Natal de Marcelo é um bom exemplo? Fomos perguntar a dois especialistas

O Presidente da República revelou que vai ter encontros faseados nas celebrações de Natal. Especialistas estão divididos: há quem diga que é "uma solução feliz", mas também quem discorde.

O Presidente da República apelou aos portugueses que “não estraguem” os progressos feitos no combate à pandemia durante o período de Natal, dando como exemplo o que vai fazer nesta época quadra festiva. Marcelo Rebelo de Sousa vai dividir as celebrações em quatro refeições, durante os dias 23, 24 e 26 de dezembro, pretendendo almoçar ou jantar com os diferentes agregados familiares em ocasiões diferentes e com um limite de cinco pessoas.

Em entrevista à TVI, o Presidente e candidato a um segundo mandato na corrida a Belém disse que no dia 23 de dezembro vai almoçar fora num restaurante com a família que vem do Brasil, mas garantiu que “como são ligeiramente mais do que cinco ficam em duas mesas espaçadas”. Ainda nesse dia, Marcelo Rebelo de Sousa vai jantar com os irmãos e cunhadas e são novamente cinco. Já na véspera de Natal, dia 24 de dezembro, o Chefe de Estado vai jantar “com parte da família, são cinco”, apontou. Para o dia de Natal, Marcelo não tem previstos quaisquer encontros familiares, mas no dia 26 de dezembro, como não é o Presidente que está a organizar “são sete”. “Não é em minha casa, estou com dúvidas sobre como vão arrumar a mesa”, atirou.

Admitindo que tenta “dar o exemplo” e apesar de o Governo não ter limitado o número de agregados familiares permitido nas celebrações de Natal, Marcelo Rebelo de Sousa sinaliza que “o ideal são cinco à mesa”, apelando a que os portugueses “não estraguem o que se está a fazer e os números que temos tido”. As declarações do Chefe de Estado dividem as opiniões dos especialistas ouvidos pelo ECO. Se há quem considere que este modelo “é uma solução feliz”, há também quem defenda que “não é o mais aconselhável”, dado que os contactos devem ser reduzidos ao máximo.

Ricardo Mexia avisa que o modelo seguido pelo Presidente da República “não é o mais aconselhável”, já que se tem aconselhado a que se reduza o “número de pessoas com quem interagimos”. E apesar de se tratar de ocasiões diferentes “na prática acabamos por interagir com um número relevante de pessoas”, aponta o presidente da presidente Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública (ANMSP), em declarações ao ECO.

“Vamos supor que somos 10 pessoas e uma delas está infetada. Se eu estiver primeiro com os cinco e até pode estar um dos infetados presente. No outro dia, vou estar com os outros cinco, e ainda que venha a adoecer, na prática não tenho tempo de ser infetado, desenvolver a doença e ter capacidade para a transmiti., E, portanto, neste cenário em que se reúnem cinco + cinco, potencialmente estou a infetar mais quatro.

Ricardo Mexia

Presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública

Nesse sentido, o especialista em saúde pública defende que os portugueses devem, por um lado, reduzir o “número de pessoas que se concentram em cada momento”, mas “também o número global” com quem interagem. Não obstante, admite que o desfasamento de encontros pode ser “útil”, desde que por via desse desfasamento “não se tente multiplicar” as interações.

Esta opinião vai ao encontro das recomendações emanadas pela Direção-Geral da Saúde, que referem que devem ser minimizados os contactos fora dos agregados familiares. Esta terça-feira Graça Freitas avisou que apesar de o Governo não ter avançado com um número de agregados familiares, esse deve ser “restrito ao núcleo mais chegado de amizades ou famílias”, nunca esquecendo as “três regras de ouro” com as quais os portugueses têm convivido diariamente, isto é, distanciamento social, higienização das mãos e etiqueta respiratória. “Mais do que o número de pessoas, o que interessa mesmo é que se cumpram as regras. Não há risco zero, mas diminuem muito em contrariar a doença”, disse a diretora-geral da Saúde.

Em contrapartida, Francisco George desdramatiza o facto de o Presidente da República se vir a encontrar com várias pessoas, ainda que em contextos distintos. O presidente da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) e antigo diretor-geral da Saúde considera que este modelo é uma “solução feliz”, admitindo que vai segui-la. “É uma entre outras possibilidades. Eu mesmo vou seguir esse modelo, que é um modelo de estar um dia com uns um dia com outros, nomeadamente com a minha filha num determinado momento e noutro momento distinto com o meu filho. E outro mesmo com os meus irmãos, exatamente como descreveu o Presidente”, revela.

Qual é a diferença entre ter encontros faseados ou não?

Mas, afinal, qual é a diferença entre reunir com os familiares de forma desfasada ou numa mesma ocasião? “Vamos supor que somos 10 pessoas e uma delas está infetada. Se eu estiver primeiro com os cinco e até pode estar um dos infetados presente. No outro dia, vou estar com os outros cinco, e ainda que venha a adoecer, na prática não tenho tempo de ser infetado, desenvolver a doença e ter capacidade para a transmitir. E, portanto, neste cenário em que se reúnem cinco mais cinco potencialmente estou a infetar mais quatro. Se tiverem os 10 todos juntos eu potencialmente estou a infetar mais nove”, explica, o presidente da ANMSP.

Ao contrário do Chefe de Estado, Ricardo Mexia prefere não avançar com um “número mágico” quando ao número de agregados familiares, dado que considera ser “relativo”, variando de família para família. Ainda assim, reforça que é importante que as pessoas tenham “perceção” dos riscos, justificando que a “situação está longe de estar ultrapassada” e chamando a atenção para o agravamento da situação epidemiológica em diversos países europeus que poderá estar relacionada com a nova variante da Sars-Covid-2 detetada no Reino Unido e que já se espalhou por vários países.

Já Francisco George sublinha que o “problema central “está na aglomeração em ambientes fechados de mais do que cinco pessoas”, justificando que é mais fácil fazer cumprir as regras de prevenção “com este modelo do que com muita gente”. Ainda assim, o presidente da CVP alerta que “há cuidados” que podem ser tomados, dando como exemplo o desfasamento “da hora das refeições e das bebidas“, bem como “usar máscara enquanto o outro come”. Além disso, Francisco George aconselha a que a ventilação dos espaços seja sempre mantida. “É bom manter a ventilação sempre em permanência, em equilíbrio com a temperatura ambiental”.

Por fim, Ricardo Mexia refere ainda que uma boa comunicação “é essencial” nesta altura para que os portugueses percebam os riscos que correm, temendo, por isso, que o exemplo do Chefe de Estado seja mal interpretado pela população.

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