Portugueses teriam de pagar mais 22% de impostos para manter pensões intactas
Para se reformarem na mesma idade e com o mesmo valor no longo prazo, os portugueses teriam de pagar mais 22% de impostos de forma a que houvesse sustentabilidade orçamental.
No longo prazo, para manter a sustentabilidade orçamental e os mesmos benefícios ao nível de pensões, os portugueses teriam de pagar mais 22% de impostos todos os anos e indefinidamente por causa do envelhecimento estrutural da população nas próximas décadas. Esta é uma das muitas conclusões do estudo “Finanças Públicas: Uma Perspetiva Intergeracional” da Fundação Gulbenkian, através do Fórum Futuro e da Iniciativa da Justiça Intergeracional, que analisou as implicações do envelhecimento na sustentabilidade das contas públicas e nos custos e benefícios das políticas públicas para as diferentes gerações.
O estudo, elaborado pelos economistas Francesco Franco, Luís Teles Morais, Tiago Bernardino e João Tovar Jalles, que contaram com a revisão (peer review) do economista Ricardo Reis, identifica uma insustentabilidade estrutural na forma como o sistema está estabelecido neste momento: “O perfil etário dos impostos e benefícios é estruturalmente inconsistente com a fecundidade e esperança de vida observadas”, escrevem os autores, garantindo que nem cenários “mais otimistas de crescimento económico” vão dissipar esta “inconsistência”.
Isto é, com o aumento da esperança de vida esperado para as próximas décadas, a forma (e o valor) como o Estado cobra impostos e distribuiu os benefícios não é sustentável em termos orçamentais, o que cria problemas de redistribuição de recursos entre gerações. “Se as finanças públicas não forem sustentáveis, as famílias no futuro serão obrigadas a pagar mais impostos, receber menos benefícios ou desfrutar de menos serviços públicos“, recorda o estudo.
Traduzindo isto para números, e aplicando o atual perfil etário de receitas e despesas (os impostos e os benefícios que se recebem atualmente ao longo da vida), um indivíduo médio em Portugal é um beneficiário líquido (recebe mais do que pagou) em 150 mil euros na sua relação com o Estado. “Essa inconsistência é exacerbada pelo aumento da esperança de vida no futuro”, notam os economistas. Para garantir a sustentabilidade, há duas opções: redimensionar as receitas e as despesas ou mudar a dinâmica etária da população. Comecemos pelo primeiro.
No caso específico das pensões, para assegurar uma sustentabilidade permanente, os autores concluíram que os portugueses teriam de pagar mais 22% de impostos todos os anos e indefinidamente, o que equivalia a mais 16 mil milhões de euros em 2017, o ano de referência dos dados usados neste estudo. Com esta subida, a carga fiscal global passaria de 37% do PIB para quase 45%. Só assim é que os portugueses poderiam, no longo prazo (com o aumento da esperança média de vida), gozar dos mesmos benefícios que existem atualmente, ou seja, a mesma idade de reforma e o mesmo nível de pensão. Caso contrário, o Estado teria um “grande e permanente” défice orçamental, o que se tornaria insustentável.
Também se pode olhar para este problema pelo lado da despesa do Estado, isto é, dos benefícios que recebem os contribuintes. Neste caso, a despesa teria de descer 19% — o que teria implicações nos benefícios recebidos — para que o nível de impostos fosse estável e para que as contas públicas fossem sustentáveis. “Este é um ajustamento bastante grande”, admitem, o qual só seria alcançado com um aumento significativo da idade da reforma nas próximas décadas — aumentando os anos de contribuição ao longo da vida e reduzindo os anos que se recebe pensão — e com uma redução do valor médio da pensão atribuída.
De uma forma ou de outra, alcançar a sustentabilidade orçamental no longo prazo terá efeitos no equilíbrio geracional. Caso os impostos aumentem 22% neste momento, todas as gerações seriam afetadas, mas o aumento maior iria recair nas idades mais jovens “já que a maioria dos impostos (e todas as contribuições sociais) são pagos durante os anos de trabalho”, explicam. Por exemplo, no caso das gerações nascidas em 1992-1997, “isto mais do que duplica o seu pagamento líquido remanescente em vida, que seria perto de 200,000” euros, para o mesmo nível de benefícios.
O estudo assume que as “as medidas necessárias para recuperar a sustentabilidade orçamental têm efeitos distributivos entre as várias gerações“, cuja avaliação deixa para um estudo posterior. Mas admite que, neste momento, tal significa que “os indivíduos que se reformarem no futuro, vão receber benefícios menores”, se as políticas já legisladas (como o aumento automático da idade da reforma com base na evolução da esperança média de vida) forem completamente implementadas no futuro. Isto permitirá anular parte dos desequilíbrios orçamentais futuros induzidos pelo envelhecimento, mas significará que a idade da reforma será de 76 anos em 2036, de acordo com as simulações deste estudo.
Imigração ou mais filhos não resolvem problema
A segunda opção passa por tentar mudar a dinâmica da população. Mas será possível? Se está a pensar que aumentando a fecundidade ou a imigração Portugal conseguirá resolver este problema, pense duas vezes. Os economistas admitem que ter mais filhos ou a entrada de mais imigrantes colmata parcialmente o desequilíbrio no médio prazo, mas no longo prazo o problema estrutural mantém-se: o sistema atual de proteção social é “estruturalmente inconsistente” com o aumento da esperança média de vida previsto para as próximas décadas.
“Num cenário de elevada imigração, as receitas aumentam no médio prazo (horizonte de 30 anos), mas não o suficiente para compensar as despesas mais elevadas induzidas pelo envelhecimento”, assinalam, referindo que “os jovens imigrantes de hoje também irão envelhecer“. Ou seja, esta estratégia até pode mitigar o impacto orçamental do envelhecimento no médio prazo, mas não resolve “a incompatibilidade estrutural entre o orçamento do Estado de hoje e a estrutura etária da população a longo prazo“.
No caso da fecundidade, a conclusão é semelhante: “A promoção da fecundidade pode ser importante para controlar a evolução da população total. Contudo, dentro de valores razoáveis, não impede o envelhecimento“, escrevem os autores.
Em suma, “esta incompatibilidade faz com que seja inevitável existirem políticas que alterem o perfil etário dos impostos e benefícios“. Este diagnóstico realizado pelo estudo não é acompanhado por propostas — não era esse o objetivo –, mas a Fundação Gulbenkian desafiou várias universidades a pensarem sobre o assunto e a avançarem com soluções para serem implementadas no país.
Este é um debate recorrente em Portugal e ao longo dos anos têm sido introduzidas mudanças legislativas tendo em vista a sustentabilidade orçamental futura, mas com implicações nos efeitos distributivos entre gerações, como notam os autores deste estudo: “As políticas já em vigor sobre o sistema de pensões são suficientes para assegurar o equilíbrio orçamental. Resta saber se são justas para as diferentes gerações e se são politicamente sustentáveis – não o sendo, permanece em aberto a questão de quais serão as políticas alternativas mais adequadas“, concluem.
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