BCE acelera redução dos estímulos e mantém juros
Perante a escalada da inflação, o Banco Central Europeu (BCE) decidiu acelerar a redução da compra de ativos e aponta para o terceiro trimestre para o seu fim. Só depois virão as subidas de juros.
Na primeira reunião de política monetária após o início da invasão russa na Ucrânia, o conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE) deixou esta quinta-feira uma mensagem de apoio ao povo ucraniano e a promessa de fará o que for necessário para manter a estabilidade financeira. Porém, com a taxa de inflação a acelerar para 5,8% em fevereiro na Zona Euro, o banco central decidiu acelerar a redução do programa de compra de ativos (estímulos monetários), apontando o seu fim para o terceiro trimestre.
Tal como já tinha sido decidido, o programa extraordinário de compras pandémicas (PEPP) vai acabar no final de março (mas os montantes serão reinvestidos até ao final de 2024), uma decisão que se mantém. Em dezembro de 2021, o BCE tinha decidido substituir o PEPP por um programa antigo, o APP, com compras líquidas (principalmente de dívida pública dos países da Zona Euro) de 40 mil milhões de euros no segundo trimestre de 2022 e de 30 mil milhões de euros no terceiro trimestre.
Contudo, com a subida dos preços na Zona Euro e mesmo com a ameaça de estagflação, o banco central decidiu colocar o pé no acelerador na retirada dos estímulos, mantendo as compras líquidas nos 40 mil milhões de euros em abril, mas baixando para 30 mil milhões em maio e para 20 mil milhões em junho. Além disso, aponta para o fim das compras líquidas do APP para o terceiro trimestre — anteriormente admitia que ainda havia APP em outubro a 20 mil milhões por mês –, o que abre o caminho para uma subida de juros no quarto trimestre.
“A calibragem das compras líquidas no terceiro trimestre será dependente dos dados e refletirá a nossa avaliação constante do panorama“, explica o conselho de governadores do BCE no comunicado, assinalando que se os números que chegarem nos próximos meses confirmarem a expectativa de que a taxa de inflação na Zona Euro não irá enfraquecer no médio prazo, mesmo com o fim dos estímulos, os estímulos monetários irão acabar no terceiro trimestre.
Por outro lado, se a previsão para a inflação de médio prazo e as condições financeiras “se tornem inconsistentes” com o alcance do objetivo de 2%, o BCE está pronto para “rever o calendário” das compras de ativos “em termos de tamanho e/ou duração”.
Em relação às taxas de juro, não há novidades. “A taxa de juro aplicável às operações principais de refinanciamento e as taxas de juro aplicáveis à facilidade permanente de cedência de liquidez e à facilidade permanente de depósito permanecerão inalteradas em 0,00%, 0,25% e −0,50%, respetivamente“, esclarece o comunicado.
O BCE explica que “qualquer ajustamento” aos juros só irá acontecer “algum tempo depois do fim” das compras líquidas do APP e “será gradual”. O conselho de governadores mantém a ideia de que as taxas de referência vão manter-se iguais até que a inflação alcance os 2% para lá do fim do horizonte da projeção e de forma duradoura, isto é, a médio prazo. Contudo, deixam cair a expressão “ou em níveis inferiores”, a qual ainda apareceu no comunicado anterior, afastando completamente a ideia de que os juros podiam baixar ainda mais.
No final do comunicado, o conselho de governadores deixa a garantia de que está preparado para ajustar todos os seus instrumentos, conforme apropriado, para assegurar que a inflação estabilize no seu objetivo de 2% no médio prazo.
Lagarde rejeita que haja aceleração da retirada dos estímulos
Na conferência de imprensa após a reunião, Christine Lagarde, presidente do BCE, rejeitou a ideia de que estas decisões correspondem a uma aceleração da retirada dos estímulos. “As decisões tomadas hoje são a continuação lógica das nossas decisões de dezembro e da nossa comunicação de fevereiro“, afirmou Lagarde, assegurando que os passos são dados com base nos dados que chegam. “Não estamos a falar de uma aceleração ou de um aperto. Estamos a falar de normalizar“, defendeu, justificando a normalização com os níveis elevados de inflação na Zona Euro.
A presidente do BCE reconheceu que houve “diferentes opiniões” dentro do conselho de governadores, tanto para um lado como para o outro, mas todos chegaram a um consenso para apoiar a proposta do comité executivo do BCE apresentada por Philip Lane, economista-chefe do BCE. É uma “abordagem equilibrada que cumpre o mandato que temos”, assegurou Lagarde, repetindo a ideia de que é um “progresso passo a passo” e não uma “aceleração”. “Não estamos a acelerar. Estamos a confirmar a nossa abordagem”, insistiu, reforçando a ideia de que o BCE tem “maximum optionality e flexibility” (flexibilidade e opcionalidade no máximo) face a um período de “máxima incerteza”.
A presidente do BCE também explicou a interpretação que se deve dar à substituição do termo “shortly before” para “some time after” aplicado ao momento em que pode haver um aumento dos juros. Anteriormente, não havia um “compasso de tempo muito grande” entre o fim da compra de ativos e a subida de juros. Agora, com a nova expressão, há um “horizonte aberto”, o qual dependerá dos dados que cheguem. “Tanto pode ser uma semana depois como meses depois”, especificou Lagarde, argumentando que o mais importante são os dados e não o horizonte temporal.
BCE prolonga linhas de liquidez para bancos centrais fora da Zona Euro até 2023
Perante a “elevada incerteza” causada pela invasão russa na Ucrânia e o “risco de repercussões regionais que podem afetar” os mercados financeiros europeus, o conselho de governadores decidiu prolongar a EUREP (Eurosystem repo facility for central banks), que são linhas de liquidez do euro para bancos centrais fora da Zona Euro, até 15 de janeiro de 2023. Este mecanismo tinha sido introduzido no início da crise pandémica.
Este é um mecanismo de salvaguarda para evitar disrupções nos mercados, as quais podiam ter impactos na transmissão da política monetária do BCE, satisfazendo as necessidades de liquidez em euros fora da Zona Euro. Assim, este mecanismo reduz o risco de “sell-off” (venda agressiva) de ativos cotados em euros, o que teria impactos na Zona Euro e na confiança na moeda única.
Em relação às operações de refinanciamento de prazo alargado direcionadas (ORPA) direcionadas aos bancos, o BCE mantém que “espera que as condições especiais aplicáveis no contexto das ORPA direcionadas III cessem em junho deste ano”. Quanto ao two-tier system, também não há mudanças: “O Conselho do BCE avaliará igualmente a calibração apropriada do sistema de dois níveis para a remuneração de reservas, com vista a que a política de taxas de juro negativas não limite a capacidade de intermediação dos bancos num enquadramento de ampla liquidez excedentária”.
Quanto ao PEPP, o BCE mantém no comunicado a ideia de que as compras líquidas do PEPP podem ser retomadas, se necessário, para compensar choques negativos relacionados com a pandemia, o que não se antecipa atualmente.
(Notícia atualizada às 14h47 com mais informação)
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