Missão da Base Aérea de Monte Real inclui proteger ambiente

  • Lusa
  • 29 Novembro 2021

A Base Aérea n.º 5 (BA5), em Monte Real, de defesa nacional do território português, foi galardoada com o Prémio de Defesa e Ambiente.

A missão da Base Aérea n.º 5 (BA5), em Monte Real, de defesa nacional do território português, inclui a proteção ambiental e gestão dos recursos do planeta, fatores que são também razão de conflitos

“Apesar de à primeira vista o domínio do ambiente e o setor da Defesa parecerem dois conjuntos independentes, na verdade estão muito relacionados. Há algum tempo que existem conflitos a nível mundial, que são desencadeados por falta de recursos”, adiantou o responsável pelo ambiente na BA5, tenente Filipe Delgado, à agência Lusa.

O militar recordou que existe “talvez o mais emblemático [conflito] entre Palestina e Israel pela disputa da água”, mas também se regista “em toda a África subsaariana e em alguns pontos na Ásia”.

“Ou seja, já existe e, infelizmente, cada vez mais, a tendência será haver mais conflitos ainda, mas já há alguns conflitos que têm na sua génese a disputa de recursos”, reforçou.

Portanto, constatou Filipe Delgado, “ambiente e defesa estão ligados”.

“Cabe-nos ter essa consciência e assumir que para se garantir a defesa nacional, que é a nossa missão primária, temos, sem dúvida alguma, de incluir a defesa do ambiente. Só assim é que conseguimos cumprir nossa missão na íntegra”, acrescentou.

O comandante da BA5, João Vicente, disse a Lusa que, “desde 2010, que a FA tem demonstrado preocupação nas áreas ambientais”.

“Como a missão que nos está atribuída obriga que nós voemos e enquanto não houver uma solução tecnológica para resolver o problema ambiental associado à aviação, o que nos focamos é na parte terrestre e apoio à operação. Aí há uma grande área onde podemos melhorar. Somos uma base aérea de aeronaves de combate, mas também temos de ter uma preocupação social e de sustentabilidade ambiental”, assumiu o coronel piloto aviador.

As ações e preocupações ambientais na BA5 podem também “servir de exemplo a outras instituições, organizações e até às próprias pessoas”.

“O conjunto de ações que temos vindo a fazer gira muito à volta disto: maior eficiência, maior reciclagem, poupança de recursos, reciclagem dos resíduos e aproveitamento, economias circulares e a própria transição para energias cada vez mais renováveis. Foi também isso que teve muito a ver com o facto de termos ganho o prémio de Defesa e Ambiente”, reforçou João Vicente.

Com preocupações ambientais transversais a toda a unidade, o comandante acrescentou que “até na manutenção das aeronaves” procuram “utilizar equipamentos que possam ser reutilizados, como os panos descartáveis”. Possuem também uma “estação de tratamento de águas residuais” dentro da base.

“Com o plano estratégico de sustentabilidade ambiental procuramos olhar para o futuro e ver qual será o caminho mais adequado. Não tem de ser estranho para as pessoas, sobretudo que nos rodeiam em Monte Real e Leiria, que os aviões fazem barulho, poluem, mas temos uma consciência ambiental grande”, assegurou.

Reconhecendo que a “neutralidade carbónica não se vai alcançar de um momento para o outro”, a floresta dentro da BA5 é uma “das principais formas de fazer esse tal equilíbrio de emissões com retenções e capturas de carbono”.

João Vicente revelou ainda que, a pensar a médio e longo prazo, a unidade está a trabalhar “em ligação com o Politécnico de Leiria em várias áreas”, como “na parte da monitorização e nas energias renováveis”, e tem estabelecido “alguns intercâmbios com outras universidades”.

“Tentamos abrir as portas para algumas entidades que também estão a trabalhar nestas áreas para encontrar algumas sinergias e continuar a aumentar a parte das energias elétricas, fazer uma transição gradual do GPL, das caldeiras que temos de aquecimento de águas e de alojamento, para bombas de calor”, exemplificou.

O comandante acrescentou que cerca de 19% da energia das emissões provêm da parte terrestre e “isso pode ser feito através de biocombustíveis ou de hidrogénio”.

“Não pretendemos mudar tudo de uma vez, mas criar umas provas de conceito”, demonstrando que uma tecnologia ou um determinado processo funciona.

“Cabe a quem de direito escalar isso. Daí ser muito importante o nosso relacionamento com o município porque aquilo que façamos aqui de forma isolada pode ser alavancado pelas autarquias e pelas pessoas que nos rodeiam. O aproveitamento dos óleos alimentares, o próprio hidrogénio, como forma de mobilidade… também temos aqui uma empresa que dá cartas nessa área. Se Cascais consegue ter algumas provas de conceito, porque é que Leiria também não poderá ter? É nesse âmbito que temos conversado todos e com certeza 2022 vai ser interessante nesse aspeto”, rematou.

