Banca tem “muita liquidez” para apoiar a recuperação verde da economia, garante Miguel Maya

O CEO do Millennium bcp garante que "o sistema financeiro está sensibilizado para os temas da sustentabilidade", mas avisa que a banca não pode apoiar tudo e todos, sem ter atenção ao risco.

Miguel Maya, presidente da Comissão Executiva do Millennium bcp, garantiu esta quarta-feira que a banca está preparada para apoiar a economia portuguesa no processo de transição energética e na recuperação verde num cenário pós-pandemia, numa conferência online sobre Finanças Sustentáveis organizada pelo Jornal de Negócios.

“Muitas vezes coloca-se os bancos e a economia real em lados opostos. Mas estamos na mesma mesa, e é uma mesa redonda. Vivemos do crédito à economia e da sustentabilidade do crédito que concedemos. Quanto não tomamos decisões sustentáveis, um dia a fatura aparece. No passado já tivemos de cortar crédito à economia, no passado, mas hoje estamos com muita liquidez, temos muito recursos depositados no BCE, mais de 21 mil milhões de ativos passíveis de descontar. Podem contar connosco, o banco está preparado para apoiar a economia, com rigor”, disse o CEO

No entanto, deixa um aviso: “Mas não podemos apoiar tudo e todos, sem ter atenção ao risco. Neste momento, mais de 15% dos ativos do banco estão em risco por motivos de sustentabilidade futura. Só conseguiremos financiamento no futuro com uma avaliação de risco mais fina e totalmente baseada em critérios ESG [ambientais, sociais e de governance].

Sobre o papel das instituições financeiras na economia verde, Miguel Maya defende que a banca “é a energia da economia”, mas tem de ser uma energia renovável e não um combustível fóssil do passado.O sistema financeiro está absolutamente sensibilizado para os temas da sustentabilidade. Há instituição que têm uma clara noção que isto é vital para a subsistência da banca e da sociedade. Temos responsabilidades acrescidas na alocação de recursos, temos de fazer boa triagem e aplicar bem os fundos disponíveis, senão dificilmente se consegue a transição necessária e urgente”, disse o CEO do Millennium bcp num debate em que participaram também João Wengorovius Meneses, secretário-geral do BCSD Portugal, António Martins da Costa, membro do Conselho de Administração Executivo da EDP, Francisco Veloso, diretor do Imperial College Business School e Isabel Ucha, CEO da Euronext Lisbon.

MIguel Maya sublinhou ainda a importância da emissão de green bonds (obrigações verdes), algo que o banco que lidera quer ajudar as empresas portuguesas a fazer. “Ainda não é verdade que se emita mais barato nas green bonds, mas podemos lá chegar. Se impuserem uma quota para obrigações verdes, só a procura do Banco Central Europeu já garante que o preço baixa”, diz o banqueiro.

Às empresas que se financiam junto dos banco deixa um aviso: “Muitas ainda olham a sustentabilidade como um tema de marketing e não como um modelo de negócio. As novas gerações não vão tolerar que as empresas não cumpram as suas obrigações. Aquelas que não se adaptarem deixarão de ser viáveis e vão desaparecer, prejudicando os bancos”.

Na abertura do debate, João Wengorovius Meneses, secretário-geral do BCSD, sublinhou a emergência climática que estamos já a enfrentar e a sexta extinção em massa na Terra em que estamos a entrar, a primeira desde o desaparecimento dos dinossauros. Por tudo isto, defende, “o que se espera das empresas e dos negócios está a mudar e manter a mesma lógica do século XX é economicamente arriscado. O business as usual é algo do passado e reformar profundamente o capitalismo é necessário e ainda possível. Esta é a década derradeira e as empresas têm de se guiar pelos critérios ESG. Basta ver que os cabazes de ações que desvalorizaram menos nos últimos meses foram aqueles em que os critérios ESG estão mais enraizados. Propósito e lucro, por esta ordem, é uma combinação vencedora”, disse o responsável.

Sobre as green bonds, diz que são um mecanismo de financiamento incontornável e lembrou que só este ano o BCE vai desbloquear 250 mil milhões de euros em obrigações verdes. “Qual é a cor do dinheiro? Será cada vez mais verde, mas até que ponto o setor financeiro está preparado para fazer a transição à velocidade que é necessário ela acontecer. O dinheiro vai ser mais verde mas a base ainda é pequena e estamos longe da magnitude de investimento necessário”, rematou.

Ainda no capítulo das obrigações verdes, e num dia em que a EDP anunciou que vai avançar com uma nova emissão de dívida verde, António Martins da Costa, membro do Conselho de Administração Executivo da elétrica lembrou que “os investidores estão à espera de empresas mais transparentes” e sublinhou as cinco emissões de dívida verde já realizadas pela EDP, no valor de 3,7 mil milhões de euros.

“80% das empresas de energia já reportam pelas práticas ESG. É todo um movimento junto de comunidade de investidores para que os critérios ESG sejam cumpridos. Há quem esteja nesta onda só porque é trendy, mas quem não estiver dentro está fora do mercado. É a sobrevivência das empresas que está em jogo. Existe uma relação entre quem põe em prática o ESG, redução do risco e o aumento do retorno”, disse Martins da Costa

A CEO da Euronext Lisbon, Isabel Ucha, sublinhou por seu lado que “as bolsas também têm estado a fazer o seu papel”, com uma reflexão sobre o que devia ser a revolução do mercado de capitais. “A nossa visão é de que todos os produtos financeiros, tudo o que pusermos no mercado, vão ter de adotar a sustentabilidade como parte do seu BI. Os investidores estão cada vez mais exigentes: dentro de um ano ou dois vão ter portfólios escrutinados”, frisou.

Em representação do meio académico Francisco Veloso, diretor do Imperial College Business School lembrou que “serão necessários entre três e quatro triliões de investimento para cumprir Acordos de Paris” e apelou ao sistema financeiro para interagir e dialogar com empresas e universidades. “Há um desafio enorme e grandes passos a ser dados. Não estamos ainda próximos do que precisamos para chegar às metas de Paris. Tem de haver um esforço de dar informação sobre os investimentos que são feitos pela banca e pelos mercados financeiros a toda a cadeia de valor envolvida. Isto vai ser exigido pelo BCE e será importante para credibilizar os agentes na tomada de decisão”, defendeu.

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