Há razões ponderosas para alterar a LAP?

  • Fernanda de Almeida Pinheiro
  • 15 Outubro 2021

Há razões ponderosas para que se altere a LAP, no entanto este PL aponta soluções que chocam com a autonomia, funcionamento e autorregulação das APP, que não são aceitáveis.

Está em discussão a Proposta de Lei (PL) do Grupo Parlamentar do Partido Socialista (GPPS) com o número 974/XIV/3ª, para alterar a Lei nº 2/2013, de 10 de janeiro, (LAP) e a Lei 53/2005, de 2015, de 11 de junho (LFSPSAPP).

As maiores questões que existem neste PL são as profundas alterações propostas para o futuro Órgão de Supervisão (OS), a duração dos estágios e a obrigatoriedade da sua remuneração, a figura do Provedor dos Destinatários dos Serviços (PDS) e a criação das sociedades multidisciplinares.

Se nada temos a opor à integração de membros não inscritos (MNI) nos órgãos disciplinares e de avaliação, o mesmo já não se passa com a possibilidade do primeiro ser composto por uma maioria de não Associados/as. De igual modo a proposta de número de membros que deve integrar o OS (7) é manifestamente insuficiente, não sendo possível exigir a 6 pessoas e ao PDS (que por via das suas atribuições, nem sequer poderá intervir em matéria disciplinar de recurso), que garantam todo o enorme trabalho que compete à supervisão de uma APP.

Para além disso o PL quer que o OS passe a ser eleito pela Assembleia Representativa (AR) que exerce o poder disciplinar, por maioria qualificada de 2/3, deixando a sua escolha de ser feita por sufrágio direito e universal. Esta solução apenas fará sentido se for aplicada a MNI. Os membros inscritos (MI) da APP devem continuar a ser eleitos por votação e após as eleições decidem, em conjunto com a AR (por maioria qualificada de 2/3), quem serão os MNI que devem integrar o OS.

Quanto aos estágios, o PL andou bem ao propor a exclusão de matérias já lecionadas, porém o mesmo já não se dirá da redução do estágio de 18 para 12 meses. Um ano é manifestamente insuficiente para o/a candidato/a apreender o exercício de profissões tão exigentes.

Outra questão é a remuneração dos estágios. É evidente tal pagamento não poderá ser exigido a quem promove o mesmo, que já tem a seu cargo a formação prática do/a candidato (dispondo do seu tempo e dos seus meios), devendo ser gizada uma solução de financiamento público do estágio (sempre feita à medida de cada profissão). Sem a criação de financiamento do estágio, irão colocar-se problemas muitos sérios aos candidatos a estágios de advocacia, solicitadoria e AE (especialmente para aqueles que não residem nos grandes centros urbanos), já que a maioria dos profissionais exerce em prática individual e não consegue garantir essa remuneração, optando por deixar de patrocinar estágio.

A escolha e nomeação do PDS prevista no PL coloca inúmeras questões a nível da autonomia das APP. Se o objetivo da lei é reforçar a autonomia, não é com um modelo de nomeação de PDS (que passa a ser obrigatório e remunerado pelos associados), a partir da escolha de 3 nomes indicados pela entidade pública responsável pela defesa do consumidor, que se vai alcançar tal desiderato. Esta proposta significa uma ingerência direta e inadmissível do Governo na vida das APP, porque o PDS tem assento no OS, sendo uma das suas atribuições “controlar a conformidade estatutária e regulamentar da atividade exercida pelos órgãos da associação”. Essa indicação (se passar a ser obrigatória), poderá seguir a solução que acima propomos para alguns dos membros OS, mas não poderá vingar nos moldes indicados no PL.

O PL procura também abrir caminho à multidisciplinaridade, tema que é muito controverso, por via das regras deontológicas que impendem sobre as profissões, e bem assim as incompatibilidades múltiplas que existem (com especial incidência para as questões da Advocacia). Ainda assim, a ausência de regulamentação desta realidade (que já existe), é muito mais perigosa para os profissionais e clientes, do que a criação regulada desta nova forma de exercício das profissões, bastando que se encontre uma solução que garanta o respeito pelas normas deontológicas de cada APP, como sucede em tantos países da União Europeia.

A proposta de alteração das regras de vinculação do referendo (art 21º da LAP), é possível que esteja relacionada com o referendo da OA deste ano. A este respeito diremos apenas que participaram no referendo da OA mais de 50% dos Associados e a resposta ganhadora granjeou 53% do total dos votos. Não podemos concordar com regras limitativas da expressão democrática nas APP, porque este instrumento é o único que permite apurar qual o sentido da vontade soberana dos/as Associados/as sobre temas chave das profissões, quando esta colide com a dos órgãos eleitos, devendo deixar-se a regulação destas matérias nas mãos das APP.

Uma alteração que merece o nosso total aplauso é a do ponto 13 do artº 15º, que exige que passe a ser promovida a igualdade entre homens e mulheres na composição das listas candidatas a órgãos.

Há razões ponderosas para que se altere a LAP, no entanto este PL aponta soluções que chocam com a autonomia, funcionamento e autorregulação das APP, que não são aceitáveis.

  • Fernanda de Almeida Pinheiro
  • Vice-Presidente da APAPI-ADV

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