Sempre que um avião F-16 levanta voo, a libertação de gases é elevada

Por isso, a Base Aérea n.º 5 (BA5), em Monte Real, tenta compensar a poluição com ações para reduzir a pegada carbónica em terra.

Assente num plano estratégico de sustentabilidade ambiental, o “plano de voo” da BA5 é alcançar a neutralidade carbónica, assumiu à Lusa o responsável pelo ambiente da unidade de Leiria, Filipe Delgado.

“Assumimos que esta unidade em específico, mas a Força Aérea [FA] na sua generalidade, tem uma fatura ambiental bastante pesada, fruto da sua missão na defesa da independência nacional. Acabamos por ter interações menos positivas com o ambiente, grande parte delas associadas à emissão de gases com efeito estufa. Assumindo que isso é algo que não conseguimos alterar e, para já, tentamos equilibrar as contas”, garantiu o tenente.

Para Filipe Delgado, se a BA5 garantir a redução de todos os consumos e gestão de resíduos que dão suporte à missão, estará “de facto a defender o ambiente desta forma”.

A “sementinha” da preocupação com o ambiente surgiu em 2010, quando a BA5 iniciou o processo de certificação da unidade ao regulamento europeu EMAS – Sistema Comunitário de Ecogestão e Auditoria, tendo sido a primeira da Europa a conseguir a distinção.

Com várias medidas adotadas na ‘mini-cidade’ da BA5, os ganhos a nível ambiental e financeiro têm-se revelado “satisfatórios”. A reciclagem já faz parte do ADN de todos. Em cada hangar ou serviço há contentores de ecoponto e também para resíduos perigosos.

“Mais de 70% dos nossos resíduos estão tipificados como perigosos e conseguimos garantir a valorização de cerca de 60 a 65% dos resíduos que produzimos. Damos primazia a processos em que se consiga retirar algum valor destes resíduos, seja para produzir energia ou outros materiais”, informou Filipe Delgado, exemplificado com os óleos e misturas de combustível, que “geram hidrocarbonetos”.

Cerca de 20% da energia que é consumida na BA5 provém dos 550 painéis fotovoltaicos, que têm uma potência de 200 ‘quilowatts’ instalada, investimento que foi possível com a verba da alienação de aeronaves à Roménia.

“Ao fim de um ano, tivemos uma poupança de CO2 equivalente a 200 toneladas. Ao nível financeiro, poupámos já cerca de 50 mil euros na fatura de energia elétrica. Se conseguirmos implementar isto de uma forma transversal em toda a FA, a longo prazo, o nosso saldo em termos de emissões acabará por ser tão positivo que poderá até absorver o impacto das aeronaves”, realçou Filipe Delgado.

Na BA5 passou a aproveitar-se a água da chuva para limpeza dos canis e travou-se um combate às fugas, “um problema transversal ao país”, dada a canalização obsoleta. Entre 2017 e 2019, verificou-se uma redução de 50% no consumo da água.

“Começámos com medidas mais pequenas e de efeito quase imediato. Fizemos a transição para luminária LED e alterámos a gestão energética da iluminação setorial dos nossos hangares. Por exemplo, se um militar estiver a trabalhar numa aeronave, não é necessário ligar as luzes de todo o hangar. Entre 2010 e 2017/2018, conseguimos reduções na ordem dos 10% de toda a iluminação da unidade”, revelou o militar, formado em engenharia ambiental.

O investimento numa central de vapor nova, a colocação de cinco postos de carregamento elétrico, o uso de panos reutilizáveis e uma monitorização constante da poluição produzida em terra são outras das ações realizadas, que trouxeram benefícios no impacto ambiental e financeiro.

Ainda sem veículos elétricos militares, essa é uma aspiração da BA5, que acredita poder vir a adquirir alguns no âmbito da transição energética. “Já estamos a estudar outras soluções, como a utilização de biocombustíveis que conseguem reduzir cerca de 85/86% das emissões geradas nas viaturas terrestres”, admitiu.

Com uma área florestal de centenas de hectares, a gestão florestal é também uma medida para alcançar a neutralidade carbónica. Além do trabalho ao nível da limpeza e regeneração da estrutura arbórea, a BA5 tem também procedido à plantação de mais árvores, que irá contribuir para o “sequestro de carbono”.

“A floresta acaba por nos dar outros benefícios ao nível da regulação do ciclo hidrológico, o abrigo e a proteção de outras espécies para promover e manter a biodiversidade local, e a regulação da temperatura. Estando perto de uma zona costeira até nos serve de barreira e proteção de ventos fortes”, constatou.

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