Economistas antecipam confinamento menos doloroso para a economia

Os economistas consultados pelo ECO consideram que não se vai repetir a hecatombe de março e abril no PIB. As empresas e os consumidores estão mais preparados e já sabem que a situação é temporária.

Vem aí um novo confinamento “próximo” do de março e abril, mas o impacto económico será mais baixo. Os economistas consultados pelo ECO consideram que já não se deverá aplicar a contração de 6,5% do PIB por mês de confinamento que foi estimada pelo então ministro das Finanças, Mário Centeno, uma vez que, quase um ano depois, as empresas e os consumidores estão mais bem preparadas preparados para enfrentar esta situação, os apoios estão no terreno e há a perspetiva de que será passageiro.

“O ministro das Finanças provavelmente não estaria muito longe da realidade quando fez a estimativa que refere”, responde ao ECO José Maria Brandão de Brito, economista-chefe do BCP, referindo os “cerca de 45 dias de confinamento mais agressivo” que o país viveu e que “o PIB em 2020 deverá cair em torno de 8%”. Contudo, “as contas, neste momento, serão bem diferentes”, antecipa, afirmando que o “impacto no PIB deste novo confinamento será muito menor do que se verificou na primavera”. “O impacto económico deverá ser menor que o conjeturado por Mário Centeno no ano passado, já que os pressupostos na altura também eram outros, de uma maior rigidez”, concretiza Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa.

A mesma opinião é partilhada por Rui Constantino, economista-chefe do Santander, e Paula Carvalho, economista-chefe do BPI/CaixaBank. Recordando que em 2020 o confinamento foi “em simultâneo” e com o encerramento de fronteiras, Constantino prevê uma queda de 6 a 7% do PIB em cadeia no primeiro trimestre (face ao quarto trimestre), o que compara com uma quebra em cadeia de 13,9% no segundo trimestre de 2020. “O efeito na economia será bem menos grave que no período de março-abril de 2020“, diz Paula Carvalho, sem avançar, para já, com números.

Em termos homólogos, a previsão do Santander aproxima-se de uma queda de 10%, mas é preciso recordar que o primeiro trimestre de 2020 (com o qual compara o primeiro trimestre de 2021) ainda foi muito pouco afetado pela pandemia. “Trata-se, contudo, de uma estimativa inicial, pois há alguns fatores de incerteza, como a duração do confinamento e a adoção de medidas similares noutros países europeus”, alerta Rui Constantino.

Já a economista do BPI/CaixaBank prevê que “este novo confinamento, que não se previa, terá um impacto negativo, mas relativamente contido nas previsões de crescimento para o ano“, uma vez que antecipa uma recuperação “mais forte” no segundo semestre com a aceleração do processo de vacinação. Ainda assim, a expectativa é que o primeiro trimestre mantenha a contração da economia que se prevê que tenha acontecido no quarto trimestre.

O que mudou?

Os economistas apresentam várias justificações para argumentarem que o impacto na economia não terá a mesma dimensão. Desde logo, há uma questão puramente matemática: o PIB já caiu bastante em 2020 pelo que o ponto de partida é mais baixo. “Sabemos que um dos setores mais afetados é o turismo, mas depois das quedas agressivas que sofreu, o turismo já dificilmente contribui para quedas adicionais significativas do PIB, dado que o seu peso na economia diminuiu drasticamente“, exemplifica José Maria Brandão de Brito.

Mas há outras razões. Se em março o mundo foi apanhado de “surpresa”, sem saber exatamente como reagir, a aprendizagem e as ações desde então permitem encarar este período de forma diferente, a começar pelas ajudas estatais. Paula Carvalho destaca “os enormes apoios à atividade económica por via das medidas de suporte orçamental, a política de taxas de juro muito baixas do BCE e de compra de dívida e as moratórias de dívida de famílias e empresas”. “Têm sido bastante eficazes na mitigação dos efeitos económicos negativos da pandemia“, acrescenta o economista-chefe do BCP. Ainda esta quinta-feira o Governo anunciou o reforço de vários apoios e é expectável que o Banco Central Europeu (BCE) aumente os estímulos monetários numa próxima reunião.

Do lado das empresas, Rui Constantino identifica uma “adaptação” à nova realidade que, apesar de não compensar totalmente, permite amparar o impacto. Exemplo disso é o aumento do comércio online, a maior utilização dos serviços à distância através da tecnologia e o take away na restauração, por exemplo. “A economia e a sociedade são organismos vivos que se adaptam às circunstâncias, por mais difíceis que estas sejam”, argumenta José Maria Brandão de Brito, dando o exemplo da “transferência de consumo que as famílias fizeram de serviços (turismo, lazer, etc) para bens, provocando uma rapidíssima recuperação do setor industrial mundial”.

E depois há o próprio conhecimento do vírus, das formas de proteção e a “perspetiva de que este seja um confinamento temporário”, diz Paula Carvalho, sendo que a confiança aumentará à medida que a vacina for administrada a cada vez mais pessoas. A economista do BPI/CaixaBank recorda que “há setores que continuam a trabalhar em pleno (ou quase) como é o caso da construção e alguma indústria“, antecipando que o “comportamento favorável” das exportações “irá possivelmente continuar”. Neste caso, o confinamento será próximo do de março, mas terá mais exceções, como é o caso dos dentistas e das escolas que continuarão abertas, por exemplo.

Esta resiliência da economia e da sociedade confere uma maior capacidade de absorção dos choques negativos que emanam da situação sanitária“, conclui o economista-chefe do BCP. A mesma conclusão é tirada por Paulo Rosa que diz que “as atuais regras são menos rígidas, mas caso fossem idênticas a penalização da economia seria sempre menor que na primavera passada”. “Há uma diminuição dos receios da população em relação à covid-19 e uma cabal adaptação ao novo ‘normal’ que reduzem o impacto económico”, argumenta.

Impacto será menor, mas empresas vão sofrer

Apesar da avaliação macroeconómica ser mais favorável do que em março, os economistas admitem que as empresas vão sofrer com este confinamento, consoante o setor. “Certamente que este novo confinamento não vai contribuir favoravelmente para a condição financeira das empresas nas áreas mais afetadas“, assume José Maria Brandão de Brito. Para Paula Carvalho, “o impacto desta vaga dependerá mais uma vez das empresas e do setor”.

Mas ambos têm uma visão mais otimista do que catastrofista. “Não será uma tragédia, sobretudo devido aos apoios de natureza orçamental e às moratórias, que permitirão a muitas empresas em dificuldades sobreviver e manter o emprego”, diz o economista-chefe do BCP, ainda que admitindo que “outras empresas naturalmente sucumbirão“. Tudo dependerá da rapidez da situação: “A viabilidade de algumas empresas poderá depender do sucesso da campanha de vacinação e da conquista da imunidade de grupo o mais rápido possível, no contexto da atual situação de agudização da pandemia”, antecipa Paulo Rosa, do Carregosa.

Já a economista do BPI recorda que “cerca de 50% das empresas recorreram a alguma forma de apoio” no ano passado e que agora estes apoios estão “na sua maioria operacionais”, o que facilita o seu acesso. “Finalmente, também para as empresas o facto de esta ser uma situação provisória e com fim esperado à vista, significará provavelmente que o impacto no investimento não será tão negativo”, prevê Paula Carvalho. Este é aliás um indicador, o do investimento, que poderá permitir perceber como estão a reagir as empresas. Mas também aqui haverá grandes diferenças setoriais. Tal como recorda Paula Carvalho, a componente a componente de investimento “foi das que mais surpreendeu positivamente” em 2020.

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