PIB vai disparar no segundo trimestre, mas não é certo que cresça 5% no ano
Após um primeiro trimestre dramático, a economia portuguesa prepara-se para crescer a dois dígitos em termos homólogos no segundo trimestre. A dúvida mantém-se quanto ao valor anual.
Os economistas não têm dúvidas: a economia portuguesa vai crescer significativamente no segundo trimestre, seja pela retoma da economia com o desconfinamento, seja pelo efeito da base muito baixa do ano passado. O número em concreto será divulgado esta sexta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) na estimativa rápida, mas as atenções estão já no futuro: será que o PIB conseguirá crescer 5% no conjunto do ano, como sugeriu o ministro das Finanças?
As previsões para o segundo trimestre vão de um crescimento em cadeia de 3,3% (Comissão Europeia) até 8% (valor mais alto do intervalo do Fórum para a Competitividade), com o BCP a apontar para 4,1%, a Católica para 5% e o ISEG para 5,5%. Os economistas, assim como o Banco de Portugal, consideram que este nível de crescimento será suficiente para compensar a queda do primeiro trimestre, devido ao segundo confinamento, em que Portugal se destacou pela negativa como o pior país da União Europeia.
“O segundo trimestre deverá ter sido o melhor, em nível, desde o início da pandemia e confinamentos, pelo que, em cadeia, deverá ter compensar a queda do primeiro trimestre“, antevê João Borges de Assunção, da Católica, ao ECO. António da Ascensão Costa, do ISEG, confirma que “pode compensar parcialmente no caso de procura adiada que é deslocada de um trimestre para outro”, mas alerta que “a compensação nunca é total” porque há produção que se perde e não é recuperável, principalmente nos serviços.
“De acordo com os dados parcelares que fomos recolhendo, sim, deverá mais que compensar“, confirma Paula Carvalho, economista-chefe do BPI/CaixaBank, notando que há vários indicadores, nomeadamente o investimento na construção ou a exportação de bens, que já crescem face a 2019.
PIB afundou há um ano no início da pandemia
Em termos homólogos, a subida será de dois dígitos, ficando entre os 14,5% a 15,5%, segundo as previsões. Estes valores expressivos são bastante influenciados pelo segundo trimestre de 2020, o pior trimestre da pandemia em que o PIB afundou 16,3%. Se se confirmar o crescimento de 15,5% no segundo trimestre, a economia portuguesa deverá ficar a operar a cerca de 95,5% do nível do quarto trimestre de 2019, de acordo com os cálculos da Católica. Ou seja, o PIB estará ainda 4,5% abaixo do nível pré-pandemia, sendo que a recuperação total só deverá acontecer no próximo ano.
Qual é o motor desta retoma entre abril e junho? “A recuperação da economia portuguesa deverá refletir um forte aumento da procura doméstica, impulsionada pelo consumo privado, na sequência do levantamento das medidas restritivas a partir de março, bem como pelo investimento, que deverá ter acelerado, num contexto de antecipação de projetos associados à execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e de forte dinamismo do setor da construção”, antecipavam os economistas do BCP na nota de conjuntura divulgada na semana passada. As exportações também deverão dar um contributo positivo, mas este é “condicionado” pela “fraca retoma do turismo no segundo trimestre”.
A dúvida está agora na evolução do terceiro trimestre — por causa da reversão de parte do desconfinamento no final de junho devido ao agravamento da pandemia — e no valor anual do crescimento do PIB. Nas últimas semanas, o ministro das Finanças, João Leão, mostrou-se otimista com a possibilidade de Portugal chegar a um crescimento de 5% e o Banco de Portugal atualizou a sua previsão para 4,8%, mas logo depois a Comissão Europeia — já tendo em conta o aumento de casos por causa da variante Delta — meteu os travões no entusiasmo ao manter a previsão de 3,9% para Portugal, ao mesmo tempo que reviu em alta o crescimento da Zona Euro.
Segundo semestre será bom, mas não se sabe se é suficiente para chegar aos 5%
Se por um lado a reversão parcial do desconfinamento veio resfriar as expectativas, a aceleração do processo de vacinação veio trazer mais otimista numa possível “libertação total da sociedade” no final do verão, tal como previu o primeiro-ministro. Os economistas não dão ainda por garantido um crescimento de 5%, mas também não o afastam completamente.
Desde logo, a reversão parcial do desconfinamento no final de junho não parece estar a afetar tanto a economia quanto se poderia temer. “Há alguns sinais de que a reversão do desconfinamento está a ter alguns custos na atividade económica“, admite João Borges de Assunção, acrescentando logo de seguida que, “por enquanto, parecem ser relativamente pequenos”.
António da Ascensão Costa partilha da opinião de que afetará, “mas não muito” dado que as “restrições não implicaram encerramentos totais e a generalidade da atividade económica não foi afetada”. “Afetará mais a intensidade dessa retoma do que a sua existência“, resume. Também Paula Carvalho corrobora a ideia de que possa ter “limitado o potencial de expansão no 3º trimestre, dado o impacto sobretudo no turismo não residente”.
E parece não haver razões para duvidar do dinamismo da retoma — ainda que alguns indicadores estejam a travar (o que também é influenciado pelo crescimento da base de 2020 à medida que o ano avança) –, dado que até a própria Comissão Europeia (normalmente mais conservadora) vê o PIB português com a segunda maior taxa de crescimento no verão.
Os economistas do BCP acreditam que no segundo semestre “a trajetória de recuperação deverá prosseguir, suportada pelos elevados níveis de poupança das famílias, pela expansão do investimento público e privado, por via do PRR, bem como pelo dinamismo da procura externa”. O alívio das medidas determinado pelo Conselho de Ministros desta quinta-feira também poderá dar mais motivos para se olhar para o futuro com menos incerteza.
Perante este panorama, é possível já dizer que o PIB vai crescer 5% em 2021? “O valor é possível, mas, para já, considero mais provável um valor perto de 4%, sobretudo devido a uma retoma lenta do setor turístico e alguns estrangulamentos da oferta mundial“, considera António da Ascensão Costa, relembrando que “a própria crise sanitária ainda não está totalmente controlada e ainda poderá introduzir alguma areia na dinâmica da recuperação”, com os surtos de casos a continuar a ter “impacto negativo na produção”.
“Não é impossível”, admite Paula Carvalho, recordando que a previsão do BPI/CaixaBank continua a apontar para os 4%. “Todavia o grau de incerteza permanece elevado, havendo riscos em ambos os sentidos”, nota.
Ressalvando que o “ambiente económico continua a ser de incerteza invulgarmente elevada”, João Borges da Assunção considera que “um crescimento de 5% é possível desde que não haja condicionamentos excessivos, nem em Portugal nem nos principais países da União Europeia“. Essa é a expectativa dos economistas do BCP que apontam para um crescimento de 5,2%, ainda que reconhecendo o risco da “recuperação da atividade turística, que poderá revelar-se mais demorada, sobretudo em caso de necessidade de reintrodução de restrições à mobilidade”.
Oficialmente, o Governo ainda mantém a previsão de 4% para o PIB de 2021 inscrita no Programa de Estabilidade de abril. Contudo, nas últimas declarações Leão tem apontado para 5%, ainda que a propagação da variante Delta tenha trazido mais incerteza. Em outubro, quando apresentar o Orçamento do Estado para 2022, o Executivo deverá atualizar novamente a previsão, nesse momento já com mais informação sobre o que foi o terceiro trimestre (entre julho e setembro) e como será o quarto trimestre.
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