SWIFT: a “bomba atómica” que a Europa recusa detonar (para já)
Retirar a Rússia do sistema SWIFT seria uma "bomba atómica" sobre a economia russa, mas também teria consequências para a Europa. Mas do que falamos exatamente?
A declaração de guerra de Vladimir Putin à Ucrânia veio trazer de novo o debate sobre a expulsão da Rússia do SWIFT. É uma das sanções mais discutidas ao mais alto nível neste momento. Um banqueiro descreveu-a como se tratando da “bomba atómica” das medidas que podiam ser aplicadas a Moscovo, pois praticamente isolaria a economia russa do sistema financeiro internacional, causando sérios danos ao Governo e às empresas. João Leão revelou esta sexta-feira que os ministros das Finanças da União Europeia pediram ao Banco Central Europeu (BCE) e Comissão Europeia para estudar a medida que é encarada como “arma nuclear ao nível do sistema financeiro”. Mas do que falamos exatamente?
O que é o SWIFT?
SWIFT significa Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication ou, em português, a Sociedade de Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais.
Na verdade, não é um sistema de pagamentos, mas antes uma plataforma de troca de mensagens eficaz e segura e que permite aos bancos enviar dinheiro de forma rápida e segura, mesmo entre fronteiras.
O SWIFT é uma sociedade cooperativa internacional — ou seja, é detida pelos bancos –, com sede em Bruxelas, enquadrada dentro das leis da Bélgica e da União Europeia. Foi fundada em 1973 e substituiu a rede Telex e outros meios de comunicação financeira que se tornaram obsoletos. Atualmente, conta com cerca de 11 mil bancos, instituições financeiras e outras companhias em mais de 200 países que estão ligados entre si através do sistema.
Cada um deles tem um terminal SWIFT, um computador para comunicar com os outros bancos (a contraparte) da rede, bem como seu próprio código SWIFT (BIC). Cada transação registada na rede apresenta os detalhes da operação – podem ser ordens de pagamento, transferências bancárias, operações de trade finance e de troca de moeda, entre outras operações –, incluindo a parte e a contraparte que estão devidamente identificadas pelo código SWIFT, criando um ambiente de maior confiança e de segurança.
Num mundo tão globalizado como o atual, o SWIFT tornou-se uma infraestrutura vital às economias, dando suporte a biliões de dólares em fluxos de comércio e de negócios realizados por instituições em todo o mundo por dia. Não é por isso uma surpresa que os EUA e a Europa acenem com esta ameaça sempre que querem mostrar uma posição de força em relação à Rússia.
Que impacto poderia ter na Rússia?
Removendo a Rússia do SWIFT, os bancos e empresas do país seriam duramente afetados pois a sua capacidade de participar no comércio internacional e de levantar fundos fora do país seria colocada em causa.
O SWIFT integra 291 membros russos, que representam 1,5% dos fluxos e são o sexto maior país em termos de mensagens enviadas através da plataforma, de acordo com Johannes Borgen. Este investidor que acompanha de perto o setor financeiro estima que isso equivale a 800 mil milhões de dólares em transações por ano que seriam atingidos por esta sanção.
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Por exemplo, as empresas de energia russas teriam muito mais dificuldades nas suas vendas de petróleo ou gás natural para o exterior — nomeadamente para a Europa.
A economia russa não ficaria totalmente isolada, pois as instituições poderiam continuar a realizar operações internacionais, mas através de sistemas mais antiquados como o fax e e-mail, o que tornaria todo processo se tornaria mais lento e oneroso. Além disso, seria preciso convencer os bancos ocidentais a usar estes sistemas também, lembra Johannes Borgen.
Quem quer e quem não quer?
Não há consenso em torno da aplicação desta medida. O Presidente dos EUA colocou as coisas nestes termos quando foi questionado sobre a razão pela qual os aliados ainda não avançaram imediatamente com esta sanção, enquanto as tropas russas iam diretamente para Kiev para tomar controlo da capital ucraniana: “É sempre uma opção. Mas neste momento não é a posição que o resto da Europa deseja tomar”, disse Biden há dias.
Também o ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, Dmytro Kuleba, fez um apelo internacional para remover a Rússia do SWIFT. Estónia, Letónia e Lituânia também pediram o mesmo.
Embora a entidade destaque a sua neutralidade, lembrando que foi constituída para “o benefício coletivo de sua comunidade de mais de 11.000 instituições em 200 países”, também frisa que “qualquer decisão de impor sanções a países ou entidades individuais cabe exclusivamente aos órgãos governamentais competentes e aos legisladores aplicáveis”, disse o porta-voz citado pelo Financial Times (acesso pago, conteúdo em inglês).
Foi o que aconteceu em 2012, quando expulsou bancos iranianos sancionados pela União Europeia – muitos foram religadas ao sistema em 2016, depois do levantamento das sanções.
Mas a questão, agora, é mais sensível, até por aquilo que a Rússia representa em termos económicos e energéticos para a Europa (que não representa o Irão), o que ajuda a explicar as reticências de alguns países em relação a esta medida, designadamente a Alemanha. “É muito importante que concordemos com as medidas que foram preparadas — e guardemos tudo o resto para uma situação em que possa ser necessário ir além disso”, justificou o chanceler alemão, Olaf Scholz.
A Rússia é o quinto maior parceiro comercial da UE, representando 4,8% do total do comércio internacional com o mundo em 2020. As trocas comerciais entre os dois blocos atingiram os 174,3 mil milhões de euros.
Os Estados-membros vendem sobretudo máquinas e equipamentos de transporte, produtos químicos e produtos manufaturados aos russos. Por outro lado, compram muito gás natural e petróleo aos russos: a Rússia é a origem de 26% das importações de petróleo da UE e 40% das importações de gás da UE. Os efeitos da guerra já se estão a fazer sentir nos preços energéticos e bloquear o SWIFT aos russos poderia tornar tudo isso mais caro e difícil.
Além disso, também é possível que a Rússia encontre maneiras de contornar a proibição do SWIFT: o banco central russo desenvolveu o seu próprio sistema SFPS (System for Transfer of Financial Messages), integrando sobretudo bancos russos e do bloco CIS (Arménia, Azerbaijão, Bielorrúsia, Geórgia, Cazaquistão, Quirguistão, Moldávia, Tajiquistão, Turquemenistão, Ucrânia e Uzbequistão, além da Rússia).
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