”.

Mas quem tem razão? Não se sabe porque a auditoria continua nos segredos dos deuses. Está prevista a sua divulgação, mas numa versão “censurada” para não ferir o segredo bancário.

Veja quem disse o quê até ao momento?

Novo Banco

“O documento final transmite a clareza e colaboração em que decorreu o processo de análise e confirma a forma transparente e competitiva com que o Novo Banco tem vindo a recuperar o seu balanço. (…) A análise evidencia a importância dos processos de alienação de ativos para a recuperação do balanço do Novo Banco.”

Governo

“O relatório da auditoria especial evidencia que as perdas incorridas pelo Novo Banco decorreram fundamentalmente de exposições a ativos que tiveram origem no período de atividade do Banco Espírito Santo e que foram transferidos para o Novo Banco no âmbito da resolução.

O relatório descreve um conjunto de insuficiências e deficiências graves de controlo interno no período de atividade até 2014 do Banco Espírito Santo no processo de concessão e acompanhamento do crédito, bem como relativamente ao investimento noutros ativos financeiros e imobiliários.”

Banco de Portugal

A auditoria especial confirma a importância do mecanismo de capitalização contingente para a recuperação do balanço do Novo Banco e para a sua viabilidade. Sem aquele mecanismo, o Novo Banco não cumpriria as exigências de redução da exposição a ativos não produtivos, nem os rácios de capital regulatórios a que está sujeito.”

Fundo de Resolução

“No que respeita ao exercício dos poderes do Fundo de Resolução no âmbito do Acordo de Capitalização Contingente, os resultados da auditoria traduzem a adequação dos princípios e critérios adotados. Ainda assim, o Fundo de Resolução não deixará de integrar os resultados da auditoria na sua reflexão permanente sobre a execução do Acordo, tendo em vista extrair as conclusões que se mostrem pertinentes.”

PSD (Rui Rio)

“O BES já todos sabemos a desgraça que foi e todos nós pagamos a fatura. O fundamental é saber, a partir do momento em que foi vendido à Lone Star (em 2017), o que é que aconteceu com todas essas perdas por forma a perceber se o dinheiro que os contribuintes pagaram está correto ou não”

PS (João Paulo Correia)

“[A auditoria veio confirmar que] a resolução foi deficiente e a doença do BES passou para o Novo Banco. (…) O banco está contaminado pelos ativos tóxicos que deviam ter ficado no BES mas passaram para o Novo Banco por decisão do anterior Governo PSD/CDS e também Banco de Portugal.”

Bloco de Esquerda

“A gestão do Novo Banco sob o controlo da Lone Star. Desde o momento da venda que a administração do Novo Banco tomou decisões questionáveis do ponto de vista da defesa dos interesses do acionista Estado. Para além da opção por regras contabilísticas que penalizaram o Fundo de Resolução e da atribuição de bónus aos seus administradores, subsistem enormes dúvidas – que a auditoria da Deloitte não esclarece – quanto à avaliação e venda de carteiras de ativos.”

CDS (Cecília Meireles)

“Vale a pena, numa altura em que parece que todas as questões relacionadas com a alienação de ativos, o que não é bem assim do meu ponto de vista, pois tem muito mais a ver com o mecanismo de capital contingente criado com a venda, perceber que não é apenas a administração do Novo Banco que deve explicações. O Fundo de Resolução e o Banco de Portugal também devem muitas explicações. (…) A auditoria explica qual é o mecanismo, apresenta um excelente resumo, mas não traz grande novidade.”

PCP (Duarte Alves)

“Quanto mais cedo se avançar com o controlo público, mais cedo se acaba com a gestão danosa. O Estado continua a pagar a conta da limpeza do Novo Banco”.

PAN

“Os dados revelados pelo relatório final da auditoria especial ao Novo Banco (…) são preocupantes e demonstram de forma inequívoca o quão ruinosa tem sido a gestão levada a cabo naquele banco e anteriormente no BES ao longo dos últimos 20 anos. (…) Tal gravidade, associada ao enorme impacto que as transferências de dinheiros públicos para o Novo Banco tiveram na sustentabilidade das contas públicas, exige que a Assembleia da República garanta que os resultados desta auditoria sejam públicos e acessíveis a todos.”

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