Governo diz que é “importante clarificar” alteração que o Parlamento fez ao apoio aos recibos verdes

Há dúvidas sobre como interpretar a alteração feita pelo Parlamento ao apoio aos independentes. Governo alerta para potenciais injustiças e apela a clarificação por parte dos deputados.

A alteração ao apoio aos trabalhadores independentes aprovada, no Parlamento, pela oposição está a gerar dúvidas. O diploma em causa dita que a ajuda passe a ser calculada com base no rendimento médio anual mensualizado de 2019, quando até aqui era considerado a base de incidência contributiva dos 12 anteriores ao pedido. O Governo entende que, com esta alteração, o apoio passa, então, a ser igual à faturação e não ao rendimento relevante para a Segurança Social, mas os deputados garantem que a intenção foi apenas mudar o ano de referência e não avançar com uma alteração estrutural. A ministra do Trabalho defende, por isso, que é importante “clarificar a intenção” dos partidos.

À revelia do PS, os deputados aprovaram, no início do mês, a alteração da base do cálculo do apoio à redução da atividade dos trabalhadores independentes, determinando que não deve ser considerada para esse fim a média da base de incidência contributiva dos 12 meses anteriores ao pedido, mas o rendimento médio anual mensualizado do trabalhador no ano de 2019.

Uma vez que nos últimos 12 meses estes profissionais viram as suas atividades prejudicadas pela pandemia e pelas restrições impostas para a conter, esta alteração ao desenho do apoio significa que, em alguns casos, a Segurança Social terá de passar a transferir valores mais elevados para os beneficiários, têm defendido os partidos da oposição.

O Governo sublinha, contudo, que esta alteração tem uma outra consequência, que pode gerar injustiças entre os beneficiários. Segundo explicou, esta terça-feira, Ana Mendes Godinho, numa audição parlamentar, até aqui tinha sido considerado para o cálculo a base de incidência, que não corresponde ao total da faturação, mas ao rendimento relevante a partir do qual se apuram as contribuições a pagar à Segurança Social. No caso da prestação de serviços, o rendimento relevante equivale a 70% da faturação. Já no caso da venda de bens, corresponde a 20%. Tal significa que trabalhadores com faturações iguais podem ter de fazer descontos diferentes, uma vez que o rendimento considerado nesse cálculo é diferente.

Ao considerar como ponto de partido a base de incidência, o apoio tinha sido sensível até aqui a essas nuances, prevendo uma transferência maior para quem tenha feito contribuições sobre uma parte maior da sua faturação. A alteração feito pelo Parlamento, entende o Governo, vem eliminar essa sensibilidade, ao substituir a base de incidência pelo rendimento médio anual mensualizado de 2019.

Diz o Executivo que isso significa que deve ser considerado, no apuramento do apoio, o total da faturação de 2019, desligando a prestação na íntegra das contribuições feitas para a Segurança Social. Tal implica uma mudança “total na fórmula de cálculo e no sistema informático”, alertou a ministra do Trabalho, esta terça-feira, sublinhando que há mesmo situações em que a Segurança Social não dispõe dos dados necessários para aplicar essa alteração, nomeadamente nas situações em que há contabilidade organizada.

Na mesma audição, o deputado José Soeiro, do BE (partido do qual partiu a proposta da alteração em causa) defendeu, contudo, que não está em causa “nenhuma alteração estrutural do sistema”, uma que o “Parlamento não alterou decreto original onde se estabelecem as fórmulas de calcular os rendimentos“, mas apenas “fez remeter o rendimento de referência para 2019. “Por isso, não há nenhuma alteração estrutural nas regras de aferição do rendimento relevante, apenas uma alteração do ano de referência”, assegurou.

Também João Almeida, do CDS-PP (partido que também votou a favor desta alteração), entende que, “da parte do Parlamento, não houve nenhuma alteração das fórmulas de cálculo“, mas somente a mudança do ano de referência.

Tudo somado, a ministra do Trabalho salientou que, sendo essa a interpretação dos deputados, é “importante clarificar” qual é, afinal, a intenção do diploma que recebeu “luz verde” do BE, PCP, PSD, CDS, PAN, IL e CH. “São dimensões técnicas completamente diferentes, que têm um impacto brutal e implicações determinantes na aplicação” do apoio, frisou Ana Mendes Godinho.

A propósito desta alteração ao apoio à redução da atividade, a ministra do Trabalho adiantou, também, que os meses de janeiro e fevereiro foram, respetivamente, o segundo e o terceiro meses com apoios médios mais altos desde março de 2020. Aliás, no mês de fevereiro, 38% dos beneficiários receberam o valor mínimo, tendo sido, portanto, o segundo mês com a percentagem mais baixa de trabalhadores a receber esse montante. Logo, disse a ministra, se a intenção do Parlamento for mesmo só mudar o ano de referência, haveria trabalhadores que poderiam ficar a receber menos. Ainda assim, essa clarificação agilizaria a operacionalização, afirmou a mesma.

O apoio à redução da atividade dos trabalhadores independentes varia entre 291,4 euros e 665 euros. A alteração à base do cálculo desta medida foi promulgada por Marcelo Rebelo de Sousa, apesar das críticas do Governo (que já anunciou que irá enviar o diploma para o Tribunal Constitucional), mas ainda não foi publicada em Diário da República, pelo que ainda não está em vigor.

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