Grupo Dst ensina Aristóteles aos trabalhadores para aprenderem a ser melhores líderes
Grupo de engenharia e construção fechou parceria com Católica de Braga para ensinar e discutir obra de filósofos como Platão e Aristóteles. Objetivo? Evitar a má comunicação na "espuma dos dias".
Todas as quintas-feiras, José Teixeira reúne os integrantes do “leitura furiosa“, inspirado nas poetisas Regina Guimarães e Filipa Leal. No dia anterior, envia um texto aos participantes no “clube”: estes têm uns minutos, que coincide com a hora de início do expediente — às 9h –, para o lerem e, depois, para o discutirem.
A iniciativa, criada pelo presidente do conselho de administração do dstgroup, uma das maiores empresas nacionais do setor da construção e engenharia, é um exemplo da materialização do “lado literário” que o responsável vive e com o qual “contamina” os que o rodeiam. E uma forma de aproveitar da melhor maneira as 40 horas de formação por ano, obrigatórias para as empresas para com os seus trabalhadores.
Agora, meses depois do arranque do “leitura furiosa”, o grupo anunciou mais uma novidade: em parceria com a Universidade Católica de Braga, 350 quadros superiores da dst vão… estudar formação filosófica.
“Acabámos agora uma pós-graduação na faculdade de filosofia, na qual participaram 25 trabalhadores, sobretudo quadros superiores de vendas e de compras, dos quais ‘abdicámos’ todas as sextas-feiras durante um ano. Mas costumo dizer que não os perdemos, mas aproveitámos o que aprenderam”, conta o engenheiro José Teixeira, em conversa com a Pessoas, sublinhando que, considerando que os 350 lugares, escolhidos com base na antiguidade na empresa, foram muito concorridos. “O critério era ‘os mais antigos’ mas andamos há anos a falar de filosofia, de literatura, de teatro”, assinala.
A relação entre a Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais e a dst não é de agora. Ainda assim, este curso materializa o “movimento de saída” da própria universidade, que vai ao encontro do mundo empresarial”. “A Filosofia não tem merecido, por parte das diversas organizações, das empresas e das instituições, o acolhimento que lhe deveria ser dado. (…) No entanto, é a disciplina mais bem preparada para esta missão pedagógica. Uma empresa que se deixe impregnar pelo sentido crítico, pelo questionamento, pelas inquietações dos grandes filósofos e que, a partir deles, coloque as questões certas para cada problema, para cada desafio, produzirá, certamente, com outra qualidade e será uma empresa que contribuirá para transformar o nosso planeta num mundo mais humano, mais vivível, mais pacífico, mais feliz e habitável para todos”, sublinha José Manuel Martins Lopes, diretor da FFCS.
O principal objetivo é ensinar a fazer perguntas, para fugir da espuma dos dias. Ter diálogos com mais caracteres do que os que o Twitter admite, adotar uma linguagem que não seja a das redes sociais.
A empresa explica ainda, através de um comunicado, que o curso será “uma viagem através dos autores e dos filósofos mais representativos da história da filosofia, uma viagem de Heráclito a Sartre com estações em mais 30 filósofos”. “Costumo dizer que este é o caminho mais curto para aumentarmos a nossa competitividade: a cultura tem um poder na economia que os economistas e financeiros muitas vezes não conseguem ver”, assinala o engenheiro.
A leitura e o pensamento como deveres
“Nesta empresa, a leitura é um dever, e existe até uma espécie de censura social para quem não lê”, brinca o responsável. Setenta lições, todas sobre grandes filósofos que marcaram o tempo, os vários tempos da história: a apresentação breve do curso de formação filosófica é uma forma de resumir a ideia de ensinar filosofia aos quadros de maior responsabilidade dentro da empresa de construção. Mas, para quê?
“Na engenharia, sabemos como e o que fazer. O que faço, as pessoas sabem. Como faço, é visível. Mas, porque é que fazemos o que fazemos e como fazemos? É isto que tento explicar”, começa por assinalar o engenheiro. “O principal objetivo é ensinar a fazer perguntas, para fugir da espuma dos dias. Ter diálogos com mais caracteres do que os que o Twitter admite, adotar uma linguagem que não seja a das redes sociais. E, claro, ajudar a construir pontes”, justifica. O curso arranca, por isso, com Heráclito, considerado o “pai da dialética”. Seguem-se nomes como os de Platão, Aristóteles, Marco Aurélio, Santo Agostinho, Descartes, Rousseau, Marx, Nietsche e Popper, entre muitos outros.
“A filosofia serve para quebrar os monólogos que são ensurdecedores. O potencial está muitas vezes sem luz. E valorizar a nobreza de espírito, para percebermos o valor da ética e evitarmos a mineração da nossa reputação é muito importante. Temos regras, convenções, e temos de fazer não apenas o que é bom para nós mas sobretudo o que é bom para todos”, sublinha o presidente do conselho de administração da empresa fundada em 1984 e que conta com cerca de 1.600 trabalhadores.
José Teixeira acredita ainda que é este esforço de manter o pensamento vivo em todos os dias da empresa que ajuda a que, durante a pandemia, o grupo tenha conseguido integrar 370 novos trabalhadores. “A malta das obras sabe para que serve o martelo mas, às vezes, não sabemos bater na consciência, tomar as melhores decisões. Pretendemos continuar a defender a formação como um valor moral e a preocupação muito forte com a cultura (…) Foram admitidos 370 trabalhadores novos. É tudo sorte? É capaz de ter sido por decidirmos fundar uma empresa elástica, já que esta poesia faz parte da nossa economia”, sublinha José Teixeira.
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